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No Mundial do Qatar feito à custa de baixos salários, migrantes têm de pagar para trabalhar

Trabalhadores do Bangladesh e do Nepal são obrigados a pagar taxas para poderem trabalhar no país que organiza o próximo campeonato mundial de futebol. O rendimento de pelo menos um ano de trabalho é perdido só no pagamento destes valores.
Trabalhadores migrantes no Qatar. Foto: International Labour Organization/Flickr.
Trabalhadores migrantes no Qatar. Foto: International Labour Organization/Flickr.

As infraestruturas do próximo campeonato mundial de futebol no Qatar foram em grande medida construídas por trabalho migrante mal remunerado. Uma investigação do Guardian, publicada esta quinta-feira, revela que esses trabalhadores têm sido forçados ao longo dos últimos anos a pagar milhares de milhões de dólares em taxas para poderem trabalhar.

O jornal britânico estima que trabalhadores provenientes do Bangladesh tenham pago entre 1,5 mil milhões a dois mil milhões desde 2011 até 2020 e que nepaleses tenham pago entre 320 milhões e 400 milhões entre 2015 e a primeira metade de 2019. Os primeiros serão obrigados a pagar taxas entre 3.000 a 4.000 dólares e os segundos entre 1.000 a 1.500. Isto implica que o pagamento destes valores lhes custe pelo menos um ano de trabalho.

Para poderem pagar a agências de recrutamento ou às empresas que os contratam no Qatar, muitos são obrigados a contrair empréstimos a altos juros ou a vender as suas terras.

As contas do órgão de comunicação social são corroboradas por vários grupos de defesa dos direitos dos trabalhadores. Estes dois países são os principais fornecedores de mão de obra daquele país. Mas não serão os únicos, já que trabalhadores de outras paragens também terão sido obrigados a pagar. Só que, nesses casos, não se apresentam estimativas.

Este tipo de prática está disseminada, apesar das autoridades do Qatar afirmarem que abriram centros de recrutamento em vários países. Só que os especialistas creem que estes fizeram muito pouco no caso destas taxas. O Comité organizador do evento também anunciou em 2018 um esquema que garantiria que as empresas construtoras dos estádios iriam devolver estas taxas a cerca de 49.000 dos dois milhões de trabalhadores migrantes presentes no país. De acordo com o Guardian, “o número de trabalhadores que irão beneficiar, contudo, é apenas uma muito pequena fração do total. Em muitos casos, os repagamentos apenas cobrem parte das taxas de recrutamento e não providenciam qualquer compensação adicional ou contabilização do custo dos empréstimos”. Para além disso, de fora ficaram os milhares de trabalhadores do setor da hotelaria. Trabalhadores de hotéis recomendados pela Fifa disseram àquele jornal ter pago taxas até ao valor de 2.750 dólares.

Oficialmente, o governo do Qatar assegura estar em campo e ter fechado 24 agências de recrutamento por terem infringido várias leis. No terreno pouco estará diferente. Aquele órgão de comunicação social cita Narad Nath Bharadwaj, ex-embaixador do Nepal no Qatar, que diz que mais de 90% dos trabalhadores migrantes são obrigados a pagar estas taxas. O diplomata acrescenta: “o pagamento é ilegal e acontece, em grande medida, por debaixo da mesa, pelo que os trabalhadores não têm qualquer prova que pagaram. Mas não conseguem emprego se não pagarem”.

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