#BrequeDosApps: Greve nacional de estafetas no Brasil

01 de julho 2020 - 21:44

Aumentos das taxas mínimas por cada entrega e medidas de proteção contra o novo coronavírus estão entre as principais reivindicações. Estudo revela que mais de metade dos trabalhadores trabalha entre 9 a 14 horas por dia.

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Arte de Denis Gonsales

Os trabalhadores de várias aplicações de entregas promovem esta quarta-feira uma greve nacional. A paralisação reúne milhares de estafetas por todo o país, que trabalham para empresas como a Rappi, Loggi, Ifood, Uber Eats e James, e que reclamam melhores condições de trabalho, medidas de proteção contra os riscos de infecção pelo novo coronavírus e mais transparência na dinâmica de funcionamento dos serviços e das formas de remuneração, refere a Agência Brasil.

A greve tem vindo a ser organizada durante todo o mês de junho, através de grupo whatsapp, mas já se juntaram algumas associações do setor. Os participantes lançaram também a hashtag #BrequeDosApps, que tem vindo a ganhar muita visibilidade nos últimos dias, através da publicação de testemunhos destes trabalhadores.

O protesto ganhou relevância em outros países da América Latina, como a Colômbia, Argentina e Chile.

O que reivindicam estes trabalhadores

Atualmente a remuneração destes estafetas é contabilizada tendo em conta dois indicadores, aos quais são aplicadas taxas: a distância percorrida e a viagem. Os trabalhadores que agora exigem um aumento destas taxas reclamam que os valores aplicados são muito baixos e as formas de cálculo não são claras.

Além desta alteração, os estafetas exigem uma mudança nos critérios para o seu bloqueio nas aplicações. De acordo com a Agência Brasil, os motoristas veem a sua participação suspensa, ou até mesmo cancelada, a partir de critérios que não são claros, sem a possibilidade de apuramento das ocorrências e de direito de defesa dos envolvidos.

Num momento em que o número de infetados pela covid-19 no Brasil se mantém em valores elevados, os trabalhadores queixam-se da falta de apoio de algumas empresas, que não fornecem os meios necessários para a sua proteção, e quem fica infetado não tem qualquer assistência. Neste sentido exigem um auxílio-pandemia.

Os entregadores pedem ainda um seguro contra o roubo dos seus instrumentos de trabalho e que cubra também os acidentes de trabalho.

No caso de uma das aplicações, a Rappi, uma das mais populares no Brasil, os trabalhadores reivindicam ainda uma alteração do seu sistema de pontuação, que é muito penalizador para os estafetas.

Simões, um estafeta do Rio de Janeiro, diz à Agência Brasil que, até ao momento, as empresas de entrega não entraram em contacto para se reunirem com os entregadores e iniciar uma negociação sobre as suas exigências. A única coisa que as empresas têm feito é notificar os comerciantes que vai haver uma greve.

Estudo revela condições de trabalho destes trabalhadores

Um estudo publicado este ano na revista Trabalho e Desenvolvimento Humano, que envolveu sete investigadores que entrevistaram estafetas que trabalham para aplicações em 29 cidades do Brasil, durante a pandemia, revela condições de trabalho muito precárias. O estudo mostra que mais de metade dos estafetas (54%) trabalham entre 9 e 14 horas por dia, índice que aumentou para 56,7% durante a pandemia. Entre os entrevistados, 51,9% relataram trabalhar todos os dias da semana.

Quanto ao vencimento mensal, cerca de metade dos trabalhadores (47,4%) responderam que recebiam até 2.080 reais por mês (cerca de 350 euros), e 17,8% disseram auferir até 1.040 reais mensais (menos de 180 euros). A maioria dos participantes no estudo revelou ter tido uma queda da remuneração durante a pandemia.

Mais de metade dos trabalhadores declarou não ter tido qualquer tipo de apoio por parte das empresas para mitigar os riscos de contrair o novo coronavírus mas, ainda assim, 96% comentaram ter adotado algum tipo de proteção individual, seja através do uso do álcool gel ou máscara.

Rafael Grohmann, coordenador do projeto Fairwork no Brasil, da Universidade de Oxford, diz à Agência Brasil que a análise destas plataformas noutros países revelou que elas não cumprem com requisitos básicos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para o trabalho decente: remuneração, condições de trabalho (inclusive saúde), contratos que reflitam a atividade, gestão participada e transparente e representação e liberdade de associação.