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Parece que alguém está a precisar de uma guerra

Um porta-voz das Forças Armadas polacas assinalou ao final da tarde de sábado a chegada à Polónia de militares norte-americanos da 82ª brigada aero-transportada. Os “tambores de guerra” ecoam ao mesmo tempo que o “ballet diplomático” – gosto da expressão – desenvolve cenografias cujos resultados são difíceis de entender. Por José Manuel Rosendo em meu Mundo, minha Aldeia.
Retratos da guerra, próximo de Debaltsev, região de Donetsk, Donbass, zona dominada por separatistas. Foto: arquivo jmr/Fevereiro 2015.

Um porta-voz das Forças Armadas polacas assinalou ao final da tarde de sábado (05.02) a chegada à Polónia de militares norte-americanos da 82ª brigada aero-transportada, informação confirmada em comunicado do comandante da referida brigada. Este é apenas o último dado conhecido da escalada entre a Ucrânia e a Rússia, traduzida em movimentações militares que, segundo algumas opiniões, são prenúncio de uma guerra no leste da Europa.

Enquanto a Rússia concentra forças militares junto à fronteira com a Ucrânia e na Bielorrússia, a NATO reforça a presença nos países bálticos, Polónia e Roménia. Do lado da NATO e dos Estados Unidos já se disse abertamente que a Rússia prepara a invasão da Ucrânia; a Rússia diz que não tem qualquer intenção de invadir e foi até o Presidente ucraniano que tentou acalmar a excitação dos que quase já ouviam os primeiros tiros, dizendo que a situação não é melhor nem pior do que nos anos mais recentes.

Os “tambores de guerra” ecoam ao mesmo tempo que o “ballet diplomático” – gosto da expressão – desenvolve cenografias cujos resultados são difíceis de entender. Evidentemente que mesmo sem nos deixarem sentar à mesa dessas conversas e sem nada nos contarem, é muito melhor estarem dedicados a esse ballet do que a apertar um qualquer gatilho que devolva a Europa à desgraça que pensávamos já não poder regressar.

No entanto, é fastidioso tomar nota do que sai desses encontros, telefonemas e vídeo-conferências. De alguma coisa falarão, certamente, mas nós não sabemos. Expressam no final manifestações de boa-vontade, compromisso com o diálogo e com documentos anteriormente assinados, defendem um cessar-fogo que, diga-se, quase nunca existiu desde 2014 – tal como os acordos de Minsk só pontualmente terão sido cumpridos – e pouco mais. A única coisa que se sabe, após cada um dos “encontros”, é que todos querem continuar a dialogar e todos estão empenhados em manter a paz. Ainda bem, mas falta mandar os militares de regresso aos quartéis.

O problema é que até o diálogo não é fácil. Rússia, Estados Unidos e NATO, estão de costas voltadas depois de uma troca de correspondência, tendo ficado evidente a quase impossibilidade de conciliar as exigências de uns e de outros. Rússia e Ucrânia apenas se sentam à mesa no chamado formato Normandia que junta estes dois países, Alemanha e França. A Ucrânia recusa-se a negociar com os separatistas do Donbass (que controlam Lugansk e Donetsk). A União Europeia está completamente fora de jogo – Lavrov, MNE russo, disse que é tarde para envolver a União Europeia – e, num momento em que reivindica unidade e coordenação face à Rússia, sofreu o revés de ver Viktor Orbán, Primeiro-ministro da Hungria, ir a Moscovo ser recebido por Putin de quem obteve a garantia de que não terá problemas com o fornecimento de gás à Hungria, o que poderá não acontecer com outros países europeus – disse Putin. Sendo certo que a França tem actualmente a presidência do Conselho da União Europeia, em termos práticos, neste conflito Ucrânia/Rússia, a UE “entregou” a representação dos 27 ao Presidente francês (que vai a Moscovo e Kiev nos próximos dias) e ao Chanceler alemão (que fará as mesmas viagens uma semana depois). E é assim que estamos. No meio desta confusão vale o facto de haver eleições presidenciais em França, já em Abril, e no caso de Macron conseguir desbloquear esta situação, muito provavelmente terá reconhecimento expresso em votos.

A juntar a todas estas dificuldades, os dois países europeus que lideram o diálogo têm interesses paralelos a discutir com a Rússia: a Alemanha precisa, e muito, do gás que lhe chega da Rússia; a França tem o problema do Mali (e do Sahel) onde a empresa russa de segurança privada Wagner está a conquistar terreno e simpatias nas lideranças locais e onde a França está com muitas dificuldades para manter a presença militar. Dificilmente estes assuntos deixarão de ser falados quando Emmanuel Macron e Olaf Scholz forem recebidos no Kremlin.

Não se tratando de aprovar ou não as políticas da Rússia, não deixa de ser fantástico observar como Vladimir Putin fechou a tenaz: influencia os países vizinhos do Cáspio, mantém boas relações com o Irão, tem influência no Médio Oriente e expande a presença em África. Como se não bastasse, Putin e Xi Jinping encontraram-se na sexta-feira, demonstrando que Rússia e a China estão num momento de excelentes relações.
 

Por José Manuel Rosendo em meu Mundo, minha Aldeia.

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