A dirigente do partido francês de extrema-direita União Nacional, Marine Le Pen, foi esta segunda-feira considerada culpada no caso do desvio de 4,6 milhões de euros de recursos do Parlamento Europeu para financiar o seu partido e enriquecer o seu círculo pessoal.
Para além dela, oito eurodeputados da União Nacional e 12 assistentes foram também declarados culpados, assim como o próprio partido que terá de pagar dois milhões de euros de multa.
O julgamento durou dois meses. A acusação tinha pedido cinco anos de prisão para Marine Le Pen, dois deles efetivos, uma multa de 300.000 euros e cinco anos de inabilitação para o desempenho de cargos públicos. Neste casos, conforme a lei, mesmo o recurso não suspende a medida pelo que ficaria impossibilidade de se apresentar à eleição presidencial de 2027 para a qual era uma das favoritas.
A inabilitação de cinco anos foi confirmada na sentença do tribunal esta segunda-feira apesar da dirigente da extrema-direita não ter ficado à espera no tribunal de saber se poderia ou não apresentar-se às próximas presidenciais, tendo saído sem dizer nenhuma palavra aos jornalistas.
Le Pen mantém o mandato como deputada mas não se poderá candidatar a novas eleições durante aquele período. Para além disso, as restantes medidas penais, essas sim passíveis de recurso, ficaram próximas do pedido pela acusação: quatro anos de prisão, dois dos quais suspensos, e uma multa de 100 mil euros.
O tribunal considerou que a defesa "desprezou as leis da República", tudo fazendo para atrasar a justiça, que os acusados não expressaram nenhum remorso sobre a sua atuação, tendo sido até apresentados falsos documentos para contestar os factos.
O esquema dos falsos assessores já vinha de antes da sua liderança. Mas Marine Le Pen, quando assumiu a chefia da União Nacional, em 2011, terá, de acordo com a sentença, imposto o seu amigo Nicolas Crochet como responsável por receber os salários do Parlamento Europeu, passando a ter um papel fulcral no esquema de desvio de fundos no qual ela "acreditou conscientemente".
Ao todo, este terá durado três mandatos, 12 anos, havendo mais de 40 contratos que o tribunal considerou fictícios. O esquema só terminou depois de uma queixa do próprio Parlamento Europeu. Ao longo deste tempo, considera-se, o sistema foi sendo aperfeiçoado e estava centralizado.
Ficou ainda provado que Le Pen numa reunião em junho de 2014 deu ordens aos assistentes parlamentares para disponibilizarem o dinheiro vindo dos seus salários para o partido, o que infringe a lei como o próprio tesoureiro do partido da época, Wallerand de Saint-Just, reconhece num e-mail. Quatro dos seus assistentes, incluindo Catherine Griset, a sua chefe de gabinete, tinham destes contratos fictícios. Nos vários casos de contratação fictícia, não foram apresentadas quaisquer provas de trabalho ou de outro tipo de atividade que justificasse o contrato e o pagamento feito.
Mas nem todo o dinheiro era destinado às caixas do partido, ficando muito a cobrir o nível de vida de vários dirigentes da Frente Nacional, depois União Nacional, e pessoas do círculo pessoal da dirigente de extrema-direita. Houve bónus distribuídos a elementos como Thierry Légier, guarda-costas, Yann La Pen, irmã de Marine, e Catherine Griset a sua melhor amiga.
Extrema-direita europeia ao lado de Le Pen
As primeiras reações de apoio vieram imediatamente da extrema-direita. O líder atual da União Nacional, Jordan Bardella, diz que não foi apenas Le Pen que foi “injustamente condenada” foi “a democracia francesa que foi executada”.
Ao seu lado esteve também o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, que escreveu no X a curiosa mensagem “Je suis Marine”.
Do lado do Kremlin, a reação do porta-voz Dmitri Peskov foi de lamentou por uma “violação das normas democráticas” que “cada vez mais capitais europeias” estarão a implementar.
Outro dos seus apoiantes, o vice-primeiro ministro italiano, Matteo Salvini, pensa que a condenação do tribunal é uma “declaração de guerra de Bruxelas”. Acrescentando em comunicado que há um “medo do julgamento dos eleitores” que é “um mau filme que já vimos noutros países como a Roménia”.
Já Santiago Abascal, dirigente do partido espanhol Vox, afirma no X que "não vão conseguir calar a voz do povo francês”. E Geert Wilders, dirigente da extrema-direita neerlandesa, disse estar "chocado" com um "veredito incrivelmente duro", manifestando apoio a "100%" a Marine Le Pen.
Do lado do líder da extrema-direita portuguesa, André Ventura, apoiante entusiaste de Le Pen, ainda não houve qualquer comentário. Apenas reagiu a deputada do Chega Rita Matias na sua conta do X, escrevendo que "cada líder político que não conseguirem derrotar nas urnas, vão eliminar pela via judicial. Subverter a democracia para “proteger a democracia”. Liberdade, igualdade e fraternidade uma ova". O seu colega de bancada Ricardo Regalla vai no mesmo sentido falando numa “evidente perseguição à sua candidatura”, num "sabor amargo à democracia”. Apesar da condenação judicial, este dirigente da extrema-direita portuguesa pensa que ela deve poder candidatar-se porque "quem deve decidir questões de candidaturas e de execução de cargos públicos deve ser o povo".