Guatemala: candidato de centro-esquerda vence as eleições

21 de agosto 2023 - 13:35

Contra todas as previsões, Bernardo Arévalo tornou-se este domingo presidente, acabando com 12 anos de domínio da direita. A campanha ficou marcada pelo seu discurso anti-corrupção e pela perseguição do Ministério Público que tentou inviabilizar a candidatura.

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Bernardo Arévalo com a sua vice-presidente Karin Herrera. Foto de Esteban Biba/EPA/Lusa.
Bernardo Arévalo com a sua vice-presidente Karin Herrera. Foto de Esteban Biba/EPA/Lusa.

Bernardo Arévalo de León tornou-se este domingo presidente da Guatemala ao vencer as eleições com 58,9%. A sua adversária, Sandra Torres Casanova, ex-mulher do ex-presidente Álvaro Colom Caballeros, ficou-se pelos 36,2% na sua terceira tentativa sucessiva de chegar ao cargo.

A vitória do candidato do Movimiento Semilla é considerada surpreendente. Estava longe de ser um dos favoritos ao início e algumas das sondagens antes da primeira volta colocavam-no em oitavo lugar. A sua passagem à segunda volta, vista como ameaça ao sistema, foi contestada judicialmente por oito partidos de direita e o Tribunal Constitucional chegou até a suspender o resultado eleitoral. Quatro dias depois, voltou atrás.

Teve imediatamente a seguir de enfrentar outras tentativas do Ministério Público de invalidar a candidatura. O Semilla foi acusado de apresentar assinaturas falsas. Os seus advogados contestaram a acusação e nunca puderam aceder às alegadas provas que também nunca foram expostas publicamente. O secretário-geral da Organização de Estados Americanos, Luis Almagro, considerou esta acusação uma “perseguição política”. O Tribunal Constitucional acabou por decidir a favor do Semente mas o procurador, Rafael Curruchiche, que é alvo de sanções dos EUA por suspeitas de abafar casos de corrupção, declarou que não descartava avançar com mais ações judiciais contra o Semilla depois das eleições.

Só que a “deriva autoritária” do regime, de que têm falado vários analistas políticos, também acabou por funcionar, de certa forma, a favor do agora presidente. Três candidatos anti-sistema foram impedidos de concorrer o que deixou espaço aberto ao Movimiento Semilla. E as perseguições judiciais foram-lhe valendo simpatias das camadas mais descontentes da população. O país vive uma situação de crise, com o aumento da violência e da insegurança alimentar que têm causado uma emigração ruma aos EUA.

Situando-se ao centro-esquerda e afirmando-se social-democrata, a sua eleição marca o fim de 12 anos de governos à direita. Arévalo juntou simpatias com o seu discurso anti-corrupção mas das suas propostas fazia também parte o combate às alterações climáticas, a criação de um novo “pacto fiscal”, o reforço da Segurança Social, mais investimentos na educação e universalização do sistema de saúde. Terá beneficiado ainda de ser filho de Juan José Arévalo Bermejo, ex-presidente do país, entre 1945 e 1951, auto de profundas reformas no setor da educação e da saúde, defensor de um “socialismo espiritual” que pretendia “libertar o indivíduo psicologicamente”.

Nascido durante a estadia do seu pai no exílio político, Bernardo Arévalo fez carreira como diplomata, tendo nessa condição assumido vários cargos como embaixador em Espanha de 1995 a 1996, e foi brevemente vice-ministro das Relações externas entre 1994 e 1995. Para além disso, foi dirigente do Centro de Investigaciones Regionales de Mesoamérica, é sociólogo e doutorado em Filosofia e Antropologia Social, sendo autor de vários livros.

A sua intervenção política ganhou outra dimensão com a criação do Movimento Semente, criado por um conjunto de intelectuais depois do movimento de manifestações contra a corrupção do governo de Otto Pérez e Roxana Baldetti e que ficou conhecido como primavera de 2015. Nas primeiras eleições em que o partido concorreu ao parlamento, em 2019, foi eleito um dos seus sete deputados (em 160, 5,24%). Assumiu a liderança deste e foi escolhido depois como candidato presidencial.