Subindo a colina do castelo, já há quem distribua panfletos sobre a greve dos trabalhadores da EGEAC. À entrada, monta-se o piquete de greve. O castelo de São Jorge foi escolhido “por ser o equipamento cultural mais visitado do país”, explica João Santo António, trabalhador desse mesmo equipamento.
Segundo os dados do Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa (STML). Entre o início de 2021 e outubro de 2024, o castelo de São Jorge foi visitado por mais de cinco milhões de pessoas. Para possibilitar esse tipo de tráfego, a equipa de trabalhadores é composta por diferentes grupos que garantem o seu funcionamento, da bilheteira ao serviço educacional ou ao pessoal de manutenção.
Hoje, uma grande parte desses trabalhadores estão no piquete, à entrada do castelo. Explicam aos turistas, em português e inglês, que a bilheteira está fechada, mas ainda é possível entrar no castelo comprando um bilhete digital. Alguns turistas voltam para trás, sabendo que não terão acesso a uma grande parte do património cultural que o castelo oferece, outros insistem em avançar, mas ficam avisados.
“Estamos com um sistema muito precário a nível de bilheteira”, explica Sandra Leal, trabalhadora de bilheteira que acompanha João. “Problemas com o sistema informático, problemas de caixa, falta de pessoal e acumulação de funções”. São problemas que se arrastam e que se aprofundam, como denuncia o STML, por falta de investimento e de condições de trabalho. “São coisas que estão a demorar muito tempo a resolver, as instalações, sistema informático, o que dificulta também o nosso trabalho”.
Os problemas com a organização do equipamento no dia-a-dia escondem aquilo que é um problema sistémico na rede de equipamentos culturais do município geridos pela EGEAC. De facto, o sindicato fala em dívidas da empresa pública para com vários trabalhadores, mas também da falta de estruturas de medicina no trabalho. Nos últimos cinco anos, por exemplo, os salários dos trabalhadores aumentaram a um ritmo inferior ao da inflação.
“Nesta administração, mas também na anterior, há uma série de reivindicações que têm sido esquecidas”, explica Ricardo Belo de Morais, dando o exemplo dos “aumentos salariais efetivos, as progressões na carreira, as condições de trabalho, a medicina no trabalho”.
Ricardo trabalha na Casa Fernando Pessoa, equipamento da EGEAC que também fechou esta quarta-feira devido à greve, e os seus problemas são em muitas coisas semelhantes aos dos trabalhadores do castelo. Na pele, sente o desinvestimento nos recursos humanos enquanto “o custo de vida vai subindo e nós ficamos cada vez mais na mesma”.
“Nesta administração camarária as coisas têm sido menos boas, no mínimo, e isso também precisa de ser corrigido”, diz Ricardo sobre a forma como o executivo de Carlos Moedas tem lidado com as reivindicações dos trabalhadores da EGEAC. O STML inscreveu-se para participar na reunião aberta da Câmara Municipal de Lisboa esta quarta-feira, mas ao início, tinham recebido a indicação de que não havia já disponibilidade. Só depois de fazerem um comunicado oficial é que foi reconhecido o seu direito à intervenção.
“Com o executivo de Carlos Moedas colocámos uma série de reivindicações desde o início do mandato. A verdade é que a maioria delas não está ainda respondida e os problemas nos locais de trabalho mantêm-se”, explica Nuno Almeida, presidente do STML. “Hoje a nossa intervenção versará sobre várias reivindicações dos trabalhadores do município que ainda não receberam respostas”.
E de ano para ano, os orçamentos da Câmara Municipal de Lisboa vão espelhando a desvalorização dos trabalhadores. “O que assistimos e que tem consequências nas empresas municipais são decisões que são tomadas na Câmara e que depois se refletem na economia dessas empresas”, explica o presidente do sindicato, que tem tentado negociar aumentos para os trabalhadores com a EGEAC, mas que recebe como resposta que o financiamento “depende da Câmara”.
O sindicato conta entre as suas reivindicações a necessidade de negociações para aumentar salários, a contratação de pessoal para fazer face às necessidades reais dos equipamentos culturais, a revisão e implementação da progressão nas carreiras e o fim do assédio laboral. Por isso, o piquete dos trabalhadores da EGEAC junta até alguns profissionais da Câmara de Lisboa que não são dessa área, mas que marcam presença em solidariedade com os trabalhadores da cultura. E, como evidencia Nuno Almeida, far-se-á ouvir ao final da tarde na reunião camarária.
Em representação do Bloco de Esquerda, Ricardo Moreira esteve presente no piquete de greve. Ouvindo e falando com os trabalhadores, o vereador em substituição disse que “do ponto de vista do trabalho e dos salários, tudo tem vindo a ser pior com a gestão de Carlos Moedas”.
“O castelo de São Jorge recebe 1,6 milhões de turistas por ano, o Padrão dos Descobrimentos, 200 mil pessoas por ano. E apesar de todo esse trabalho que os trabalhadores da EGEAC fazem para a dinamização cultural de Lisboa, são recompensados com maus salários e más condições de trabalho”.
Ricardo Moreira salientou que “é preciso valorizar a carreira destes trabalhadores, valorizar os seus salários e garantir que têm boas condições de trabalho”.