A história de um ajuste direto que foi travado antes de ver a luz do dia é resumida numa reportagem da CNN Portugal. Antes de ser presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas encontrou-se com o economista e gestor de fundos Pedro Santa Clara, o fundador e membro do conselho de curadores do think-tank +Liberdade que foi o mandatário da Iniciativa Liberal nas últimas legislativas. Nesse encontro entre "amigos", Moedas terá apresentado o projeto TUMO "como o projeto de educação mais extraordinário que tinha conhecido enquanto comissário europeu”.
Este projeto foi criado por um casal de arménios em 2011 e destina-se a formar jovens em competências que juntam tecnologia e criatividade. A experiência em Erevan replicou-se depois pela Europa, com a abertura de centros TUMO em vários países em regime de franchising, que Moedas chegou a inaugurar enquanto comissário europeu. O amigo liberal de Moedas agarrou na ideia e através de uma das suas empresas, a Shaken Not Stirred, trouxe-a para Portugal. Para isso criou uma associação, a TopSail, formada pelos mesmos funcionários da empresa, que assinou o franchising do projeto TUMO e conseguiu que a Câmara de Coimbra o apoiasse com 250 mil euros.
Na entrevista dada por Pedro Santa Clara ao Observador em outubro de 2023, quando pretendia instalar o projeto TUMO nas salas de cinema desativadas do Monumental, o agora mandatário da Inicialtiva Liberal dizia que a Câmara de Moedas o estava a apoiar na procura de espaços há pelo menos dois anos, ou seja, desde a tomada de posse. Esta semana, Carlos Moedas tinha agendada uma proposta para a Câmara de Lisboa pagar cinco milhões de euros à associação de Pedro Santa Clara - ao ritmo de um milhão por ano - para implementar o projeto TUMO no Beato.
Por se tratar de uma associação, deixa de ser obrigatório o concurso público para o financiamento sair dos cofres da autarquia. Mas o que mais estranhou a oposição, além da proximidade entre os protagonistas e do nascimento da ideia do projeto, foi que nada sobre este projeto educativo apontado como um modelo a seguir passou pelas estruturas camarárias responsáveis pela Educação, sendo desenvolvido apenas pela Direção Municipal de Economia. Por outro lado, na proposta de Moedas - retirada pelo próprio ao constatar não ter maioria para a aprovar - todas as despesas com renda, formação dos formadores, franchise e ordenados - estariam a cargo do município. Sobram ainda outras dúvidas que a proposta não esclarecia, como por exemplo a localização do projeto no hub do Beato e não nas escolas, levantando a questão do transporte das crianças vulneráveis de bairros distantes, ou se o projeto seria afinal dedicado a alunos de escolas públicas ou privadas.
Carlos Moedas tinha defendido a seguir às eleições legislativas, em artigo de opinião no Eco, que "Lisboa precisa de um TUMO". Agora lamentou à CNN não poder avançar com o projeto que em tempos convenceu o amigo a adquirir e agora queria pôr os lisboetas a financiar com cinco milhões de euros, o equivalente à despesa com refeições escolares num ano ou da reabilitação de uma escola, ou mais do dobro do que a Câmara atribui aos alunos das escolas públicas para aquisição de equipamento desportivo, musical, tecnológico e didático. E ainda criticou a oposição por ter “a estratégia habitual de criar dúvidas, levar ao adiamento de propostas e depois apresentar alternativas sem fundamento (como foi o caso) só para boicotar as propostas iniciais”.