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Trumponomics: uma política de classe
Trump é o multi-milionário ao serviço dos multi-milionários que fala grosseiramente ao americano comum como se defendesse os seus interesses. A sua política económica é um cocktail de protecionismo e apoio descarado às grandes fortunas. Vão nesse sentido o corte de impostos, o desmantelamento das regulamentações bancárias que foram implementadas na sequência da crise financeira de 2008 e a tentativa de desmantelar o Obamacare em favor dos seguros de saúde.
Para compreender o que significa aquilo que foi chamado a “trumponomics”, a política económica do presidente norte-americano, é preciso começar por nos afastarmos dos seus habituais auto-elogios. A economia dos EUA continua em alta mas a maior parte dos indicadores positivos, desemprego em baixa, rendimento a subir e inflação baixa, já vinham trás. Apesar do momento económico não medir necessariamente o peso das políticas implementadas, Trump perde em toda a linha na comparação com Obama: o crescimento do PIB era 7,5% na legislatura anterior passou a ser 7.2%; a criação de emprego era de 5,3% desceu para 4,3%; a dívida era 10,5 passou a 15,1%.
O elemento central da sua política económica interna é a reforma fiscal de dezembro de 2017 com a qual baixou os impostos das empresas de 35% para 21% e beneficiou as grandes fortunas. Consequências destas medidas: a desigualdade aumentou com a diminuição do papel redistributivo dos impostos e o déficit e a dívida pública aumentaram. 84% dos benefícios do corte de impostos foram parar aos bolsos das empresas ou de indivíduos com um rendimento superior a 75 mil dólares. E, afinal, ao contrário do que sempre assegura a ortodoxia liberal, o aumento dos lucros das empresas não pingou para o resto da economia: foi em grande medida investido na recompra das ações das próprias empresas e no aumento de dividendos para os acionistas. Assim, a desigualdade nos Estados Unidos estava, em setembro do ano passado, no seu nível mais elevado em 50 anos. Em contraponto direto, as 500 maiores empresas do país estavam a pagar a taxa mais baixa de impostos em 40 anos, de acordo com a CBS News. Se, em média, no período entre 2008 e 2015 tinham pago 21,2%, em 2018 pagaram apenas 11,3%. E os seis maiores bancos pouparam mais de 32 mil milhões de dólares apenas em dois anos.
Por outro lado, o défice e a dívida pública aumentam, colocando em causa os investimentos em serviços públicos. O défice foi de 799 mil milhões de dólares em 2018 e de 984 mil milhões em 2019. Se a média deste nos 50 anos anteriores era 1,5% do PIB, em 2019 foi de 4,6%, com previsões de aumento. A dívida pública também aumenta. Segundo os número do Departamento Orçamental do Congresso passará de 10,1 triliões em 2018 para 11,7 triliões em 2027.
Num país sem serviço nacional de saúde, a desproteção social é outra das consequências da política de Trump em benefício das seguradoras. O objetivo de Trump era acabar com o Obamacare, o limitado plano de saúde pública do anterior presidente, aumentando imediatamente em 20 milhões o número de norte-americanos sem cobertura. Só que nunca conseguiu uma maioria para o fazer. Tratou então de torpedear o programa, por exemplo, cortando 90% dos fundos para a publicitação dos períodos de inscrição e limitando-o a metade do tempo. E foi eficaz na diminuição de cobertura pública de saúde que empurra pessoas para os seguros de saúde privados.
Segundo as projeções do Departamento de Orçamento do Congresso dos EUA de maio de 2019, a política de Trump aumentou em 2,5 milhões o número da norte-americanos não idosos que não estavam cobertos por seguros de saúde. Cortaram-se dois triliões de dólares em cuidados de saúde, sobretudo no Medicaid, destinado aos mais pobres. Entre 2016 e 2018, o número de pessoas sem cobertura de seguro de saúde aumentou 1,9 milhões. E se nada mudar na política de saúde até 2029 adicionar-se-ão mais cinco milhões de pessoas a este número cruel.
Por sua vez, a política externa de Trump assenta nas supostas virtudes do protecionismo contra a globalização. Este deveria colocar a “América Primeiro”, seduzindo assim alguma fatia da classe trabalhadora que sonhava com uma nova idade de ouro das fábricas nos setores empobrecidos. O que não aconteceu.
A lógica da substituição de tratados já estabelecidos pela negociação caso a caso com base em chantagens localizadas e guerras tarifárias acabou por aumentar o custos dos bens intermediários, utilizados para produzir outros e que têm de ser importados, e aumentar o preço em vários tipos de importações e exportações. O imperialismo económico casuístico fez com que, no interior dos EUA, houvesse quem ganhasse e quem perdesse. Um jogo em que a burguesia nacional se dividiu. A produção agrícola, nomeadamente a soja e o milho, viram-se afetadas tendo necessitado de 12 mil milhões de ajudas em 2018 e 14,5 mil milhões a partir de maio de 2019 e mais 16 mil milhões em julho.
No computo geral, o objetivo de reduzir o deficit comercial teve resultados inversos. Este era de 552 mil milhões em 2017, representando um aumento de 10%, passou a 622 em 2018, representando um aumento de 13%. O peso das guerras tarifárias, ainda segundo o Departamento Orçamental do Congresso, estimado em agosto de 2019, vai reduzir o PIB em 0,3%, o rendimento real das famílias em cerca de 1%, encarecendo os bens de consumo, aumentando a incerteza económica.
Do lado dos vencedores promovidos por Trump estão também as indústrias ligadas aos combustíveis fósseis. Negacionista das alterações climáticas, o presidente norte-americano saiu do Acordo de Paris que implicava compromissos com a redução de emissões com gazes de estufa com a desculpa que era mau para os negócios nacionais. Está empenhado na promoção das indústrias ligadas aos combustíveis verdes em detrimento do capitalismo verde.
Outra das suas políticas económicas é a desregulação dos mercados financeiros. As regras aplicadas depois da última crise financeira eram consideradas “uma força muito negativa” que Trump se empenhou em eliminar, beneficiando a especulação.
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