Casos detetados de legionella atingem número máximo numa década

10 de novembro 2025 - 10:21

Pouco mais de dez anos depois do surto em Vila Franca de Xira que afetou mais de 400 pessoas, os casos estão em alta. DGS fala em melhorias na deteção. Médicos de saúde pública alertam para falta de planos de prevenção e de aplicação de medidas de mitigação. Para além de equipamentos de água que envelhecem “sem a devida manutenção”.

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Bactéria da legionella.
Bactéria da legionella.

É preciso recuar até 2014 para obter números mais altos de casos da doença da legionella em Portugal, 556. Em novembro desse ano, a legionella espalhou-se pelo concelho de Vila Franca de Xira, sobretudo pelas freguesias de Póvoa de Santa Iria, Forte da Casa e Vialonga, atingindo mais de 400 pessoas, 12 morreram, muitas mais ficaram com sequelas para a vida, naquele que foi considerado o terceiro maior surto da doença no mundo. Pelo menos 330 pessoas afetadas, denuncia a Associação de Apoio às Vítimas da Legionela de Vila Franca de Xira, continuam sem ter recebido qualquer indemnização ou apoio público.

O ano passado, de acordo com o relatório anual dos serviços de águas e resíduos em Portugal, divulgado pela Entidade Reguladora do Setor das Águas e dos Resíduos, houve em todo o país 489 casos detetados.

Ao Jornal de Notícias, que noticia esta quinta-feira estes dados, a Direção-Geral de Saúde deu conta, entre 2015 e 2024 de 2.665 casos confirmados através da plataforma informática do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica. As mortes situar-se-ão nos 8.3% dos casos detetados, afirma-se. Já este ano, só entre 21 de setembro e 21 de outubro, houve mais 36 casos.

A entidade justifica os números com o “aumento do alerta clínico” e a “melhoria na adesão à notificação”. No relatório da Ersar, por sua vez, também se refere a “melhoria contínua do sistema de vigilância” mas acrescenta-se que o aumento de casos também está associado “a um aumento de infraestruturas que utilizam água e que formam aerossóis, e a um aumento da população exposta e à sua maior vulnerabilidade que, devido ao envelhecimento e alterações climáticas, influenciam a dispersão dos aerossóis no espaço público”.

Aquele órgão de comunicação social falou ainda com o presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, Bernardo Gomes, que lembra que “em 2023, foi atualizado o decreto-lei que estabelece o regime jurídico da qualidade da água destinada ao consumo humano, passando a prever a necessidade de pesquisa de legionela na água de consumo humano em instalações prioritárias, designadamente hospitais, instituições de ensino e outras”.

O problema é que falta, em grande medida, concretizar o que está nessa lei: “a maior das responsabilidades recai em empresas e organismos públicos na manutenção dos seus equipamentos, que têm maior potencial para provocar surtos. E era expectável que estas instituições já tivessem implementados os planos de prevenção e controlo previstos na portaria. Contudo, embora tais planos tenham sido implementados em alguns estabelecimentos, outros ainda não os têm em vigor”.

Sobre medidas de mitigação afirma que “a maioria das ações de mitigação está, na verdade, publicada em legislação. O que falta, em muitos casos, é a implementação. A legislação define equipamentos de alto e de baixo risco, e perante a indisponibilidade de recursos para verificar o cumprimento em todos os níveis de risco e em todas as instituições, procede-se à priorização, que é feita com base no risco”.

O clínico pensa que é necessária prudência na avaliação das causas. “Devemos ter a prudência de colocar em cima da mesa a hipótese de estarmos a conseguir diagnosticar mais casos desta doença, assim como a melhoria do trabalho de vigilância, como um todo, por parte dos serviços de saúde pública”. Mas acrescenta outra hipótese, “a de termos equipamentos de água a envelhecerem sem a devida manutenção”.