Eslováquia

Parlamento eslovaco emenda Constituição contra direitos LGBTQI+ para combater “progressismo”

02 de outubro 2025 - 13:36

O governo de Fico conseguiu uma inesperada maioria de três quintos para proibir constitucionalmente adoções por casais do mesmo sexo, reconhecer só dois sexos e incluir a obrigatoriedade de consenso dos pais para os filhos terem acesso a educação sexual.

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Primeiro-ministro da Hungria Viktor Orban e Robert Fico chefe de governo da Eslováquia.
Primeiro-ministro da Hungria Viktor Orban e Robert Fico chefe de governo da Eslováquia.

Na passada sexta-feira, o parlamento eslovaco aprovou uma emenda à Constituição para restringir direitos das pessoas LGBTQI+. O texto foi promovido pelo governo de Robert Fico, precisava de uma maioria de três quintos e acabou por ser aprovado inesperadamente com 90 votos a favor num plenário de 150 representantes. Para além da coligação no poder, que conta com 78 deputados, conseguiu votos dos partido conservador dos Democratas Cristãos e de alguns dissidentes do movimento do anterior primeiro-ministro.

Na prática, a emenda leva a Constituição a reconhecer apenas dois sexos, homem e mulher, impossibilita na prática a adoção de quem não viva na situação de casal, o que é definido como “uma união única entre um homem e uma mulher” e introduz a necessidade de consenso dos pais para os filhos terem acesso a educação sexual. A gestação de substituição é proibida por completo.

Para além disso, vinca que a Eslováquia mantém a soberania em questões de “identidade nacional”, sobretudo em “questões ético-culturais fundamentais”, o que liga a estas questões e é visto como uma declaração de desafio às leis da União Europeia em matéria de direitos humanos e igualdade.

O primeiro-ministro Robert Fico saudou o resultado da votação como “uma grande barragem contra o progressismo”, fazendo questão de sublinhar que se trata de defender os “valores tradicionais”. Contestado nas ruas por manifestações, Fico diz que a ideologia “liberal” se tem “espalhado como um cancro”. Desde que o seu governo chegou ao poder que tem tomado medidas como eliminar o financiamento de projetos relacionados com pessoas LGBTQI+.

Ainda assim há quem julgue que ele “não se importa genuinamente com questões de género, com a proibição da gestação de substituição ou mesmo com adoções por pessoas LGBTQIA+”. É o ponto de vista de Beata Balagova, editora-chefe do diário eslovaco SME, que à BBC fala num “plano de Robert Fico para desmantelar a oposição e desviar a atenção dos verdadeiros problemas da sociedade, bem como das medidas de austeridade que ele teve de aprovar”.

Amnistia Internacional diz que Constituição do país entrou em “conflito direto” com a lei internacional

De qualquer forma, os passos tomados estão a ser sentidos como uma ameaça. A Amnistia Internacional condenou as medidas através de uma declaração em que diz que “hoje, o governo eslovaco escolheu seguir a liderança de países como a Hungria, cujas políticas levam a uma erosão dos direitos humanos. Rado Sloboda, diretor daquela organização na Eslováquia, afirma tratarem-se de “notícias devastadoras” e colocam a Constituição do país em “conflito direto” com a lei internacional, estando já a enfrentar “uma série de ataques em cascata contra os direitos humanos e o Estado de Direito”.

De acordo com este responsável, “a situação dos grupos marginalizados na Eslováquia – incluindo as pessoas LGBTI – já é terrível” e “estas alterações só vêm deitar mais sal na ferida”.

Iniciatíva Inakosť, um grupo de defesa das pessoas LGBTQI+, indicou que, desde a votação, a organização recebeu mais de uma centena de chamadas e e-mails. O seu diretor executivo, Martin Macko, reporta que “as pessoas estão assustadas, ansiosas e sentem-se impotentes na medida em que se tornaram reféns dos políticos através desta emenda”. As pessoas trans e intersexo sentem-se diretamente atacadas mas, para além delas, a sensação é a de que a votação vai fazer intensificar a discriminação contra todas as pessoas LGBTQI+.

De Bruxelas também já tinha chegado uma nota de oposição, com o Comissário do Conselho Europeu para os Direitos Humanos, Michael O’Flaherty, a apelar a que não fossem aprovadas as alterações que negam “a realidades das pessoas trans e intersexo e podem ter impacto em garantias de direitos humanos como o acesso ao reconhecimento legal do género”.