O Tribunal Constitucional da Turquia tinha decidido, em abril de 2023, pela inconstitucionalidade do artigo do Código Civil do país que obrigava as mulheres a adotar o nome de família do marido. Esta instância judicial considerou então que isto violava o princípio de igualdade entre homens e mulheres e deu um prazo, até janeiro deste ano, para mudar a legislação.
Só que o partido no poder, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento, liderado pelo presidente Erdogan, não só não alterou a lei como quer fazer este princípio voltar e entregou assim uma proposta de lei ao Parlamento, no âmbito da 9º pacote de reforma judicial, nesse sentido. Para esta força política trata-se de manter “a integralidade da família” e de “proteger as crianças”.
As organizações não governamentais feministas discordam. Özlem Günel Teksen, advogada e membro da plataforma ESIK, a Plataforma das Mulheres pela Igualdade, em declarações citadas pela RFI, contrapõe que isto um “mero pretexto” porque “nenhuma família esteve nunca ameaçada, nenhuma criança foi alguma vez lesada por a sua mãe manter o seu nome de nascimento”. Pelo contrário, “o que ameaça a integralidade da família, na Turquia em paritcular, são as violências intrafamiliares… que o Governo não faz nada para impedir”.
A militante pelos direitos das mulheres sublinha ainda que “o objetivo, aqui, é impor uma visão patriarcal da família, reestabelecer o conceito de “chefe de família” que tinha sido suprimido pelo Código Civil de 2001”.
A proposta de lei é também ela uma afronta ao Tribunal Constitucional, o que a RFI classifica como “uma prática recorrente nestes últimos anos”.
Numa lista elaborada no início deste ano, o Centro para a Liberdade de Estocolmo concluiu que em 2023 continua a haver uma escalada de violações contra os direitos das mulheres com o aumento de números de femicídios, proibição de eventos organizados por grupos que lutam pelos direitos das mulheres e prisões de mulheres que protestam contra a violência de género.
A Plataforma Vamos Parar o Femicídio, Kadın Cinayetlerini Durduracağız Platformu, contabilizou pelo menos 315 femicídios e 248 casos suspeitos. As ativistas dos direitos humanos têm criticado o sistema judicial pelas penas reduzidas em casos de violência de género, muitas vezes com alegações de que os criminosos foram “provocados”.
No 8 de março, dia Internacional da Mulher, a marcha feminista foi proibida na zona central de Istambul, sob o pretexto de manter a ordem pública e a segurança nacional. A Marcha Noturna Feminista desse dia, no bairro de Taksim, foi atacada pela polícia com gás pimenta e pelo menos dez mulheres foram presas.