Espanha

Ex-responsável da polícia diz ter recebido pedidos para espiar deputados do Podemos

28 de novembro 2024 - 15:23

Prossegue nos tribunais o caso da “guerra suja” do então governo do PP contra o Podemos. Esta semana, um antigo responsável da luta antiterrorista confirmou que lhe pediram para investigar os antecedentes dos 69 deputados recém-eleitos no final de 2015.

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Mariano Rajoy
O ministro do Interior Fernandez Díaz, o primeiro-ministro Mariano Rajoy e o secretário de Estado da Segurança Francisco Martinez em 2014. Foto Ministerio do Interior espanhol/Flickr

Germán Rodríguez Castiñeira, comissário policial reformado e que chegou a ser o responsável máximo da luta antiterrorista da polícia espanhola, confirmou esta terça-feira a um juiz da Audiencia Nacional ter recebido um pedido no início de 2016 para investigar os antecedentes dos 69 deputados do Podemos eleitos no mês anterior.

Nas eleições de dezembro de 2015 o Podemos emergiu como a terceira força política e colocava-se a hipótese de negociar um acordo com o PSOE para tirar do Governo o PP, então liderado por Mariano Rajoy. No Ministério do Interior funcionava uma brigada política com o objetivo de denegrir o Podemos, os independentistas catalães ou para beneficiar o PP durante a investigação ao “saco azul” do partido. incluindo através da passagem de informações falsas à imprensa mais colaborante. Assim nasceram “escândalos” mediáticos que passavam por supostas ligações do partido de esquerda ao Irão e à Venezuela ou por alegadas suspeitas de financiamento ilegal. Na justiça espanhola, todos esses “escândalos” montados pela chamada “polícia patriótica” e propalados por alguns dos principais meios de comunicação social vieram anos mais tarde a ser arquivados pela inexistência de provas. Mas o objetivo essencial da operação foi atingido, ao manchar de lama o nome do partido junto da opinião pública, obrigando-o a estar permanentemente a desmentir as acusações e assim inverter a tendência de crescimento eleitoral de uma alternativa de esquerda no país.

A atual investigação partiu de uma queixa do Podemos contra os altos responsáveis do Ministério do Interior e da polícia por estas investigações feitas à margem da lei e com objetivos políticos. Na altura dos factos agora recordados na justiça, Rodríguez Castiñeira era o chefe da Brigada Provincial de Informação de Madrid. O autor do pedido era um dos chefes do Comissariado Geral de Informação e membro da alegada “polícia patriótica”, Enrique Garcia Castaño, que por sua vez o recebera do secretário de Estado da Segurança, Francisco Martinez - segundo as mensagens de WhatsApp encontradas no telemóvel deste em 2020 no âmbito da investigação do “caso Kitchen” sobre a espionagem ao tesoureiro do PP preso no caso do “saco azul”. O pedido era simples: encontrar informação sobre os novos deputados, de preferência relacionando-os com o independentismo basco e catalão ou outros meios considerados “extremistas”. E o objetivo seria,  de divulgar a informação aos media próximos deste círculo e assim manchar a imagem desses deputados da esquerda. No depoimento desta semana, Castiñeira afirma ter-se recusado a fazê-lo, alegando que seria “um suicídio”, pois a consulta nas bases de dados deixa o registo de quem a fez. E acrescentou que Castaño reagiu à sua recusa afirmando que o pedido era afinal “uma brincadeira”.

O juiz Santiago Pedraz, que lidera a investigação, tinha pedido em março à polícia que lhe enviasse uma lista dos pedidos de acesso em 2015 e 2016 aos dados dos deputados do Podemos nas bases de dados policiais. E confirmou que pelo menos 55 deputados foram alvo destas consultas feitas a partir de esquadras espalhadas pelo país mas também pela direção de operações policiais. Alguns dos deputados, como o então líder do partido Pablo Iglesias ou a atual ministra do Trabalho e líder do Sumar, Yolanda Diaz, viram os seus dados consultados em mais de uma centena de ocasiões.

Na queixa apresentada pelo Podemos são apontadas oito ações concretas da atividade parapolicial instigada pelos responsáveis do Interior e cujas falsidades foram reproduzidas nos media, incluindo a do forjado “relatório PISA” contra Iglesias ou a da conta bancária que teria no Euro Pacific Bank Limited, além da manipulação de documentos e registos internos da polícia para dar uma aparência de legalidade à atuação dos envolvidos.

 

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