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“Em Portugal não temos mulheres a mais na política, temos mulheres a menos”
Na entrevista à CMTV, esta quinta-feira, Marisa Matias falou da forma como o seu percurso de vida marcou as suas posições políticas, do lugar das mulheres na política e das diferenças para com o atual presidente. Sem esquecer, claro, o atual contexto pandémico.
A conversa começou com a candidata a explicar a importância de reforçar o resultado relativamente às eleições passadas. Marisa Matias destacou que foi “o facto de ter tido uma votação expressiva” que lhe permitiu “dar seguimento a lutas que foram bandeiras da minha candidatura”, como o prova o caso dos cuidadores informais.
Em 2021 é ainda preciso lutar por muitas dessas medidas que “ainda estão por cumprir” e somar outras “no que diz respeito à saúde, à precariedade e à terceira idade”. Ao que acresce, obviamente, a pandemia que “permitiu pôr a descoberto muitos problemas de pobreza e desigualdade que já existiam mas que têm de ser corrigidos”. Assim, a eurodeputada espera ter uma expressão eleitoral que lhe permita “no dia a seguir continuar a poder trabalhar e dar seguimento a estas lutas”.
Se muitas das lutas são as mesmas e o empenho é o mesmo, a campanha será forçosamente diferente. A candidata assegura que vai fazer uma campanha em que todas as ações “foram pensadas para cumprir normas sanitárias”. Mas nela vai “continuar a ir ao encontro das pessoas” porque acredita que “as pessoas têm de ser ouvidas na mesma” e que “a campanha é um período por excelência para dar visibilidade a tantas pessoas que estão em dificuldades, a tantas lutas que são importantes reconhecer”. Vozes como as das cuidadoras informais com as quais já se encontrou, as trabalhadoras despedidas da fábrica da Triumph ou as moradoras dos Lagares em risco de despejo.
Os novos tempos exigem ainda “medidas e propostas que vão além das que já tínhamos antigamente”. Questionada sobre os apoios sociais do governo, Marisa Matias considera que estes “são ainda poucos, deveriam ser mais”, “chegaram com atraso”, mas “apesar de tudo há um reconhecimento de que afinal os apoios que dizíamos que seriam necessários não estavam garantidos”. Referia-se ao anúncio do governo de apoios para os trabalhadores independentes que “não estavam consagrados no Orçamento de Estado para 2021, apesar de terem dito que estavam”.
Para Marisa, “temos de olhar para os trabalhadores dos setores mais afetados” e “dar condições” para que as pessoas cumpram o confinamento “com um mínimo de dignidade”. O que passa por manter rendimentos e apoiar a economia mas também por outras questões. Temos “famílias muito grandes que vivem em casas muitos pequenas, pessoas que não têm capacidade para pagar a conta da eletricidade ou gás” num momento em que há muito frio.
Há ainda um “caminho a fazer” para aumentar a participação das mulheres na política
As mulheres e a política foi outro dos temas trazidos para a entrevista. Para a eurodeputada, “em Portugal não temos mulheres a mais na política, temos mulheres a menos” e “ainda temos muito caminho a fazer para a participação das mulheres”.
E quando o entrevistador trouxe à baila a lista que fez no passado só com mulheres a uma freguesia de Coimbra, Marisa Matias explicou: “Fizemos essa lista porque nessa altura 99,9% das listas eram só compostas por homens, ainda não tínhamos dado um passo no sentido de termos mais paridade nas listas eleitorais”.
Octávio Ribeiro queria também falar de uma sensibilidade feminina na política e como ela ligaria Marisa a mulheres com ideias muito diferentes dela como Angela Merkel e Ursula von der Leyen. A candidata explicou que “há sistemas de reprodução de desigualdades entre homens e mulheres”, que “há formas diferentes de tratar homens e mulheres” e “há discriminações” mas “é o programa político que nos distingue mais”.
“Senti as conquistas da democracia na minha pele”
O seu percurso de vida foi trazido igualmente à colação. Marisa Matias diz que a sua história de vida a marcou na sua “profunda defesa dos serviços públicas e da necessidade de termos respostas que cheguem a toda a gente”.
Crescer numa aldeia em que não havia água, eletricidade, televisão, onde se ia à escola a pé, permitiu-lhe sentir “evolução do que foi a democracia neste país e a conquista dos serviços públicos” na “minha própria pele”. Daí a sua “defesa aguerrida” do Estado Social.
O entrevistador da CMTV quis então saber se a Marisa eurodeputada era ainda a mesma pessoa. A resposta foi que os salários dos eurodeputados são “muito elevados”, que abdica “de parte muito significativa” do seu salário e que defende “que ninguém deve enriquecer à custa de cargos políticos”.
Dito isto, Marisa tratou de esclarecer que a sua luta “é para que as pessoas tenham salários mais altos, para combatermos os salários de miséria que ainda hoje temos em Portugal”. Lembrou as dificuldades das mulheres em risco de despejo que visitara antes, “que ganham todas o salário mínimo e pagam 300, 400 euros de renda” e recordou que sabe que “é muito difícil poder viver assim” porque já viveu com o salário mínimo e salários muito próximos deste.
O mesmo se deve dizer relativamente às baixas pensões: “muita gente chega ao fim da vida e em vez de ter o direito à dignidade que tem de ter, tem de escolher se compra medicamentos se come”.
“Tem de haver mão firme” quanto à banca
Houve também tempo para diferenciações políticas. Se sobre a esquerda pensa que não há “esquerda a mais nestas eleições” e que sugere “compromissos muito firmes em áreas em que neste momento temos bloqueios”, como a saúde, a precariedade e a banca, este último tema é precisamente um dos que elege para contrastar a sua candidatura com a do atual presidente.
Marisa e Marcelo estiveram em “campos opostos” nos casos do Banif, BES e Novo Banco. E a candidata de esquerda defende que “tem de haver mão firme de todos os órgãos de soberania, incluindo do chefe de Estado” nestes casos. Quer também trabalhar para “deixarmos de ter estes esquemas que protegem sempre a banca”, notando que “têm havido demasiadas portas giratórias, demasiado dinheiro a fugir para offshores e são as pessoas que trabalham que acabam por pagar isso tudo”.
Outra dos contrastes com Marcelo Rebelo de Sousa são as posições relativamente às leis de trabalho e proteção laboral. Marcelo “deu seguimento a uma lei que devia ter vetado: o alargamento do período experimental para o dobro”, o que fez com que, durante o último confinamento, essas pessoas fossem “as primeiras a ficar sem chão”.
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