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Serviço militar obrigatório: come e cala-te
O serviço militar obrigatório (SMO) tem sido tema de conversa no nosso país depois do Ministro da Defesa ter lançado a proposta. A retórica de quem defende a proposta argumenta que os jovens precisam de ser moldados pelo SMO nos valores do respeitinho à pátria e da disciplina perante a autoridade. Outros argumentam que o SMO será um reforço à democracia. Pois bem, a pergunta que se coloca é se existirão ou não melhores formas de fomentar o instinto cívico na juventude portuguesa.
Na minha opinião, que penso que é partilhada por muitos e muitas democratas e socialistas, uma política para o pleno emprego teria um efeito muito mais eficaz nesse sentido. Bem como um reforçado serviço nacional de saúde, sem as amarras que o prendem ao parasitismo dos operadores privados, capaz de dar resposta rápida e eficiente às necessidades da população; ou o reforço do nosso sistema de ensino que garanta a sua gratuitidade, democraticidade de qualidade, que acompanhe o estado-de-arte da pedagogia; ou então o reforço do nosso sistema de transportes públicos para que sirva a população e não o interesse privado e pleno direito à habitação. A política é feita de escolhas.
Por último, dentro do espetro mais reacionário, encontramos argumentos que remetem para o papel do serviço militar na formação de “homens de verdade”. Esta linha é um verdadeiro abrir de olhos para a sociedade machista que ainda temos e um aviso para a necessidade do feminismo.
A intenção do governo Português em aumentar a despesa dedicada às forças armadas e regressar com o serviço militar obrigatório não pode ser interpretada sem considerarmos a disposição geopolítica global. Nos corredores de Bruxelas, discute-se seriamente a criação de uma força militar à escala da UE, onde o governo de Costa fez questão de estar presente. O debate pode ser estranho já que não surgiu por vontade popular. Porém, a explicação fica clara quando consideramos o papel de Trump e as suas posições que passam pela exigência de que os estados membros da NATO contribuam para a organização 4% do PIB. A proposta fica ainda mais clara no contexto atual da Europa Fortaleza com fronteiras fechadas para travar os refugiados, sendo possível concluir o caminho que se tenciona fazer. É para dar resposta a estas circunstâncias que surge esta proposta de imposição de serviço militar.
Qualquer democrata e socialista deve bater-se por uma sociedade pacífica, defendendo tanto a desmilitarização como a desnuclearização global. Assim, a cedência do governo português às posições militaristas como o regresso do SMO é totalmente inaceitável e retrógrada.
Para além de uma cedência inaceitável ao militarismo e as ambições imperialistas de Trump e ao fechamento da Europa Fortaleza, a obrigatoriedade de se prestar serviços numa força militar retira a autonomia individual que existe de decidir aquilo que queremos fazer. Desmancha a ideia de que cada um pode fazer aquilo que quer e de que gosta a nível profissional. É portanto, também um ataque à liberdade individual de escolha.
Porém, considero justas as reivindicações por melhores salários e condições de trabalho de quem, por livre vontade, opta por prestar serviço militar. A questão problemática está sim na obrigatoriedade.
Enquanto jovem de 19 anos, só posso sentir que me está a ser retirado mais um pedaço da liberdade que tenho no registo da fórmula do come e cala-te
O debate sobre o SMO deve assumir-se como um debate sobre a sociedade que queremos construir. Colocando a hipótese de uma sociedade que valoriza a violência e a força em detrimento do pleno emprego e da garantia que os cuidados de saúde, educação e habitação como direitos universais para todas e todos, ou então, defendendo uma sociedade que escolhe a obediência e servidão ao poder instituído, em vez da reflexão crítica e do questionamento permanente de todas as expressões que a opressão pode assumir – estamos a construir uma ameaça a uma sociedade verdadeiramente democrática no pleno sentido do conceito. É essencial caminhar para uma posição crítica e construtiva, reivindicativa e progressista e não fazer a cedência ao militarismo e ao seguidismo.
Enquanto jovem de 19 anos com o ensino obrigatório concluído, ao me deparar com a possibilidade de me ser imposto o serviço militar, só posso sentir que me está a ser retirado mais um pedaço da liberdade que tenho no registo da fórmula do come e cala-te. Enquanto socialista e democrata, considero que é totalmente inaceitável a possibilidade de um retorno aos tempos do militarismo, da valorização da força e do seguidismo da autoridade.
Texto de Ernesto Oliveira
Comments
Mas qual o mal de prestar
Mas qual o mal de prestar serviço militar. Por acaso você sabe em que consiste o serviço militar, o serviço militar obrigatório? Ao regressar seria óbviamente diferente do que era antigamente. Penso que por vezes aquilo que paira no ar por parte dos partidos de esquerda ainda é aquele fantasma do 25 de Novembro. Mas ideologias a parte, é fundamental para uma nação, ter estas liberdades que todos nós gostamos de ter só são possíveis através das forças armadas e de segurança . O ser humano é um animal racional, sim. Mas altamente competitivo e que por muito que se negue é propício para o conflito.
Pergunto eu, quando o senhor se sente doente tem um SNS, praticamente gratuito. Qual seria o problema de durante 6 meses experienciar uma realidade diferente. Aprender algo novo? Penso que este assunto para além de ser uma pedra no sapato dos partidos de esquerda, por motivos históricos. Não deixa de ser um enorme rochedo nas Nike Air force do pessoal das jotas. E quanto ao exército comum europeu, não vai passar de uma ideia de papel amarfanhado.
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