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Organizações alertam para perseguição de ativistas em Moçambique

As redes sociais estarão a ser utilizadas por pessoas próximas do poder para discursos de incitação ao ódio e à violência contra pessoas e organizações que critiquem publicamente o governo.
"O mundo não tem ideia do que está a acontecer", dizia em 2020 o ainda então Bispo de Cabo Delgado Luiz Fernando Lisboa.
"O mundo não tem ideia do que está a acontecer", dizia em 2020 o ainda então Bispo de Cabo Delgado Luiz Fernando Lisboa. Foto de Ricardo Franco, Lusa arquivo.

Cerca de 20 organizações alertam em comunicado conjunto para uma série de atos de intimidação por parte de figuras “próximas ao Governo central” de Moçambique contra jornalistas, investigadores, ativistas e defensores de direitos humanos em Cabo Delgado.

A província está a ser assolada por uma catástrofe humanitária com mais de 700 mil deslocados devido a ataques terroristas na região desde 2019, a que se juntou a crise pandémica. O Bispo Luiz Fernando Lisboa, este mês transferido para o Brasil, foi uma das vozes que mais chamou a atenção para os problemas da região, criticando o governo que reagiu de forma adversa. 

No texto, os subscritores denunciam uma “prática recorrente de discursos de assassinato de carácter e de incitação ao ódio e à intolerância” nas redes sociais contra aqueles que “interpelam criticamente os sinais de má governação, de abuso de poder e/ou de autoridade e denunciam a violação de direitos humanos e atos de corrupção”.

O incêndio por fogo posto às instalações do Canal de Moçambique e os ataques reiterados às organizações independentes como o Centro de Integridade Pública, bem como aos media independentes, são alguns exemplos das consequências diretas de “discursos de incitação ao ódio e à violência” que culminaram em assassinatos e agressões, incluindo detenções arbitrárias “que nunca foram cabalmente esclarecidos pelos órgãos de Justiça”, escrevem.

E dão o exemplo mais recente do professor Hélder Martins, médico e antigo Ministro da Saúde que pediu demissão da Comissão Técnico-Científica para a Prevenção e Combate à Pandemia da Covid-19 em Moçambique, que “está a ser vítima” de uma campanha “liderada por pessoas próximas” do Presidente da República e com “cargos relevantes” na administração pública do país.

Relembram também as campanhas movidas contra o então Bispo da Diocese de Pemba, Dom Luiz Fernando Lisboa, a jornalista e pesquisadora Fátima Mimbire, bem como o jornalista Fernando Lima.

Em entrevista ao Deutsche Welt, o sociólogo e coordenador da publicação “Como está Cabo Delgado”, do Observatório do Meio Rural, defende que o Bispo saiu de Pemba devido à pressão e perseguição política de que foi alvo.

”Ele sempre foi uma voz que questionou a situação e a injustiça social. Sempre defendeu os mais desfavorecidos. E à medida que aumentava a tensão social, à medida que começaram os ataques terroristas, tornava-se um pouco politicamente incómodo referir os problemas sociais que existiam”, afirma ao DW.

Para João Feijó, a perseguição do Bispo de Pemba “faz lembrar um pouco a postura do bispo Dom Manuel Vieira Pinto, o antigo bispo de Nampula [perseguido pela polícia secreta portuguesa PIDE]. O que fizeram com ele foi muito parecido. Ele também acabou por ser expulso de Moçambique depois de ter havido um assassínio do seu carácter”.

Mesmo que estes ataques expulsem os ativistas do país, “o problema continua ali”, argumenta João Feijó. “As estruturas sociais e o problema de integração económica continuam ali. Portanto, a próxima pessoa que vier vai continuar a tratar desse problema e vai ter que continuar a colocar o dedo na ferida. É desagradável, mas nós temos que enfrentar. Não podemos fazer disso um tabu. É um problema nacional, no qual todos nós temos que nos envolver”.

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