Confesso que há muito tempo que o desaparecimento de alguém não mexia tanto comigo. A morte do João Semedo surpreendeu-me, de tal forma, que ainda me custa a acreditar que se foi e que não vou receber mais aquelas mensagens encorajadoras nos maus momentos e de felicitações nos bons. Hoje, quando cumpríamos, no Parlamento, um minuto de silêncio em sua memória, recordei um passeio que demos na baixa do Funchal, entre o Golden e o Teatro, de braço dado, às 10h da noite, numa noite fria de Fevereiro de 2013. Da gargalhada do João quando me disse "olha lá. O que vão dizer os teus eleitores quando se aperceberem que trocaste a Sónia, jovem e bonita, por este velhote?!". E rimos, rimos muito. E riu mais ele ainda quando lhe disse que a Sónia não tinha ciúmes de velhos. Nessa noite falámos da vida, das Lutas, da necessidade de ajudarmos a criar uma alternativa política na Madeira cujas sementes poderiam ser lançadas já nas autárquicas desse ano. Foi também, nessa mesma noite, quase a chegar ao Hotel Orquídea, na Rua dos Netos, onde estava hospedado, que levei um sermão quando lhe disse que tenho uma licenciatura para acabar, há uma década, e que havia interrompido os estudos para me dedicar à política. Disse-me que a vida passa e que se deixarmos o tempo correr pode não dar tempo para tudo. Puxou-me as orelhas e ordenou que voltasse à Universidade. Mas, como de costume, não lhe dei ouvidos. Foram três ou quatro horas marcantes, numa noite em que o João veio à Madeira só para jantar comigo e me dar força para as Lutas que se avizinhavam. Lutas das quais ele não deixou que eu me afastasse nos tempos difíceis. Como ele dizia, "para a reforma só te faltam 30 anos". O João era assim. Amigo, camarada, divertido e teimoso como uma porta. Sobretudo quando queria bem a alguém. Nessa noite, passeamos de braço dado. Só mais tarde percebi que me havia dado o braço, não apenas para o passeio, mas para com o meu braço, com todos os braços, fazermos a Luta toda. E fizemo-la. Obrigado João. Descansa em paz.
O braço do João
A morte do João Semedo surpreendeu-me, de tal forma, que ainda me custa a acreditar que se foi e que não vou receber mais aquelas mensagens encorajadoras nos maus momentos e de felicitações nos bons.
19 de julho 2018 - 15:17
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