O banco de horas, ou seja a possibilidade de aumentar o período de trabalho sem o trabalhador ter direito a receber horas extraordinárias, volta à agenda do governo no pacote laboral. Desta feita, a proposta é que seja considerado que há uma “adesão tácita” do trabalhador a este sistema se não se opuser ao regulamento interno da empresa em que ele conste. O assunto é destacado esta sexta-feira no Jornal de Negócios.
A ideia de um “banco de horas” prevê que seja atribuída uma compensação pelo trabalho suplementar feito ao abrigo deste regime. Esta pode ser feita através de uma redução de horas a trabalhar noutra altura, de acrescento de dias de férias ou de pagamento, apesar deste ser feito não no valor das horas extraordinárias mas no valor habitual da hora trabalhada.
Em Portugal, foi Vieira da Silva que a introduziu em 2009 nas suas alterações ao Código do Trabalho. Nesta versão, o banco de horas apenas podia ser adotado com acordo dos sindicatos. Quando o governo Passos Coelho/Paulo Portas chegou ao poder, acabou por fazer valer o princípio da negociação individual com o trabalhador, passando a ser possível o aumento do período normal de trabalho em duas horas por dia até 50 por semana. A ideia do acordo tácito já estava incluída nesta versão mas de outra forma: era considerado que o trabalhador concordaria com a implementação do banco de horas se não respondesse à proposta feita em 14 dias.
O governo seguinte, que contava com o apoio parlamentar conhecido como a geringonça, acabou com esta possibilidade de negociação individual. Assim, atualmente, o banco de horas só pode ser aplicado com uma convenção coletiva ou se houver um referendo entre os trabalhadores.
Os sindicatos sempre criticaram que, sem negociação coletiva e abandonados a “acordos individuais”, os trabalhadores ficam pressionados para aceitar as exigências dos patrões, o que resulta em comprometer o seu direito ao descanso.
O que mais consta da proposta do governo
O banco de horas que a ministra Rosário Palma Ramalho agora propõe volta ao aumento do período normal de trabalho até duas horas por dia e 50 horas por semana, com o limite de 150 horas por ano.
Desta feita, é considerado que o trabalhador consentiu tacitamente com a proposta patronal se não se opuser por escrito passados 21 dias da divulgação do regulamento. Este deve prever desde logo a forma como o trabalho adicional será “compensado”. Mas caso acabe por existir um saldo a favor do trabalhador será pago em dinheiro ao valor “normal” da hora de trabalho e não ao das horas extraordinárias. O regulamento também deve prever a antecedência com que o trabalhador deve ter conhecimento das mudanças de horário. Sendo que há uma antecedência mínima de três dias mas a exceção de casos de força maior ou prejuízos graves.
Há ainda o chamado “banco de horas grupal” que serve para aplicar o sistema a uma equipa onde todos não concordem. Esta aceitação tem de ser na ordem dos 75% mas para ser considerada não há exigência de voto secreto.
A balança desequilibra a favor do empregador
António Monteiro Fernandes, professor convidado da faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa e presidente da comissão que fez o estudo prévio à revisão do Código do Trabalho de 2009, avisa que “o acordo individual, inclusivamente tácito, que agora se pretende recuperar, e o banco de horas grupal baseado em acordos individuais, envolve a opção pelo risco de colocar a matéria sobre o domínio absoluto da vontade unilateral do empregador”, agravando esse “desequilíbrio”.
Àquele órgão de comunicação social sublinha que se há “grandes vantagens para o empregador” que “pode dispor de horas a mais à medida que delas necessite por um custo igual ao das horas normais” as desvantagens ficam todas do lado do trabalhador que perde não só capacidade de organizar a sua vida pessoal como monetariamente por via de não lhe serem pagas as horas extraordinárias.