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Erdogan lança ataque militar contra os curdos

Começaram os bombardeamentos da aviação turca, com a cumplicidade de Moscovo e Washington, contra as forças curdas no nordeste da Síria. Conselho de Segurança da ONU vai reunir na quinta-feira.
Miliciano curdo na fronteira com a Turquia
Combatente das Forças de Auto-Defesa (SDF) curdas no posto de vigia junto à fronteira com a Turquia pouco antes dos primeiros bombardeamentos. Foto Stringer/EPA

Concretizaram-se esta quarta-feira as ameaças do presidente turco às forças das Unidades de Proteção do Povo (YPG), que têm protegido a população do território autónomo curdo no nordeste da Síria, ao mesmo tempo que foram decisivos na derrota do Estado Islâmico. Para o governo turco, as YPG são uma “organização terrorista” com laços ao ilegalizado Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK).

O plano anunciado por Recep Tayyip Erdogan passa por debilitar a resistência armada curda e a do Estado Islâmico e criar na região o que chama de “zona de segurança” para onde possa reenviar os milhares de refugiados sírios que se encontram na Turquia. Mas a operação encabeçada pelos militares turcos e pelas forças do Exército Nacional Sírio — armado e treinado pela Turquia — serve de instrumento político contra as aspirações da minoria curda em território turco, que são alvo de repressão por parte do regime.

Apesar das colunas de fumo que se erguiam em localidades junto à fronteira da Síria com a Turquia, os jornalistas no local dizem não ter constatado um grande movimento de tropas na região. Pelo menos dois civis morreram nos primeiros ataques, afirmam as Forças Democráticas Sírias — uma aliança de várias milícias liderada pelas YPG.

As reações de condenação do ataque não demoraram a surgir por parte das várias diplomacias, de Paris ao Cairo. Vários países europeus solicitaram a convocação de uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU, que deverá ter lugar na quinta-feira.

Horas antes do anúncio do ataque por parte de Erdogan no Twitter, Donald Trump usou o mesmo meio para criticar a despesa — com números bastante inflacionados, como notou a imprensa — e o custo em vidas de soldados norte-americanos em intervenções no Médio Oriente. “Nunca devíamos era ter ido para lá”, reforçou Trump a seguir ao tweet do presidente turco. Os Estados Unidos deram apoio logístico e militar às milícias curdas para combaterem o Estado Islâmico, mas ante a ameaça de Erdogan decidiram retirar as suas tropas do território, abandonando os até agora seus aliados na luta contra o terrorismo à mercê do poderio militar da Turquia.

Numa declaração lida aos jornalistas, o porta-voz do secretário-geral da ONU afirmou que António Guterres acompanha com “grande preocupação” o desenrolar dos acontecimentos e apela “à máxima contenção” dos militares. “A população e infraestruturas civis devem ser constantemente protegidas e o acesso humanitário sustentado, desimpedido e seguro a civis dede ser garantido para que as Nações Unidas e os seus parceiros humanitários possam executar o seu trabalho crucial”, prosseguiu Stephane Dujarric.

O porta-voz de Guterres lembrou que “não existe uma solução militar para o conflito sírio” e defendeu que “a única solução sustentável é um processo político mediado pela ONU, de acordo com a resolução 2250 do Conselho de Segurança”.

Ataque “é um crime contra a humanidade e viola todas as leis internacionais”, diz o HDP

A guerra de Erdogan tem adversários políticos na Turquia, como o Partido Democrático dos Povos (HDP), maioritário entre a população curda no leste do país. Numa declaração publicada na redes sociais, o HDP diz que a ação militar turca “é um crime contra a humanidade e viola todas as leis internacionais”, para além de fazer regressar em força o Estado Islâmico. “Este ataque dará ao Estado Islâmico a oportunidade para se reorganizar e arrastar a região de volta para as profundas trevas como em 2004”, avisam.

“Começou a tentativa de invasão de uma região onde mais de 5 milhões de pessoas — curdos, árabes, turcomenos, yazidis, muçulmanos, cristãos — vivem em harmonia. Apoiar esta guerra significa preferir como vizinhos os gangs do Estado Islâmico em vez destes povos. Como já dissemos vezes sem conta, Não à guerra!”, conclui a declaração do HDP, cujos líderes e muitos dos seus deputados e autarcas foram presos na sequência das vagas de repressão política do regime após o golpe militar falhado de 2016.

Mas as críticas também chegaram do principal partido da oposição, o Partido Republicano do Povo (CHP), que considera  o governo turco “um dos principais responsáveis pela guerra na Síria, através das políticas erradas levadas insistentemente a cabo desde 2011”, como a de armar os rebeldes do Exército Livre da Síria. Com este historial, o CHP — que defende o diálogo com o regime de Bashar al-Assad — diz que “o partido do poder destruiu a sua própria margem de manobra e ficou aprisionado a más decisões, erros de cálculo em cadeia e obsessões alimentadas pelas suas políticas sectárias e aventureiras”.

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