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Educação inclusiva com que meios?

O novo diploma sobre educação inclusiva não pode transformar-se numa espécie de síndrome de “fundamentalismo da inclusão”. Artigo de José Lopes
O repetido “chavão” da aposta na “escola inclusiva”, não faz desaparecer a realidade dos alunos com NEE que têm vindo a aumentar na ausência até de medidas preventivas em idade precoce
O repetido “chavão” da aposta na “escola inclusiva”, não faz desaparecer a realidade dos alunos com NEE que têm vindo a aumentar na ausência até de medidas preventivas em idade precoce

Aprovado em Conselho de Ministros do atual Governo, o diploma da educação inclusiva entra em vigor já neste novo ano letivo (2018/19) no lugar da lei da educação especial. A revisão é justificada quando se está perante um quadro em que sobressaem as “baixas taxas de inclusão dos alunos no sistema educativo”, e em que subsistem nas escolas “um número significativo de jovens, com necessidades específicas, em espaços físicos ou curriculares segregados”, como afirma o Ministério da Educação em comunicado. Ainda que sem o ministro da educação Tiago Brandão Rodrigues ter dado sinais, em vésperas do arranque do ano letivo, para mobilizar e criar as necessárias sinergias nos vários profissionais da educação, no sentido de uma efetiva e consequente inclusão, que não se fique nas boas intenções da lei, uma vez que, é preciso também assumir, se até aqui a inclusão tem sido “faz-de-conta”. Reconhecendo-se aliás, que as escolas estão longe de terem meios e recursos a exemplo das equipas multidisciplinares, que, agora num modelo específico para esta renovada orientação de inclusão, voltam a ser prometidas quando têm sido negadas.

O ministério da Educação propõe-se assim com tal diploma, abranger todos os alunos e não apenas os que tenham algum tipo de deficiência ou dificuldade de aprendizagem, tendo como objetivo “maior integração de crianças e jovens com deficiência”, apontando como “eixo-central” da nova lei, a necessidade de cada escola “reconhecer a mais-valia da diversidade dos seus alunos, encontrando formas de lidar com essa diferença”, isto, quando ao mesmo tempo os alunos NEE (Necessidades Educativas Especiais) deixam de ter que passar por uma avaliação médica anual, para obterem a CIFIS (Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde), uma metodologia da Organização Mundial de Saúde que avalia o grau de incapacidade de uma pessoa e mede os seus progressos na escola. Novos critérios de referenciação que têm vindo a ser experimentados e que tantas vezes deixam alunos NEE sem adequadas respostas durante demasiado tempo, com resultados perturbadores aos vários níveis.

Nos últimos anos, foram experimentadas também nesta área da educação, medidas legislativas que objetivamente vinham desvalorizando e fragilizando a educação especial, sempre em nome de uma escola inclusiva, em que os alunos NEE passaram a estar integrados no ensino regular, com uma parte destes a beneficiarem de apoio especializado nas áreas da psicologia, terapia da fala, fisioterapia, entre outros, por técnicos (em grande numero precários) dos CRI (Centros de Recursos para a Inclusão) em alguns casos sem uma rigorosa e exigente articulação. Apoio especializado vindo em geral do exterior da escola e dependente de critérios de seleção das crianças em que a última palavra deixou de ser técnica, para ser administrativa e em função de redução de custos na Escola Pública, resultando na falta de recursos para NEE, incluindo recursos humanos.

Tais políticas meramente economicistas, que, ainda que não assumidas as suas consequências pelos sucessivos governantes, não deixarão de ser também causa das mesmas conclusões que agora a tutela justifica para a nova lei da educação inclusiva, ou seja, baixas taxas de inclusão e espaços físicos ou curriculares segregados. Constatação a que se propõe no novo diploma diferentes níveis de medidas educativas, como: as universais, destinadas a todos os alunos com o objetivo de promover a participação e o sucesso escolar; as seletivas, a ser aplicadas aos estudantes cujas necessidades de aprendizagens não foram suprimidas pelas medidas iniciais; e as adicionais, para quem apresentar dificuldades acentuadas e persistentes. Linhas orientadoras que de certa forma são resultado de trabalho de gabinete e não de sala de aula, da qual parece estar desfasada, como se tem estado até se chegar aqui com uma tímida redução de alunos por turma.

Mas educação inclusiva com que meios acrescidos nas escolas que permitam alterar as limitações com que se debatem, para a introdução da nova lei que propõe uma mudança de paradigma na abordagem às dificuldades de aprendizagem, a todas as crianças e jovens na escolaridade obrigatória. Alterações que, como é já habitual na educação, são impostas por decreto à revelia de um sério e indispensável envolvimento desde logo dos profissionais, dos professores aos assistentes operacionais, que mais uma vez são confrontados com uma lei, mas sem formação adequada e sem meios para agir, ainda que esta mudança inclua a criação de equipas multidisciplinares de apoio à educação inclusiva, compostas por cinco docentes e um técnico, por exemplo um psicólogo. Um tipo de equipas que agora têm 30 dias para serem formadas após aprovação do diploma, mas que curiosamente fazem lembrar as que nunca passaram da lei à prática, na generalidade dos agrupamentos de escolas que estão a manifestar dúvidas sobre a exequibilidade da introdução da nova lei neste próximo ano escolar, quando o próprio Conselho de Escolas reconhece não estar garantido um nível adequado de autonomia às escolas para o cumprimento desta missão.

Com tal cenário de dificuldades que não podem deixar de inquietar as comunidades escolares, quando estamos perante uma realidade como são os alunos com NEE que segundo a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência têm vindo a aumentar, fixando-se em mais de 87 mil, em 2017/18. O novo diploma sobre educação inclusiva não pode transformar-se numa espécie de síndrome de “fundamentalismo da inclusão”, não só para branquear a verdadeira dimensão de tal número de alunos com NEE, nem para mais uma vez não serem avaliadas as políticas inclusivas que foi suposto serem praticadas ao abrigo da legislação até aqui. Bem como não serem considerados todos os intervenientes diretos para que o verdadeiro sentir venha de dentro para fora e não de fora para dentro, como compreensivelmente poderão desabafar os docentes que vão iniciar um novo ano letivo, sem saber quais vão ser as suas funções como professores da "Inclusão", outrora de "Educação Especial".

Certamente que nenhum dos elementos das comunidades escolares e educativas podem ficar indiferentes, nem a espaços físicos segregados, nem currículos à parte, mas o repetido “chavão” da aposta na “escola inclusiva”, não faz desaparecer a realidade dos alunos com NEE que têm vindo a aumentar na ausência até de medidas preventivas em idade precoce, acabando por se agravar pela falta de estratégias articuladas, e pela falta de sensibilidade de governantes para com estes alunos e suas famílias, em que casos há, que diferentes tipos de sofrimento se arrastam ao longo de um penoso percurso escolar, que se deseja ser corrigido com a implementação da nova legislação, com empenho, profissionalismo, mas também envolvimento das comunidades escolares e educativas na exigência do cumprimento, do que, o governo elege ser “um dos seus objetivos principais na área da Educação, através da promoção de uma escola de qualidade para todos…”

Artigo de José Carlos Lopes (Ovar)

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