Está aqui
Discotecas voltam a abrir portas à desigualdade de género

Todos conhecemos discotecas onde os homens pagam um valor só pela entrada, enquanto as mulheres além de não pagarem entrada, muitas vezes têm direito a bebidas gratuitas. Há ainda discotecas onde o consumo obrigatório para as os homens chega a ser três vezes superior ao consumo obrigatório para as mulheres.
Esta prática é ilegal e a coima pode ir desde 13.300€ a 19.950€.
A Objetificação da Mulher
Esta é uma prática que se tem mantido e que deve ser considerada numa sociedade do século XXI onde, apesar de existir ainda alguma desigualdade salarial quando comparada a variável de género, o poder de compra é bastante semelhante, menos discutível é quando esta discriminação acontece em eventos académicos ou frequentados maioritariamente por estudantes que ainda não auferem de rendimento próprio. Além disso, e partindo do princípio de que todos vamos a uma discoteca com o mesmo objetivo: divertimento, porque é que ainda existe esta discriminação? A mulher continua a ser vista como um isco, um produto de atração para os homens, e a oferta de bebidas tem apenas uma intenção: vulnerabilizar a mulher colocando-a numa possível situação de fragilidade.
A Perpetuação da Masculinidade Tóxica
Esta é uma realidade que não afeta apenas as mulheres, ela representa também raízes profundas nos homens e na conceção dos papéis de género. Com a emancipação da mulher, o papel do homem na sociedade tem sido posto em causa e isso gera um conflito interno nos homens. É necessário que os homens entendam que o machismo não é bom para ninguém e que o feminismo tem que ser uma luta conjunta pela igualdade e pelo fim à opressão de ambos os sexos. A mulher está a libertar-se do conservadorismo machista, é hora dos homens se organizarem e iniciarem o mesmo processo.
Masculinidade Tóxica é o termo que define a noção de que existem um conjunto de valores, ideias, comportamentos e características biopsicossociais associadas a indivíduos do género masculino que são incentivadas culturalmente e que trazem consequências nocivas para a sociedade como um todo, inclusive para os próprios homens. Alguns exemplos são a opressão emocional (o clássico “homem não chora”) que tem como consequência uma maior percentagem de depressão e de suicídio nos homens; a agressividade como forma de resolução de conflitos; e claro, a pressão da superioridade financeira e do domínio sobre a mulher (o clássico “homem é que paga as contas”).
No advento das conquistas do movimento feminista ao longo dos últimos anos, o papel do homem na sociedade tem sido posto em causa e isso gera um conflito interno nos homens que pode levar ao aumento da violência contra as mulheres, depressão (sendo que só procuram ajuda num estado muito mais avançado), suicídio (segundo a OMS, em Portugal há três vezes mais homens a cometer suicido do que mulheres), entre outros.
Vivemos atualmente um paradoxo ético: por um lado, temos o aumento da igualdade salarial, um aumento de direitos paternais, um aumento na divisão de tarefas domésticas, etc.. Por outro lado, temos discotecas a exigir um maior poder de compra aos homens e restaurantes que continuam a apresentar a conta ao homem. Se pensarmos num casal heterossexual em que a mulher tem um maior poder de compra do que o homem, estas duas realidades convergem num conflito interno no que toca ao papel que o homem deve desempenhar na sociedade. O homem continua a ser pressionado para corresponder a um padrão social que não existe mais.
O que diz a legislação?
Lei n.º 14/2008, de 12/03 - Proíbe e sanciona a discriminação em função do sexo no acesso a bens e serviços e seu fornecimento, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2004/113/CE, do Conselho, de 13 de dezembro, alterada pela Lei n.º 9/2015 de 11 de fevereiro
[…]
Artigo 12º, 2— A prática de qualquer acto discriminatório por pessoa colectiva de direito público ou privado, tal como proibido pelos n.os 1 a 4 do artigo 4.º, bem como a violação do disposto nos artigos 5.º e 6.º, constitui contra -ordenação punível com coima graduada entre 20 e 30 vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida, sem prejuízo da responsabilidade civil e de outra sanção que ao caso couber.”
Por outras palavras, esta prática é ilegal e a coima pode ir desde 13.300€ e 19.950€.
O estado tem o dever de promover a igualdade de género e é necessário haver mais fiscalização nestes espaços noturnos. Por outro lado, todos nós somos agentes de proteção civil e temos o dever deixar de compactuar com estabelecimentos que continuam a adotar esta prática assim como denunciar estes casos.
Fontes:
Lei n.º 9/2015 de 11 de fevereiro https://dre.pt/application/conteudo/66480819
Lei n.º 14/2008, de 12/03 https://dre.pt/application/conteudo/247035
Artigo de Helena Ribeiro
Adicionar novo comentário