A notícia passou desapercebida nos grandes média generalistas: o Banco Mundial reconheceu em Dezembro de 2007 que sobreavaliou o produto interno bruto da China desde há anos. Eis o que se passou.
por Damien Millet e Éric Toussaint, publicado orignalmente no site do Comité Para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo
Com uma soma fixa, digamos 10 dólares, um consumidor "xis" não pode evidentemente comprar a mesma quantidade de bens em Nova York, em La Paz, em Kinshasa ou em Pequim. Para apagar estas diferenças e comparar montantes de PIB comparáveis, o Banco Mundial utiliza uma conversão dos montantes em causa em paridades de poder de compra (PPA).
A questão, em primeiro lugar, é de saber que preços são levados em conta. E aí, a opacidade é grande. Como é integrado neste cálculo o acesso à educação ou aos cuidados de saúde? Que bens e serviços de base intervêm realmente nesta conversão?
O certo é que os preços (ou o custo de vida) considerados pelo Banco Mundial no caso da China eram inferiores à realidade. Em Dezembro de 2007, o Banco Mundial reconheceu que o peso da economia chinesa era de facto inferior em 40% às estimativas precedentes. Não é pouco. Assim, o PIB da China expresso em PPA para 2005 seria 5.333 mil milhões de dólares em vez dos 8.819 mil milhões da anterior estimativa. A tendência é sem dúvida a mesma para a Índia, a outra grande potência asiática emergente.
Mas trata-se realmente de um simples erro? O Banco Mundial dispõe de toda uma bateria de especialistas altamente remunerados e perfeitamente capacitados para detectar muito mais cedo um erro como este. No entanto, o Banco Mundial comete este erro habitualmente: já em muitas oportunidades as suas estimativas estavam erradas e isso permitiu que esta ponta de lança da globalização neoliberal impusesse as suas exigências. Por isso, no caso da China, a quem beneficia o crime?
Justamente ao Banco Mundial e aos que defendem o modelo económico dominante. Porque esta sobreavaliação tem repercussões sobre o crescimento mundial, que seria de 4,5%, em vez dos 5% anunciados. Este argumento é muitas vezes avançado para explicar que, com tal crescimento, as coisas estão a melhorar no mundo, prova de que o sistema actual vai trazer prosperidade e felicidade...
Mas esta sobreavaliação tem também importantes repercussões no discurso ligado à redução da pobreza. Porque ainda segundo o Banco Mundial, o número de pobres baixou de cem milhões entre 1990 e 1999, graças aos números que vêm da China e da Índia (menos 200 milhões), enquanto que este número aumentou nos outros continentes (mais 100 milhões). Com a reavaliação em curso, o número de pessoas a viver com o equivalente a menos de 1 dólar por dia na China vai aumentar em cerca de 200 milhões. Se fizermos o mesmo trabalho na Índia, vamos perceber que, de facto, o número de pobres absolutos no mundo aumentou.
Não só a credibilidade dos estudos do Banco Mundial é gravemente posta em causa, mas é a própria lógica do seu discurso sobre a redução da pobreza e os benefícios da globalização neoliberal que se afunda.
Tradução de Luis Leiria