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"Se o governo não fez, fazemos nós": Bloco apresenta plano para recuperar a ferrovia

O Bloco apresentou este sábado a sua proposta de um plano ferroviário nacional para as próximas décadas. Reabertura e construção de novas linhas visam recuperar a ferrovia para níveis mais próximos da média europeia. Promover a coesão do território, proteger o ambiente, aumentar a capacidade produtiva do país são objetivos centrais.
Catarina Martins na apresentação do plano ferroviário do Bloco, Peso da Régua. Foto de Paula Nunes.
Catarina Martins na apresentação do plano ferroviário do Bloco, Peso da Régua. Foto de Paula Nunes.

Linha do Norte quadruplicada na íntegra, uma terceira travessia do Tejo só para comboios, uma nova linha para o interior do país — eis alguns dos planos do Bloco para recuperar a ferrovia em Portugal. A proposta de um novo Plano Ferroviário Nacional foi apresentada este sábado na estação de Peso da Régua por Catarina Martins, Marisa Matias e Heitor de Sousa.

O abandono a que a ferrovia esteve votada durante décadas fez de Portugal um dos países com menos quilómetros de carris por habitante na Europa, e também por área. Hoje em dia, menos de 5% do transporte de passageiros e mercadorias faz-se de comboio. Recuperar esta quota para 40% nas próximas duas décadas é um objetivo central da proposta do Bloco.

Catarina Martins criticou o governo por não ter apresentado um plano ferroviário nacional, que foi encarregado de elaborar pelo parlamento, e contrapôs que "se o governo não fez, fazemos nós". Acrescentou que "ouvimos muita gente, tivemos a colaboração de pessoas de todo o país, foi muito debatido. E apresentamos agora nós esse trabalho que não foi feito pelo governo ao longo da legislatura, como o parlamento tinha aprovado".

O plano rege-se por três grandes princípios, explicou a porta-voz do Bloco: coesão territorial, promoção da mobilidade e defesa do ambiente. Assim "em vez de nos ficarmos por fazer do interior um corredor onde só passam comboios de mercadorias, apresentamos um plano nacional que pensa as questões da coesão do território". Ao longo de décadas, "houve um projeto claro para desmantelar a ferrovia" e apostar na rodovia "com as suas PPPs, portagens, e o preço incomportável dos combustíveis". Quem vive no interior pouco beneficiou, pois "fechou-se serviços públicos e pôs-se alcatrão, mas o efeito foi zero para o equilibrio do território". E a perda de população do interior não trouxe benefícios para o país: "vive-se pior no interior porque faltam serviços públicos e transportes, e vive-se pior nas áreas metropolitanas porque há muita gente e eles também rebentam pelas costuras".

Para contrariar esta tendência, o plano propõe diversas reaberturas de linhas e construção de novas linhas. A linha do Norte deve ser quadruplicada em toda a sua extensão, em vez da proposta do governo de quadruplicar apenas uma parte. Lisboa passa a ter uma circular ferroviária fechada que permite circular ininterruptamente de Cascais para o Centro e Norte do país. Braga passa ter uma nova ligação direta a Guimarães; Aveiro ligação direta a Mangualde com passagem por Viseu, e outra até à Figueira da Foz junto à costa. Outra linha nova liga Santarém a Peniche, passando por Rio Maior, Caldas da Rainha e Óbidos.

Outra proposta de relevo é um novo corredor ferroviário que ligue o interior de Norte a Sul do país, para evitar que "as pessoas tenham de vir sempre ao Entroncamento, ao Porto, a Lisboa" para cruzar o país pelo interior, afirmou Heitor de Sousa na sessão de apresentação. Este corredor permitiria também reabilitar as linhas de transporte de mercadorias que havia no Alentejo, como a linha de Évora e o ramal de Vila Viçosa.

O combate às alterações climáticas e a defesa do ambiente dariam um passo de gigante com o plano, pois a ferrovia é a "única forma de conseguir uma redução efetiva e rápida das emissões de gases com efeito de estufa", afirmou Catarina Martins. Marisa Matias acrescentou que esta seria uma via fundamental para diminuir a intensidade carbónica da economia portuguesa, matéria em que Portugal está "muito atrás da União Europeia", que já de si está "muito atrás das metas para cumprir os objetivos da conferência de Paris e do Painel Intergovernamental das Nações Unidas".

Outra prioridade é o aumento da capacidade produtiva do país e a criação de emprego: "se vamos investir muito em ferrovia, devemos investir também na construção em Portugal, para aumentar o emprego qualificado", explicou Catarina Martins. Recuperar as oficinas da EMEF para construir material circulante seria assim a forma de evitar comprar tudo ao exterior e qualificar o trabalho em Portugal.

A recuperação de uma gestora pública autónoma para a ferrovia é outra proposta. O governo de Passos Coelho fundiu as antigas Refer e Estradas de Portugal na Infraestruturas de Portugal (IP), processo que não foi pacífico e agravou as dificuldades da ferrovia, separando ainda mais os operadores de comboios do gestor da rede. A prova está na execução do atual plano Ferrovia 2020, que se prevê que fique por metade do inicialmente previsto. A separação foi uma tendência europeia nas últimas décadas, muito estimulada pelas políticas de liberalização do setor da Comissão Europeia. Mas países como a Alemanha, França ou Espanha já constataram que a gestão integrada das duas partes é mais eficiente, e voltaram a integrá-las tanto quanto possível, reduzindo a separação ao mínimo indispensável para não colidir com a UE.

Em relação a custos, Catarina Martins sublinhou que o objetivo é "repor o nível de investimento público que Portugal já teve no inicio do século, e que foi perdendo". Um investimento ambicioso, mas que custa a cada ano apenas "um terço do que só este ano já custou o Novo Banco. Não é assim tanto dinheiro. O buraco do Novo Banco em 2019 dá para 3 anos do nosso plano". Tem além disso um retorno indiscutível no desenvolvimento económico, social e ambiental do país, pelo que "é tudo uma questão de prioridades", concluiu.

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