Urgência climática

Espanha cria licença de quatro dias durante catástrofes e proíbe “tarifas dinâmicas”

29 de novembro 2024 - 10:37

Medidas anunciadas esta quinta-feira visam acabar com os preços especulativos das plataformas digitais em situações classificadas como emergência pela proteção civil, bem como evitar que se repita o abuso patronal que obrigou milhares de trabalhadores a permanecerem nas empresas durante o alerta vermelho na região de Valência.

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Impacto das cheias na região de Valência
Impacto das cheias na região de Valência. Foto INESE SPS/Flickr

Durante as cheias de Valência, muitas empresas foram criticadas por terem obrigado os seus trabalhadores a permanecerem nos postos de trabalho apesar do aviso vermelho emitido pela agência meteorológica nacional. Milhares de pessoas acabaram por ser apanhadas pelo temporal a meio do trajeto de ida e volta do trabalho e ficaram impedidas de se reunirem com as famílias ou prevenirem estragos nas suas residências. Com o agravamento da tempestade que fez mais de 200 mortos a cortar as estradas, muitas só puderam regressar a casa no dia seguinte.

“Nenhum trabalhador deve correr riscos”, afirmou a ministra do Trabalho Yolanda Díaz na apresentação da lei que garante uma licença sem perda de remuneração até quatro dias em caso de emergência meteorológica, prorrogáveis se as circunstâncias se mantiverem através do regime de lay-off. A lei atual já permite que o trabalhador não compareça ao trabalho nessas circunstâncias e esta alteração vem reforçar e concretizar a medida na lei laboral. “Face ao negacionismo climático das direitas, o Governo de Espanha está comprometido com políticas verdes”, concluiu a ministra.

Algoritmos das plataformas digitais não vão poder subir preços durante catástrofes

O Governo espanhol anunciou que vai alterar a lei de defesa dos consumidores para proibir as chamadas “tarifas dinâmicas” usadas pelas plataformas digitais de entregas, transportes ou alojamento em alturas de emergência decretada pela proteção civil. Os algoritmos usados por estas plataformas definem o preço de acordo com a procura, o estado do tempo e outras variáveis que acabam por tornar o preço personalizado, até consoante o estado da bateria do telemóvel.

Na sequência das cheias de Valência, o executivo decidiu, sem nomear nenhuma das empresas do setor, proibir o aumento de preços em “contexto de urgência, risco ou necessidade da pessoa consumidora”. Além das empresas de TVDE,  estafetas e alojamento, outras plataformas como a Amazon ou as companhias aéreas também utilizam estas tarifas e ficam sob a alçada desta lei. “Para garantir o acesso a bens ou serviços essenciais nesta situação, é necessário evitar potenciais aumentos abusivos dos preços, através da personalização dos preços que dificultem ou impossibilitem o acesso”, justifica o ministério liderado por Pablo Bustinduy.

Outra das medidas aprovadas tem a ver com o plano das ajudas de 10 mil euros na compra de automóvel para quem ficou sem o seu devido às cheias. Segundo a nova lei, os concessionários e pontos de venda que adiram ao programa não poderão vender os carros a um preço maior do que estava fixado na véspera da catástrofe.

As duas alterações à lei para proteger os consumidores juntam-se a uma outra já anunciada no dia 11 no mesmo sentido, fixando também os preços do dia 28 de outubro como limite, dessa vez para os serviços funerários. “Uma tragédia com estas características não pode ser um contexto que dê origem ao benefício económico de qualquer operador”, sublinhou Bustinduy. 

Sánchez diz que “não falhou o sistema, falharam algumas das suas peças”

Na quarta-feira, o primeiro-ministro espanhol foi ao Parlamento para dar conta da ação do Governo na resposta à emergência entre 28 de outubro e 4 de novembro na região de Valência. Acossado pela direita que detém o Governo Autonómico valenciano e que foi acusada de incúria e incompetência antes, durante e após as trágicas cheias, Pedro Sánchez afirmou que os organismos dependentes do governo central “cumpriram com o seu dever” e anunciou mais um pacote de ajudas no valor de 2.274 milhões de euros para a reconstrução e apoios as vítimas, num total de mais de 16 mil milhões de euros alocados a este plano.

“A seguir a este terceiro pacote virão tantos quanto forem necessários”, prometeu Sánchez, manifestando abertura à constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à resposta à catástrofe. O primeiro-ministro aproveitou para defender o modelo autonómico do Estado espanhol, afirmando que “não falhou o sistema, falharam algumas das suas peças”. E apelou a uma reflexão sobre como melhorar o modelo de cogovernança e como construir “uma verdadeira cultura de prevenção” e de preparação das cidades para as alterações climáticas.