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Brasil: derrota de Boulos tem gosto de vitória

Candidato do PSOL chega aos 40%, insuficientes para vencer a prefeitura mas que confirmam novas relações de força na esquerda. Bolsonaristas tiveram mais derrotas, e a grande vencedora é a direita mais tradicional. Por Luis Leiria.
Boulos e Erundina. Montagem publicado por Boulos no Twitter.
Boulos e Erundina. Montagem publicado por Boulos no Twitter.

Na hora em que escrevo este artigo ainda não está feito o levantamento preciso das vitórias e derrotas nas 53 cidades em que se realizou o segundo turno das eleições municipais no Brasil, mas quem venceu foram os partidos da direita não bolsonarista.

Tanto os partidos do chamado “núcleo duro” do centrão quanto os mais tradicionais da direita averbaram vitórias. Mesmo o PSDB, que teve um recuo, salvou a honra do convento com a vitória de Bruno Covas em São Paulo, a maior cidade do país.

Bolsonaristas têm mais derrotas

Em contrapartida, não adiantou aos candidatos apoiados pelo presidente Jair Bolsonaro ocultarem esse apoio, tornado impopular. Dos quatro que disputavam o segundo turno, o Capitão Wagner em Fortaleza, Marcelo Crivella no Rio de Janeiro, Delegado Federal Eguchi, em Belém, saíram derrotados; só Delegado Pazolini, do partido Republicanos, em Vitória, capital do Estado do Espírito Santo, venceu.

Bolsonaro votou no Rio de Janeiro, confirmou o voto no atual prefeito Crivella, que foi fragorosamente derrotado, e voltou a questionar a segurança das urnas eletrónicas, sem apresentar provas de qualquer falha ou fraude.

Centro-esquerda e esquerda

A aliança PDT-PSB, o bloco da centro-esquerda, teve importantes vitórias em quatro capitais do Nordeste: Recife, Fortaleza, Aracajú e Maceió. Esta aliança e este resultado vêm reforçar a candidatura Presidencial de Ciro Gomes em 2022, dando-lhe maior base de sustentação.

PSOL cresce, PT recua

Do lado da esquerda, confirmou-se a dinâmica de crescimento do PSOL, ao contrário do PT, que continua a recuar. O PSOL venceu Belém, capital de Estado do Pará, conquistada pelo candidato Edmilson Rodrigues. Maior metrópole da Amazónia, Belém já teve Edmilson à frente da sua prefeitura em dois mandatos (1997 a 2000, e 2001 a 2004), quando era militante do PT.

O PT perdeu a disputa em Recife, com Marília Arraes, e em Vitória, ficando sem o governo de qualquer capital de Estado. Nas eleições deste domingo, o PT conquistou quatro cidades médias – Contagem e Juiz de Fora, em Minas Gerais, e Diadema e Mauá, em São Paulo.

Manuela d’Ávila, do PC do B, perdeu também a disputa em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul.

O fenómeno Boulos

Mas a grande disputa da esquerda era a de São Paulo, com a candidatura de Guilherme Boulos e de Luíza Erundina, do PSOL. Boulos pôs no terreno uma campanha que empolgou a militância e criou novos horizontes à esquerda. Numa situação ainda nada favorável à classe trabalhadora, Boulos apresentou-se com as suas credenciais de 20 anos a lutar pelo direito à moradia em São Paulo, construindo neste processo o mais dinâmico movimento social do país, o MTST. Ao mesmo tempo, juntou-lhe a experiência de Luíza Erundina, que foi a primeira prefeita de esquerda da cidade (1989-1993), quando era do PT.

A lista Boulos-Erundina começou a campanha com pouco mais de 4% e atropelou os outros candidatos, entre os quais Celso Russomano, apoiado por Bolsonaro, e Márcio França, do PSB, chegando ao segundo turno com 20%.

A força e o entusiasmo com a candidatura Boulos-Erundina empurraram os partidos de esquerda e de centro-esquerda a unirem-se para apoiá-la no segundo turno. Lula (PT), Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede) e Flávio Dino (PC do B) apareceram juntos no tempo de antena do candidato do PSOL. Foi a primeira vez que se uniram no apoio a um candidato desde 2006, quando Lula conquistou o segundo mandato na Presidência da República.

Uma derrota com gosto de vitória

A campanha do segundo turno culminou com uma carreata que partiu de cinco pontos diferentes da cidade para se encontrarem na avenida Paulista. O candidato, azar dos azares, testou positivo de Covid-19, e viu-se forçado a cumprir quarentena em casa, não podendo participar presencialmente em mais nenhuma atividade de campanha e nem sequer pôde votar.

Os 40,6% que obteve neste domingo não foram suficientes para vencer a prefeitura, mas trouxeram ao PSOL e a Boulos um gosto de vitória. Com este resultado, o PSOL demonstrou que o PT já não tem a hegemonia da esquerda, que esta está em aberto e o partido está em boas condições para disputá-la. E que Boulos e o PSOL estarão num lugar central em futuras negociações que envolvam a candidatura da esquerda à Presidência da República, e ganharam mais força para chamar à mobilização – mais que necessária – para abreviar o mandato de Jair Bolsonaro à frente do governo.

Sobre o/a autor(a)

Jornalista do Esquerda.net
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