'Vistos gold': Comissão Europeia alerta para riscos de corrupção e evasão fiscal

23 de janeiro 2019 - 17:39

Branqueamento de capitais, evasão fiscal e corrupção estão entre os riscos enumerados no relatório da Comissão Europeia, que são agravados pela falta de transparência destes regimes e pela ausência de qualquer cooperação entre os Estados-Membros a este respeito.

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No seu primeiro relatório exaustivo sobre os regimes de cidadania (aplicados na Bulgária, Chipre e Malta) e de residência (existentes em 20 países membros, entre os quais Portugal) a favor dos investidores, a Comissão assinala que os mesmos comportam sérios riscos de segurança para a União Europeia (UE), entre os quais branqueamento de capitais, evasão fiscal e corrupção.

De acordo com a Comissão Europeia (CE), a ausência de transparência no que concerne às modalidades de funcionamento desses regimes, bem como a inexistência de qualquer cooperação entre os Estados-Membros nesta matéria, acentuam estes riscos.

Referindo-se aos regimes de residência, os chamados vistos gold, a CE refere que, não obstante a legislação da UE prever “determinadas obrigações a cumprir em matéria de segurança antes da emissão de um visto ou de uma autorização de residência a favor dos investidores estrangeiros, a sua aplicação prática pauta-se pela falta de informações a este respeito e os Estados-Membros dispõem de poderes discricionários quanto à abordagem por eles adotada em matéria de segurança”.

Acresce que “as autorizações de residência obtidas em virtude de um investimento, que exijam apenas uma presença física limitada ou mesmo nula do investidor no Estado-Membro em causa, são suscetíveis de ter um impacto na aplicação do estatuto de residente de longa duração na UE e dos direitos a ele associados, podendo mesmo assegurar um procedimento acelerado para a obtenção da cidadania nacional e, por conseguinte, da cidadania da UE”.

Em causa está também a falta de transparência e supervisão destes regimes, nomeadamente em termos de monitorização.

O relatório, divulgado esta quarta-feira, aponta para a necessidade de “controlos reforçados para assegurar que as regras anti-branqueamento de capitais não são subvertidas, e de monitorização dos candidatos para que não recorram a estes sistemas para beneficiar de privilégios fiscais”.

No que respeita concretamente ao caso português, que obriga aos estrangeiros que dele beneficiam a um mínimo de sete dias por ano no país, a CE afirma que o regime aplicado em Portugal viola a regra de “presença continuada” europeia. Por outro lado, Portugal não controla a origem dos fundos transferidos para bancos portugueses para acesso aos vistos gold, o que implica riscos de branqueamento de capitais.

“Estes fundos devem ser transferidos para uma conta bancária numa instituição bancária registada ou autorizada pelo Banco de Portugal. A transferência deve ser comprovada por uma declaração emitida pela instituição bancária. Nenhum controlo adicional é feito exceto aquando da renovação da autorização [de residência], altura em que a declaração bancária deve ser emitida de novo”, descreve o relatório.

Quanto aos procedimentos de verificação de idoneidade existentes, que prevêem a entrega de certificado de registo criminal e de declaração de ausência de dívidas junto do fisco, a CE avança que não existem “quaisquer verificações posteriores para monitorizar abusos”, sendo que “as verificações só acontecem na sequência de suspeita de atividades ilícitas”.

A Comissão faz referência a processos judiciais movidos em Portugal no âmbito da atribuição de vistos gold e ao seu efeito no aumento do preço da habitação nas zonas de Lisboa e Porto.

Na sua conta de Twitter, Marisa Matias escreve que o relatório da Comissão Europeia, elaborado na sequência da Resolução do Parlamento Europeu, de 16 de janeiro de 2014, “é um bom primeiro passo”. Contudo, “faltam as medidas concretas que ponham fim a estes esquemas”, alerta a eurodeputada bloquista, defendendo que “é preciso que os governos levem a sério o relatório”.