A região do Pantanal, no Brasil, está a ser há semanas fustigada com incêndios que já terão destruído mais de 10% do território. Com 62% da sua área em território brasileiro (o restante situa-se no Paraguai e Bolívia), a devastação causada pelos fogos tem exposto a ineficiência de política e prevenção e de combate a degradação ambiental no país.
O Pantanal está a sofrer este ano uma das piores secas em décadas, um problema que se agrava pela ineficiência das autoridades em controlar o fogo, geralmente provocado pela ação humana, que se espalha rapidamente e chega a áreas de difícil acesso. De acordo com o apurado pela agência Lusa junto de especialistas, a ausência de fiscalização e de trabalho de prevenção no início da época das queimadas amplia este problema.
De acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), órgão governamental responsável pela monitorização do território via satélite, o Pantanal registou um aumento de queimadas na ordem dos 228%. Para se ter uma ideia, entre 1 de janeiro e 3 de setembro de 2019 ocorreram 3.227 focos de incêndio na região, sendo que este ano o valor já ultrapassa os 10.600 no mesmo período.
"Percebemos focos de incêndio no Pantanal até mesmo em janeiro, uma época atípica para a região porque geralmente está chovendo e você não tem incêndios naquela região […] Este ano a Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] do Pantanal já constata que é a pior da seca nos últimos 47 anos", explicou à Lusa Júlio Sampaio, líder da Iniciativa Pantanal do WWF-Brasil.
Num ano de seca, em que choveu menos de metade do habitual, “o rio Paraguai não subiu, não encheu o Pantanal e o que sobrou foi uma paisagem formada por gramíneas, que num período muito seco se tornam um combustível para incêndios ambientais", acrescentou o especialista.
Na estação chuvosa o Pantanal costuma ter cerca de 80% da sua área inundada, naquele que é considerado um santuário que preserva uma fauna extremamente diversa, sendo o lar de animais como a onça pintada e a arara azul.
Felipe Augusto Dias, diretor executivo da Organização não-Governamental SOS Pantanal, também citou a seca extrema como dado determinante para as queimadas.
"A planície [do Pantanal] é alagada por uma água que vem de áreas externas. As chuvas acontecem nas partes altas e escoa em direção a planície […] a fonte principal desta água é o rio Paraguai, que extravasa e vai lentamente inundando a área. O que aconteceu de diferente é que em janeiro não houve a cheia [alta do rio provocada pela chuva] de forma adequada", salientou.
"O fogo que acontece todo o ano ampliou a sua área, hoje já temos mais de um milhão e quatrocentos mil hectares de áreas queimadas, segundo os dados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (LASA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e infelizmente não temos ainda dados sobre os impactos deste fogo na vegetação", completou.
96% do território do Pantanal brasileiro pertence a privados. Tradicionalmente, os fazendeiros desenvolvem atividades agropecuárias em total respeito pelo clima e pelas condições da região. Porém, muito do trabalho envolve fogos, algo que Júlio Sampaio, da WWF-Brasil, considera que pode causar muitos estragos se não tiver uma vigilância ativa da parte das autoridades.
"O Governo está tentando tapar o sol com a peneira. Em nível de combate, os brigadistas e os bombeiros trabalham fortemente para evitar a propagação das chamas, mas precisam de estruturas melhores de trabalho, deveria haver uma brigada nacional para combater incêndios […] A Política ambiental no Brasil falha e estão deteriorando tudo que havia de razoável e bom no país", referiu Felipe Augusto Dias.
O responsável da WWF-Brasil destacou que a política ambiental é uma pasta crítica desde o início do Governo do Presidente Jair Bolsonaro e embora tenham ocorrido denúncias dentro e fora do país não foram dadas respostas adequadas às críticas e problemas.
"No Pantanal a ação vem de forma tardia. O ministro [Ricardo Salles, do Meio Ambiente] e o Presidente estiveram na região, indicaram recursos para combater estes incêndios só que não houve nenhuma discussão sobre modelos de gestão e prevenção nos meses anteriores", criticou o especialista.
"O custo de apagar um incêndio no Pantanal é muito mais alto do que implementar uma estratégia eficiente de proteção, monitorização do fogo naquela região. O que a gente espera são ações efetivas", concluiu.