A Legião espanhola continua a celebrar os crimes cometidos no massacre de Badajoz

14 de agosto 2022 - 20:28

Este domingo faz 86 anos que cerca de 4.000 pessoas foram assassinadas pelas forças franquistas. A unidade Tercio Duque de Alba da Legião, que integrou o massacre e continua a fazer parte do exército espanhol, não mostra arrependimento e, pelo contrário, exalta-o ainda hoje na sua página.

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Repressão franquista em Badajoz. Foto reproduzida do El Salto Diário.
Repressão franquista em Badajoz. Foto reproduzida do El Salto Diário.

O massacre de Badajoz faz este domingo 86 anos. Entre as tropas do “carniceiro” general Juan Yagüe que invadiram a cidade no início da guerra civil espanhola e assassinaram cerca de 4.000 pessoas contava-se o Tercio Duque de Alba da Legião espanhola. Criada à imagem da Legião Estrangeira francesa para combater os anticolonialistas do Rif, esta unidade originalmente composta de estrangeiros integra o Exército de Terra espanhol e está estacionada em Ceuta.

De acordo com o jornal Público espanhol, os seus atuais dirigentes continuam a reivindicar e celebrar os crimes então cometidos. Na página oficial do Exército de Terra espanhol, na secção do Tercio Duque de Alba, gaba-se o facto da unidade militar se ter “distinguido nos combates de Mérida e na tomada de Badajoz”. Isto para além de fazer o mesmo sobre outras batalhas como as que redundaram na ocupação de Madrid pelos golpistas de extrema-direita.

Os responsáveis pela unidade elogiam as medalhas conquistadas por estes factos, atribuídas pela ditadura de Franco e que, aliás, continuam vigentes e a ser usadas pelos legionários, insistindo até que “seria conveniente” incluir na sua lista as medalhas individuais “ganhas pelos chefes, oficiais, sargentos e tropas” para “dar a conhecer a todos os espanhóis a natureza exemplar destas forças, a sua coragem, abnegação, sacrifício e serviço constante à pátria, e o melhor cumprimento do dever e verdadeira disciplina, de que a Legião é um exemplo”. Os “caídos” nestes combates também são frequentemente homenageados como, por exemplo em junho de 2017, quando o coronel que chefia a unidade, Félix Abad, referiu esse passado como estando pejado de “factos heroicos e exemplares dos nossos predecessores” que “não devem ser esquecidos mas sim recordados para que sirvam de referência e marquem o rumo das nossas ações e missões”.

Terá sido o massacre mais intenso da Guerra Civil espanhola

Para não deixar cair em esquecimento nem ceder aos revisionismos históricos, o mesmo jornal recolhe as notas elaboradas pela Associação para a Recuperação da Memória Histórica da Estremadura que sublinha que este massacre “foi uma das primeiras provas face ao mundo da política de extermínio do adversário programada pelos militares golpistas” e que Badajoz deve ser “a cidade espanhola em que, em relação ao conjunto da sua população, o maior número de pessoas foram assassinadas como consequência do golpe militar e do massacre depois da ocupação de agosto de 1936”.

A ARMHEX tem procurado vestígios desse crime e exumar as fossas comuns onde as vítimas do franquismo foram colocadas para fazer frente a “poderosos obstáculos: o tempo passado, o paulatino desaparecimento dos protagonistas, um notório desconhecimento histórico entre as novas gerações e, sobretudo, a oposição frontal de alguns poderes mediáticos e grupos políticos muito interessados em ocultar esse passado da nossa sociedade”.

Cita-se ainda o “trabalho exaustivo do historiado Francisco Espinosa, autor do livro La columna de la muerte de 2003 que conseguiu encontrar os registos documentais nos livros de cemitério e no Registo Civil de 1.400 assassinatos e que comprovou que o número de vítimas superaria as 3.800.

A justiça e a reparação são tarefas pendentes”

Na sequência da notícia do Público, a Plataforma Agosto Antifascista de Badajoz emitiu um comunicado a condenar os conteúdos presentes na página do Exército em que “longe de mostrar o menor sinal de pesar ou arrependimento por este terrível episódio, é enaltecido e reivindicado, sem nenhum tipo de respeito nem pela história da cidade nem pelas suas vítimas.”

Estes ativistas antifascistas fazem questão de sublinhar algumas das outras atrocidades cometidas para além dos assassinatos de que foram vítimas específicas as mulheres como “violações em grupo e diferentes atos humilhantes e vexatórios como a rapar cabelos e obrigá-las a passear nuas pelas ruas”.

Denuncia-se que “depois de 40 anos de ditadura, personalidades políticas, militares e religiosas que juraram lealdade aos princípios da ditadura integram-se no aparelho “democrático” apenas com uma mera mudança de imagem. O Estado e as instituições que emanaram de 1939 continuam intactos”, garantem.

Afirmam que “declarações como as do comando do Tercio Duque de Alba, e a sua mera sobrevivência como instituição, retratam o Estado. A verdade, a justiça e a reparação são tarefas pendentes e até que aconteçam, a Espanha não estará em condições de ser um Estado democrático.”

Esta organização tem sido uma das que organizam todos os anos o Agosto Antifascista em Badajoz. Como noticia o El Salto, este ano aconteceu já, dia 4, um debate sobre a educação na República; dia 7, uma visita guiada a alguns dos locais históricos desta matança; este sábado houve debates, leituras coletivas, projeções de filmes e concertos. Neste domingo, há uma manifestação à noite e, segunda-feira, dia 15, a clássica concentração com oferta de flores no cemitério de São João Batista.