Esta terça, dia 20 de outubro, foi publicado no Diário da República um decreto-lei do governo que vem alterar drasticamente o futuro dos pacientes de doenças crónicas incuráveis que tinham, até agora, direito a um regime especial de pensão por invalidez.
Trata-se dos pacientes de paramiloidose familiar, doença de Machado-Joseph (DMJ), sida (vírus da imunodeficiência humana, HIV), esclerose múltipla, doença de foro oncológico, esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença de Parkinson (DP) ou doença de Alzheimer (DA). Como se sabe, são doenças incuráveis e extremamente incapacitantes e que, em muitas casos, lançam na invalidez pessoas que estariam, sem a doença, no apogeu das suas capacidades.
É esse caráter especial da Lei n.º 90/2009, de 31 de Agosto que justificava, até agora, as pensões especiais atribuídas a estes pacientes, caso assim o decidisse a Junta Médica do Sistema de Verificação de Incapacidades a que têm de comparecer. Vale a pena lembrar que este regime especial não esgota as pensões por invalidez que, no caso de outras enfermidades ou causas, são regulamentadas pelo decreto-lei nº 187/2007 de 10 de maio.
Ora o decreto-lei publicado agora (nº 246/2015, de 20 de outubro), acaba com esta lista e substitui-a por um critério que não leva em conta a doença, mas o estado do paciente, passando a pensão especial a ser atribuída pela “verificação de condições objetivas especiais de incapacidade permanente para o trabalho, independentemente da doença causadora da situação de incapacidade”, explica-se na exposição de motivos.
“Situação de dependência ou morte num período de três anos”
Esta verificação de “condições objetivas” está no artigo 2º que determina que são abrangidos pela invalidez especial os pacientes “que se encontrem em situação de incapacidade permanente para o trabalho não suprível através de produtos de apoio ou de adaptação ao, ou do posto de trabalho, decorrente de doença de causa não profissional ou de responsabilidade de terceiros, que clinicamente se preveja evoluir para uma situação de dependência ou morte num período de três anos”.
Traduzindo: os pacientes têm de estar incapacitados permanentemente para o trabalho, e com previsão clínica de ficarem em situação de dependência, ou de morrerem (!), em três anos.
Não se vê como isto será possível em doenças que têm evoluções imprevisíveis: o cancro pode parecer curado e uma metástase fulminante matar o paciente em menos de um ano; a Doença de Parkinson em geral não é causa de óbito, mas a sua evolução é imprevisível e o paciente pode ficar em situação de dependência em menos ou mais de três anos, sem que qualquer clínico se arrisque a prever.
Contradição
A obrigatoriedade de que se verifique incapacidade permanente para o trabalho, por sua vez, entra em contradição com o disposto no regime geral de invalidez que, além da invalidez absoluta (total incapacidade para trabalhar) prevê também a relativa (a incapacidade impede-o de obter na sua profissão mais de um terço da remuneração correspondente ao seu exercício normal). Neste segundo caso, é permitido ao pensionista continuar a trabalhar, dentro de certos limites de remuneração.
Assim, em vez do alargamento do acesso ao regime especial, como argumenta a exposição de motivos do decreto-lei, o que é previsível é que se reduza drasticamente a atribuição destas pensões. Outra coisa não seria de esperar do Ministério de Pedro Mota Soares que, mesmo no apagar das luzes, não tem descanso.