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A reforma fiscal de Trump

A única conquista da reforma fiscal de Trump será dar mais dinheiro aos super ricos e às grandes empresas, que não o usarão para investimentos produtivos. Por Alejandro Nadal.
Senadores republicanos dos EUA na aprovação da reforma fiscal
Senadores republicanos dos EUA na aprovação da reforma fiscal

Os promotores da recém aprovada reforma fiscal nos Estados Unidos descrevem-na como o ato mais importante em matéria de política de cobrança de impostos desde Ronald Reagan. A equipa do atual inquilino da Casa Branca não deixa escapar a menor oportunidade para transmitir a sua convicção de que a redução de impostos às grandes empresas e aos estratos de altos rendimentos levará a um maior crescimento económico com todos os benefícios em matéria de emprego, que o crescimento implica. Tal como acontece há 30 anos, os mitos e dogmas dominam o desenho da política fiscal norte-americana.

A polémica que rodeia a reforma fiscal de Trump concentra-se no tema da desigualdade e dos exorbitantes benefícios aos ricos e às grandes empresas. Mas há outro importante ângulo neste debate que não teve a atenção que merece. O objetivo primordial da reforma aprovada pela maioria republicana no Congresso norte-americano é acelerar o crescimento económico e a criação de empregos através de um aumento no investimento.

Mas, qual é o fundamento racional que sustenta esta forma de ver as coisas? A justificação dos partidários desta reforma é um pensamento bem simples, porém enganoso: sustentam que a redução de impostos fará com que as empresas (e os ricos) invistam mais porque terão que pagar menos impostos sobre os seus lucros. O aumento no investimento não só criará um maior número de empregos, como também incorporará inovações tecnológicas em processos e produtos. E isso fará com que aumente a produtividade, o que também levaria a que aumentassem os salários. O crescimento económico provocado pela reforma fiscal traduzir-se-ia num avanço em matéria de bem-estar para toda a população. Adicionalmente, a aceleração económica traria uma maior cobrança de impostos, com a qual se fecharia o círculo virtuoso.

Mas, é correto pensar que o investimento e o crescimento aumentarão com esta reforma fiscal? Para começar, deveríamos supor que os impostos elevados são a causa de o investimento ser insuficiente ao longo dos anos recentes (para não dizer décadas). Mas este pressuposto tem um problema: o investimento produtivo tende a diminuir há mais de três décadas. É, portanto, difícil atribuir o comportamento dessa variável aos níveis de impostos. Só com operações de malabarismo em econometria se chega a esta conclusão.

Na verdade, são muitos os fatores que determinam os níveis de investimento, e em todo caso a carga tributária é apenas um desses fatores. Provavelmente não é o fator mais importante. Sem dúvida, o mais importante é o da rentabilidade esperada. Muitos economistas falam dos sentimentos do mercado, e Keynes referiu-se aos espíritos animais para referir-se à complexa matriz de fatores que determinam as decisões sobre os investimentos. Estas expressões estão ligadas ao tema da rentabilidade. Mas a análise dos economistas convencionais deixa muito a desejar.

Outros analistas trabalharam os dados sobre rentabilidade nas principais economias capitalistas ao longo de um período de cinco décadas. A sua principal conclusão é que a redução na taxa de investimento está diretamente relacionada com a diminuição da taxa de rentabilidade. Nenhuma reforma fiscal vai reverter essa tendência.

E se isso já não fosse o bastante, existem outros indicadores que também fazem duvidar da efetividade da reforma fiscal de Trump. Há um dado em particular que chama a atenção: os coeficientes de capacidade instalada ociosa. A informação da Reserva Federal mostra que, na atualidade, existem 24% de capacidade instalada ociosa para toda a economia norte-americana. Alguém poderia pensar que esse é um dado conjuntural e que com as reformas de Trump tudo será diferente. Todavia, o mais grave desse indicador é que o quadro vem piorando há quatro décadas. Os leitores podem comprovar. No gráfico abaixo, vê-se que em 1967 o coeficiente de capacidade ociosa era de 11%. A série de dados continua com os típicos altos e baixos dos ciclos de negócios de qualquer economia capitalista. Mas, não se pode ignorar a tendência para o aumento dos coeficientes de capacidade ociosa. Por isso, nas últimas três fases de expansão, o nível máximo é inferior ao da expansão anterior. É evidente que a tendência secular do indicador de capacidade ociosa é para a subida.

EUA: Capacidade instalada na indústria 1967-2017
EUA: Capacidade instalada utilizada na indústria 1967-2017

Dizendo de outra forma: os dados demonstram que existem níveis de capacidade excedente cada vez mais importantes. Porque haveria um investidor de se arriscar a construir uma fábrica quando sabe que já existe no setor um excesso de investimento? Se o aumento do investimento é o objetivo central da reforma fiscal de Trump, o mais provável é o fracasso. A única conquista será dar mais dinheiro aos super ricos e às grandes empresas, que não o usarão para investimentos produtivos.

Artigo de Alejandro Nadal, publicado em La Jornada a 27 de dezembro de 2017, traduzido para português por Carta Maior e publicado em 5 de janeiro de 2018.

Sobre o/a autor(a)

Economista, professor em El Colegio do México.
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