A operadora da central nuclear de Fukushima, a Tokyo Electric Power (TEPCO), anunciou no último dia 15 que, nesta semana, dará início ao longo e arriscado processo de desligamento da central nuclear. Se tudo correr bem, dentro do cronograma da empresa, em 40 anos esse processo será finalizado.
Desde o desastre nuclear iniciado com o tsunami de março de 2011, é a primeira vez que a TEPCO vai efetuar esse trabalho. A operação será iniciada pelo reator número 4. Nesse reator existem nada menos que 1533 hastes de combustível, medindo aproximadamente 4 metros cada, que deverão ser retiradas num período de um ano, de acordo com o cronograma divulgado.
Na segunda-feira, 18, será introduzido no tanque que contém as hastes de combustível um contentor cuja medida é de aproximadamente 5X2 metros. Uma vez mergulhado o contentor no tanque, 22 hastes de combustível serão colocadas, uma por uma, no seu interior. Em seguida, o contentor será retirado do tanque e carregado por um guindaste para outro tanque a cerca de 100 metros do primeiro. Segundo a TEPCO, o ciclo dessa operação será de uma semana. O motivo de se começar pelo reator 4, que sofreu menos danos que outros, é a situação crítica em que se encontra a construção onde está localizado. O prédio está em frangalhos e teme-se que sucumba com os frequentes terramotos que continuam a assolar a região.
O guião apresentado pela TEPCO parece o de um filme de ficção científica, principalmente pelo facto de todo esse trabalho, devido à radioatividade, ser feito por máquinas. O guindaste, por exemplo, será operado por controlo remoto e não por um trabalhador da construção civil, como seria normal. Mas que ninguém se iluda. Durante esse ritual cíclico, que será repetido aproximadamente durante um ano, o guião pode transformar-se num filme de terror, caso ocorra algum erro ou problema que possa provocar a fuga de uma grande quantidade de radioatividade. Os especialistas afirmam que é um processo extremamente complexo e arriscado. Alguns sugerem que cruzemos os dedos, o que, desde logo, não é uma resposta muito científica para um problema desta magnitude. No pior dos cenários, pode haver uma fissão nuclear. Segundo informa a agência Reuters, em Fukushima existem 14 mil Hiroshimas, se isso serve como parâmetro para entendermos a gravidade da situação.
Se tudo correr bem, após esse primeiro ano, a intenção da TEPCO é continuar o trabalho com os reatores números 1 a 3, num prazo de sete anos.
A catástrofe Fukushima nunca foi só dos japoneses
Devido às mentiras contínuas da TEPCO, que sempre alegou que a situação está sob controlo e, também, o método de desinformação consciente empregado, cujo objetivo sempre foi o de deixar a questão sob névoas, para evitar uma radicalização das críticas tanto japonesas como internacionais, a população mundial tem sido mantida com uma venda nos olhos, com a maior parte acreditando que tudo já foi resolvido pela capacidade técnica dos japoneses.
Foram necessários meses para que a TEPCO confessasse que desde a tragédia existe a fuga diária para o Oceano Pacifico uma grande quantidade de radioatividade. São 300 toneladas diárias de água contaminada lançadas ao mar. Já se passaram mais de dois anos e meio dessa contaminação diária e a consequência concreta é que, hoje, parte do Oceano Pacífico já está a ser destruída pela contaminação. Nas proximidades de Fukushima, a pesca já esta proibida. O Oceano Pacifico é um património humano e não uma exclusividade dos japoneses e, quando tudo isto acabar, se é que vai acabar bem, na melhor das hipóteses teremos já uma parte do Pacífico como um novo mar morto, não no sentido literal, mas nas mutações que serão processadas em todo o meio ambiente, o que tornará impossível a sua utilização e desfrute pelos seres humanos, sejam japoneses, americanos ou gregos. Os companheiros da redação do Esquerda.net me advertiram para não ser apocalíptico (o que não farei, apesar de ter a minha opinião a respeito), portanto, deixarei à imaginação do leitor pensar sobre a hipótese de que durante todo esse processo arriscado ocorra uma fissão nuclear.
Governo optou por manter milhões de japoneses sob o risco de sofrer radiação
A maneira como todo o processo de desligamento da central nuclear de Fukushima está a ser conduzida parece “segredo de Estado”. O primeiro-ministro, Shinzo Abe, quer aprovar uma lei para pôr na cadeia, por cinco anos, os jornalistas que se atreverem a escrever a verdade sobre o que ocorre ou pode ocorrer em Fukushima.
O anúncio-surpresa da TEPCO na semana passada é uma prova disso e apenas serve para que a população aumente as suspeitas. Se não houvesse riscos, não haveria por que manter toda a informação guardada a sete chaves e tudo poderia ser esclarecido para não criar ansiedade, angústia e aquilo que o governo mais teme: pânico.
Segundo a Agência Reuters, caso ocorra a fuga para a atmosfera de uma alta quantidade de radioatividade, esta poderá atingir Tóquio, que, como todos sabemos, e o coração do arquipélago japonês. Em Tóquio e nas províncias vizinhas moram cerca de 30 milhões de japoneses e estrangeiros, incluindo brasileiros e portugueses. Não e difícil imaginar todos os tipos de consequências sociais e económicas.
Não seria necessário evacuar uma ampla área em volta de Fukushima antes de se iniciar esse complexo e arriscado trabalho? Sinceramente, penso que sim, mas o que impede a discussão dessa necessidade pode ser resumido numa única palavra: pânico.
O governo japonês tem plena consequência de que falar em evacuação provocaria de imediato uma catástrofe não nuclear, mas económica, já que o pânico poderia tomar conta de milhões de japoneses que residem na área de Kanto, onde fica Tóquio. E isso poderia levar à paralisia da economia, a queda do preço das ações das empresas japonesas, a perda do lucro, a queda do próprio governo, entre outras coisas.