Quando assumimos funções em Lisboa fizemos o exercício pertinente de abrir o espaço à discussão e avaliação do trabalho que tinha vindo a ser desenvolvido no passado. Fizemo-lo através de sessões participadas pelas associações de e para migrantes e refugiados para perceber o rumo que tínhamos de seguir na elaboração das políticas de integração de migrantes.
Verificámos a necessidade de alargar a nossa intervenção a áreas que não estavam antes contempladas ou implementadas. Fizemo-lo ao integrar pela primeira vez a igualdade de género como área temática do Plano Municipal para a Integração de Migrantes. Estamos a fazê-lo em parceria com o movimento associativo com a criação do portal Lisboa Acolhe que permitirá reunir a informação identificada pelas pessoas migrantes como essencial no momento de chegada, no acesso aos serviços públicos e na criação de laços de pertença.
A integração é um processo feito por duas vias paralelas que contra intuitivamente se tocam em muitos momentos.
Temos, por um lado, a via individual que diz respeito à experiência migratória particular – com as suas razões próprias, interpretações subjetivas da vivência e expectativas de futuro singulares. Do outro lado temos a via coletiva, que diz respeito ao nível de preparação da sociedade que se quer de acolhimento. É nesta segunda que a defesa de serviços públicos de qualidade, gratuitos e universais, assume uma especial importância – uma reivindicação que, cumprida, daria resposta a grande parte das necessidades das pessoas migrantes e refugiadas, assim como às diversas áreas de intervenção do Pelouro dos Direitos Sociais.
Muitas vezes a identificação dos obstáculos que os migrantes enfrentam, levam-nos a autênticos becos institucionais. Para que possamos avançar na garantia dos direitos das pessoas migrantes e refugiadas, é fundamental uma resposta mais robusta do Estado Central.
A aprendizagem da língua portuguesa, identificada como uma ferramenta primordial para o entendimento e garantia dos demais direitos, e para a qual foi criado um programa oficial do governo - Português para Todos – que está sob alçada do Instituto para o Emprego e Formação Profissional (IEFP), é ainda muito insuficiente. No ano de 2018, abriu um único curso em Lisboa e não temos previsão de abertura de novos cursos.
Decidimos por isso avançar com um primeiro curso de português promovido pela CML, a par do financiamento a cursos promovidos por associações de migrantes. O que foi um projeto-piloto da autarquia, será agora uma oferta constante na cidade.
O acesso à saúde é outra das problemáticas com a qual nos confrontamos em todos os espaços de discussão. Começámos então o percurso necessário em duas vertentes em simultâneo – o de diagnóstico e o de intervenção.
A primeira permitirá conhecer os vários obstáculos que se impõem aos migrantes ao aceder ao SNS, as dificuldades sentidas pelos próprios profissionais de saúde, assim como recolher dados sobre a saúde da população migrante.
A segunda vertente começou já através de consórcios com associações da cidade que têm vindo a desenvolver folhetos em várias línguas com informação sobre saúde. Já no primeiro semestre de 2020 continuaremos este rumo com a tradução dos conteúdos que o SNS produz para explicar a estrutura e funcionamento da saúde em Portugal, para as línguas mais faladas em Lisboa. Este passo será acompanhado de formações para os profissionais de saúde, assim como de sessões de literacia sobre SNS para migrantes e respetivas associações.
Existem, contudo, áreas nas quais não conseguimos minorar os efeitos das lacunas dos serviços públicos centrais. Isto é especialmente verdade para o funcionamento do SEF, que leva as pessoas a limbos administrativos com os atrasos na avaliação, atribuição e renovação de autorizações de residência ou de pedidos de proteção internacional. Estivemos e continuaremos a estar sempre ao lado das associações de migrantes e refugiados nesta reivindicação.
No caso da população requerente de asilo ou com estatuto de refugiada, temos levado insistentemente à atenção da CML e do governo a necessidade de, além de manter o discurso de abertura, olharmos criticamente para a coordenação das políticas e acompanhamento das pessoas que aqui pedem asilo. Em Lisboa, desde que assumimos esta pasta, já foram acompanhadas mais de 160 pessoas nesta condição. Acolhemos, e continuaremos a acolher, as pessoas que arriscam as suas vidas na travessia do Mediterrâneo, as que se encontram em campos na Grécia e na Itália, e aquelas que no Egito e na Turquia não vêem a sua segurança garantida.
Fazemo-lo sabendo que um ano e meio de programa de acolhimento muitas vezes não é bastante para a total autonomização, e por isso não cessamos de apoiar com base no calendário mas sim na especificidade de cada caso.
Fomos alterando procedimentos, como disso é exemplo a garantia de 25 casas municipais para garantir que o processo de integração é feito num ambiente mais digno, mas faltam muitos mais alterar. Por essa razão, este ano será construído um novo Programa Municipal de Acolhimento de Refugiados, com a participação das pessoas que já acolhemos e das associações que connosco trabalham, que nos permita dizer com franqueza que a integração é real.
Continuaremos o caminho que temos feito estes dois anos – ouvindo as pessoas, garantindo os seus direitos, financiando o trabalho das associações e apoiando os eventos culturais das comunidades migrantes. Queremos uma cidade na qual a diversidade esteja enraizada no seu solo e materializada nos direitos das pessoas que aqui vivem e aqui querem viver.