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Vigilância: empresas contratadas pelo Governo “agem como se Portugal fosse o faroeste”

Comansegur reassume serviços de segurança em organismos afetos ao Ministério do Trabalho e recusa cumprir a lei, ameaçando com despedimentos. José Soeiro defende que estas empresas “têm de ser postas na linha”. Trabalhadores querem saber se ministra vai cumprir compromisso de rasgar contratos com empresas incumpridoras.
Foto de MANUEL FERNANDO ARAÚJO/LUSA.

No setor público, com a exceção das escolas, a esmagadora maioria dos serviços de segurança foi externalizada para empresas privadas. Desde novembro do ano passado, tem-se registado um número elevado de transmissões de estabelecimento. Ou seja, mediante a existência de um novo concurso ou ajuste direto, várias empresas têm sido substituídas pelas suas concorrentes.

Acresce que os concursos têm sido ganhos por empresas que praticam os preços mais baixos e que, muitas vezes, não se coíbem de atropelar os direitos dos trabalhadores. Temos, portanto, empresas a serem contratadas pelo Estado que não cumprem a lei e não têm qualquer pudor em desautorizar o Governo.

A 1 de dezembro de 2020, no Ministério do Trabalho (seja no Instituto do Emprego e Formação Profissional, Centros de Emprego, Segurança Social ou Autoridade para as Condições do Trabalho) a 2045 foi substituída pela PSG, Ronsegur e Comensegur, que pertencem à associação patronal AESIRF (Associação Nacional das Empresas de Segurança). A Comansegur assumiu vários serviços no Norte do país. No entanto, a mesma foi substituída, a 1 de junho, e por ajuste direto, pela PSG.

Comansegur já demonstrou que, mais uma vez, não está disposta a cumprir a lei

Conforme explicou Sofia Figueiredo, trabalhadora da PSG, em declarações ao Esquerda.net, a Comansegur irá reassumir a prestação de serviços nos organismos do Ministério do Trabalho já no próximo mês. E esta empresa já demonstrou que, mais uma vez, não está disposta a cumprir a lei.

O Código do Trabalho (art.º 285, sobre transmissão de estabelecimento) prevê que o trabalhador transita para a nova empresa com a garantia dos seus “direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos”. A jurisprudência europeia vai no mesmo sentido.

Ignorando as disposições legais e as várias advertências do Governo, a Comansegur “já explicou aos vigilantes ao que vem”.

Em carta aberta dirigida à Ministra do Trabalho, os trabalhadores explicam que a empresa “afirma que não respeitará o artigo 285º do Código de Trabalho, que não vai manter os trabalhadores nos postos, já colocou anúncios de emprego para recrutar outros vigilantes [ver um dos anúncios no portal Net Emprego], fez saber que os vigilantes que ficarem no seu posto de trabalho terão contratos de três meses, com período experimental e que aqueles que protestaram no passado contra a falta de pagamento de salários e as trabalhadoras que se dizem vítimas de assédio sexual não terão lugar na empresa”.

Carta aberta à Senhora Ministra do Trabalho e Segurança Social Cara Senhora Ministra : É tempo de acabar com os abusos...

Publicado por Vigilantes Segurança Privada em Terça-feira, 10 de novembro de 2020

“Os trabalhadores não têm oportunidade de ler o seu próprio contrato, nem direito à cópia do mesmo. Assinam às cegas senão perdem o seu emprego”, lê-se ainda na missiva.

Há pouco menos de um ano, a Ministra do Trabalho foi perentória ao afirmar que as empresas que ganham os concursos têm de ficar com os trabalhadores e garantir os seus direitos. O Ministério emitiu, inclusive, uma comunicação para os órgãos de comunicação social com essa informação. Entretanto, quer a ministra do Trabalho, quer o ministro das Infraestruturas, vieram dizer que se as empresas não cumprissem a lei, existiriam condições para a resolução do contrato.

Neste contexto, os trabalhadores da vigilância privada questionam se Ana Mendes Godinho “vai ou não vai rasgar os contratos”, conforme se comprometeu.

“Para os vigilantes é necessário que o Governo aja mais. Que tomem medidas urgentes, que sejam efetivas e eficazes e que assegurem, de uma vez por todas, o cumprimento do artigo 285º do Código do Trabalho. Cumprimos com os nossos deveres, pelo pelo consideramos que temos razões acrescidas para exigir que respeitem os nossos direitos”, escrevem.

"O Faroeste Laboral"

O FAROESTE LABORAL As pessoas com quem estou nesta foto, tirada há pouco, são trabalhadores da vigilância. Todos eles...

Publicado por José Soeiro em Segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Após uma reunião com os trabalhadores da vigilância privada, que decorreu esta segunda-feira, José Soeiro escreveu na sua página de Facebook que “tudo isto é gravíssimo”, “mais ainda considerando que a entidade que contrata estas empresas é o Ministério do Trabalho e da Segurança Social”.

“Estas empresas de vigilância e segurança privada, que agem como se Portugal fosse o faroeste, têm de ser postas na linha”, escreve, lembrando que “estão em causa, neste caso, 162 trabalhadores do norte do país”.

“Mas está em causa muito mais: o respeito por direitos laborais básicos. Agir sobre isto é uma urgência”, remata.

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