Palavras de Marcelo são "insulto às mais de 400 vítimas" de abusos sexuais do clero

11 de outubro 2022 - 19:20

Presidente da República afirmou que o número não é "particularmente elevado" e não o surpreende. Uma reação "lamentável", afirma Pedro Filipe Soares, pois "fosse um caso apenas e já era preocupante", acrescenta o líder parlamentar do Bloco.

PARTILHAR
MArcelo Rebelo de Sousa. Foto Piaras Ó Mídheach/Web Summit via Sportsfile

A inusitada reação do Presidente da República à divulgação da existência de mais de quatro centenas de denúncias de abuso sexual por parte do clero católico está a provocar indignação, com Marcelo Rebelo de Sousa a ser acusado de desvalorizar os casos e a dor das vítimas, protegendo assim a instituição religiosa que professa.

“Não me surpreende. Não há limite de tempo para estas queixas, há queixas que vêm de pessoas de 90 ou 80 anos e que fazem denúncias relativamente ao que sofreram há 60 ou 70 anos. Portanto, significa que estamos perante um universo de pessoas que se relacionam com a igreja católica [na ordem] de milhões de jovens ou muitas centenas de milhares de jovens. Haver 400 casos não me parece que seja particularmente elevado porque noutros países com horizontes mais pequenos houve milhares de casos”, afirmou esta terça-feira o Presidente da República, citado pelo Público.

Miguel Guedes
Miguel Guedes

Entre o perdão e o encobrimento

11 de outubro 2022

"É este o Presidente de uma República laica e de um Estado de Direito? Lamentável", afirmou o líder parlamentar do Bloco nas redes sociais ao ouvir as palavras de Marcelo, que considera "um insulto às mais de 400 vítimas".

"Fosse um caso apenas e já era preocupante", prosseguiu Pedro Filipe Soares, desafiando o Presidente a pedir "desculpa às vítimas de abusos sexuais na Igreja e às suas famílias pelas miseráveis declarações de hoje e por não ter estado à altura do cargo que ocupa".

A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa revelou esta terça-feira que já recebeu 424 testemunhos de casos de abuso sexual por parte de membros do clero, acrescentando que a maior parte dos casos estão prescritos face à lei penal portuguesa.

Atualmente, a prescrição ocorre cinco anos após a vítima completar 18 anos e o coordenador da Comissão Independente, o pedopsiquiatra Pedro Strecht, declarou ser “mais do que a favor” do alargamento do prazo, que em Espanha está nos 33 anos.

“Tendo a noção que dentro deste prazo de 23 anos são relativamente poucos os que ainda vêm a caber, isso pode ser um motivo para nós sugerirmos ao legislador que faça também uma revisão nesse domínio e que aumente nesta perspetiva. Não é aumentar para os crimes sexuais em geral, mas para estas circunstâncias em especial. É uma questão a ponderar”, disse Pedro Strecht, citado pela agência Lusa.