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França proibiu publicidade a combustíveis? Nem por isso, dizem ambientalistas

Entrou em vigor esta semana a medida inscrita na Lei do Clima aprovada no ano passado. Mas os ambientalistas dizem que pouco irá mudar na prática.
Foto Frédéric Bisson/Flickr

A intenção inicial expressa na Convenção cidadã pelo clima em 2020 era de proibir a publicidade a "todos os produtos que tenham um forte impacto sobre o ambiente". Mas a lei aprovada no ano passado e que entrou esta segunda-feira em vigor fica muito aquém do que era pretendido. E pode mesmo tratar-se de um caso de publicidade enganosa, a julgar pelos títulos da imprensa internacional sobre a proibição da publicidade em combustíveis em França.

Na prática, a proibição abrange a publicidade direta a produtos energéticos petrolíferos ou energia obtida pela queima de carvão e carbono contendo hidrogénio, um tipo de publicidade que já não é muito comum. As empresas deixam de poder publicitar os preços de venda ou mostrar bombas de gasolina em plano de fundo nos seus anúncios. De fora desta limitação fica o gás até junho do próximo ano, um adiamento justificado pelo fim das tarifas reguladas nessa altura e a liberalização do mercado do fornecimento do gás, com a necessidade das diversas marcas se darem a conhecer aos consumidores.

Mas a indústria petrolífera também não tem grandes razões para se preocupar, uma vez que os seus patrocínios, mecenatos e comunicação institucional ficam a salvo da proibição, continuando a garantir-lhes espaço publicitário de sobra, aponta a Greenpeace França. Por outro lado, cada vez mais estas grandes petrolíferas apostam em publicidade a destacar as energias renováveis, procurando vender uma imagem "verde", enquanto a esmagadora maioria do seu investimento continua concentrado no petróleo e gás.

Para a jurista e membro da associação Resistência à Ação Publicitária, Sarah Denisse, a lei deixa também de fora a publicidade aos biocombustíveis responsáveis pela desflorestação. No entanto, o seu maior mérito é o de abrir a porta a medidas mais restriticas. "Neste momento, não irá mudar grande coisa. Mas constatamos com esta lei que não existe nenhum obstáculo jurídico para proibir publicidades por razões de proteção do ambiente. Será então possível ir mais longe no futuro, como creio ser indispensável", aponta Sarah Denisse.

Os ambientalistas da Greenpeace insistem que é preciso proibir a propaganda da indústria fóssil em todas as suas dimensões, incluindo os fabricantes de automóveis, as companhias aéreas e marítimas, o que abrange os seus mecenatos culturais, patrocínios desportivos e outras parcerias "com que conseguem desviar a nossa atenção do impacto climático desastroso das suas atividades".

A medida não seria inédita e replica o que foi feito no início dos anos 1990, tendo como alvo a indústria do tabaco, impedida de publicitar ou patrocinar e apoiar quaisquer eventos culturais e desportivos. "A OMS calcula que a poluição do ar provocou 8,7 milhões de mortes prematuras no mundo, sem contar a crise climática que fez igualmente muitas vítimas. São bem mais que as do tabaco. Então porque é que uma lei dessas não pode existir também para as empresas de bens e serviços fósseis?", questiona a organização nesta iniciativa legislativa europeia que lançou para que o assunto seja discutido ao nível da União Europeia. A iniciativa precisa de um milhão de assinaturas para ser considerada pela Comissão Europeia e tem agora cerca de 285 mil.

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