O Banco Central Europeu (BCE) vai emitir em breve uma opinião sobre a tributação dos lucros extraordinários dos bancos, de acordo com o seu vice-presidente Luis de Guindos. A notícia foi avançada esta semana pelo Financial Times, que sublinha que esta opinião poderá colocar problemas a Espanha, por já ter aprovado um imposto deste tipo este ano.
Espanha foi o primeiro país europeu a avançar para a criação de um imposto temporário sobre os lucros extraordinários do setor bancário. Entretanto, a Hungria também já o aplicou e o novo ministro das Finanças do Reino Unido, Jeremy Hunt, deverá apresentar uma proposta no mesmo sentido.
A justificação dada pelo governo espanhol foi o facto de os bancos comerciais estarem a registar ganhos substanciais num contexto em que a maioria das pessoas enfrenta dificuldades. O imposto, que vai vigorar durante dois anos, deverá render 1.500 milhões de euros por ano ao Estado espanhol, de acordo com as contas do governo. O primeiro-ministro Pedro Sánchez explicou que a taxa tem como objetivo repor alguma justiça social na repartição dos custos da crise, tributando o setor financeiro “que já começa a beneficiar com a subida das taxas de juro”.
O setor da banca já veio a público contestar esta afirmação. Gonzalo Gortázar, chefe executivo do CaixaBank (banco espanhol), disse ao Financial Times que “não é expectável que os bancos obtenham lucros extraordinários”, argumentando que o setor está antes a “recuperar de um período longo de lucros muito baixos”.
Como é que os bancos ganham com a subida dos juros?
Há pelo menos duas vias pelas quais os bancos estão a lucrar com a crise. A primeira via é a mais visível e prende-se com a diferença cada vez maior entre os juros que os bancos cobram aos clientes pelos empréstimos que concedem e os juros que pagam aos clientes pelos depósitos. Esta diferença, que tem vindo a aumentar ao longo dos últimos anos, reflete o poder de mercado dos grandes bancos que dominam o setor.
A segunda via, menos evidente, prende-se com a política monetária do BCE, que aumentou a taxa de depósito – isto é, a taxa que paga aos bancos comerciais pelos depósitos que estes têm no banco central. Os bancos, que receberam mais de 2 biliões de euros de empréstimos do BCE a taxas de juro negativas durante a pandemia, poderão agora aproveitar para depositar esse dinheiro no próprio banco central e arrecadar os juros mais elevados. Esta operação pode render ao setor entre 4 e 24 mil milhões de euros até 2024, de acordo com a Morgan Stanley.
Dúvidas sobre compatibilidade com regras europeias
Em Espanha, a banca mobilizou-se contra a aplicação da nova taxa com o argumento de que esta viola as regras da União Europeia. A legislação aprovada pelo Governo sublinha que os bancos “não podem passar os custos [da taxa] para os consumidores e o não-cumprimento desta proibição constitui uma infração grave”.
As orientações da entidade reguladora europeia (EBA) dizem que os bancos devem refletir todos os custos, “incluindo considerações fiscais”, nos preços que cobram pelos empréstimos. A pedido do parlamento espanhol, o BCE pronunciar-se-á sobre a compatibilidade da medida com estas orientações. No entanto, a opinião do banco central não possui caráter vinculativo.