Perda de trabalhos: O processo de reconhecimento de vínculo laboral realiza-se abruptamente sem garantir a permanência dos atuais trabalhadores. A criação de falsos postos de trabalho graças ao algoritmo não tem sido mais que uma bolha que vai explodir de maneira violenta se não se obrigar as empresas a realizar as contratações apropriadas, pois não confiamos no seu critério para converter responsavelmente todos os falsos autónomos em trabalhadores. É importante destacar que o acordo entre patrões e sindicatos que se firmou há mais de dois meses previa que a lei fosse ser aplicada três meses após a sua publicação no BOE. Além desses três meses extra, nos últimos meses tivemos conhecimento de um pacto não escrito entre o patronato e o Ministério de Trabalho para ceder mais tempo às empresas, dando assim mais quase cinco meses para que continuem a vulnerabilizar os nossos direitos laborais. Isto é algo inaudito, não podemos fazer outra coisa que não condenar veementemente esta decisão. Os nossos direitos laborais não podem ser fragilizados nem mais um dia. O prazo concedido às empresas acabará precisamente a meio de agosto, com muitos advogados de férias, o que vai provocar uma difícil resposta aos possíveis despedimentos por parte destas empresas.
Subcontratação: Na linha das reformas laborais realizadas em 2010 e 2012, que não foram revogadas, não se garante que estas empresas não derivem pela muito provável linha de subcontratação, que, como se demonstrou com nossas irmãs As Kelly [associação de camareiras], é um coador de direitos laborais.
Nesta linha, não se trata só de fazer cumprir a lei e o estatuto dos trabalhadores para o nosso coletivo, e sim de proteger os direitos e a dignidade da classe trabalhadora, coisa que só se conseguiu numa pequena proporção, tendo em conta os espaços vazios que permitem às empresas continuar com os seus esquemas e sair impunemente dos que já têm realizado. Não toleraremos nem permitiremos que se substitua uma fraude por outra, é por isso que continuaremos a lutar para pôr fim à transferência ilegal de trabalhadores, às ETT e à subcontratação.
Não protege o resto da classe trabalhadora: A regulação é específica para os riders. Isto implica que os restantes coletivos que já são uberizados poderão ser controlados por algoritmo impunemente, e praticamente deixa as portas abertas à uberización de muitíssimos outros coletivos, o que marcará uma perda de direitos generalizada para trabalhadores e trabalhadoras dos setores da limpeza, tradução,… e todos aqueles serviços suscetíveis de serem fragmentados e ficarem sem proteção legal.
Pouca transparência no controlo do trabalho: Reconhecemos que é um avanço permitir aos comites de empresa aceder ao algoritmo, mas Espanha perde a oportunidade de ser uma referência e exigir uma transparência real a estas empresas. A forma como controlam o trabalho não deveria ser tratada como a “fórmula da Coca Cola”.
Não regularização: Não existe nenhuma tentativa de regularização dos trabalhadores sem papéis que têm sido vítimas do mercado de aluguer de contas. Consideramos que Glovo, Deliveroo, Uber Eats, Shargo, Stuart, etc. têm visto crescer os seus exércitos de distribuidores graças à disponibilidade praticamente infinita das pessoas que subalugam contas. Estando cientes da desregulamentação da oferta e procura liberal, é fácil deduzir que esta disponibilidade tem influído drasticamente na violenta descida de preços e rendimentos dos distribuidores, incluído um corte para metade no princípio da pandemia em confinamento geral. Que não nos interpretem mal: a descida dos preços não é culpa das pessoas não regularizadas, é a empresa aque toma essa decisão e o Estado e a sociedade quem o permite.
Impunidade: Não se penalizou as empresas incumpridoras, ao contrário do que conseguiram, pela via judicial, os nossos irmãos e irmãs de Itália, onde se ordenou a contratação e multas milionárias para estas empresas. Temos sido vítimas de centenas ou milhares de acidentes, alguns deles mortais. Têm defraudado milhões de euros necessários para as contas públicas, especialmente com esta crise gerada pela pandemia. Além disso, não se cria um observatório fiscalizador tal como se chegou a falar, o qual não deveria contar com a participação patronal, facto indispensável para velar pelo respeito dos direitos laborais e as condições de trabalho dignas de trabalhadores e trabalhadoras.
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No texto inclui-se a presunção de laboralidade, argumento que já existe no nosso ordenamento jurídico e que, além disso, foi utilizado na recente sentença do Supremo Tribunal. O resumo jurídico de toda esta negociação é que, provavelmente, tenhamos que continuamos a lutar nos tribunais para que reconheçam os nossos direitos laborais, apesar da pequena abertura ao funcionamento do algoritmo sobre os mecanismos de controlo, face ao comité de empresa.
Ao longo deste ano de negociação, o Ministério de Trabalho tem cedido, com o passar do tempo, a grande parte dos postulados do patronato e têm eliminado e recusado todas as propostas feitas pelos sindicatos. As propostas iniciais eram ambiciosas e permitiam que esta lei se aplicasse a muitos mais setores afetados por esta fraude. Não obstante, é um facto que o Ministério de Trabalho tem querido, por fim, agradar o patronato e pouco os trabalhadores. Isto parece-nos um tremendo erro. Esta lei deveria ser acompanhada da derrogação imediata das reformas laborais, tal e como pede toda a classe trabalhadora.
Para finalizar, parece-nos importante assinalar que a laboralização dos riders não só se conseguiu pela vontade do Ministério de Trabalho com esta lei, ela é resultado da soma de forças de diferentes sindicatos, de académicos comprometidos, da força da rede internacional contra a uberização e, em especial, da auto-organização, manifestações e denúncias dos próprios distribuidores, que conseguiram mais de 47 sentenças favoráveis durante estes últimos 4 anos, incluindo a do Supremo Tribunal.
Há mais de quatro, a nossa plataforma luta e expõe incansavelmente a problemática de nosso setor, alertando para o modelo que algumas empresas pretendem implantar. Agora, abre-se um palco diferente em que consideramos importantíssimo o papel dos sindicatos e apelamos a que todos os trabalhadores se unam e se organizem com o sindicato que escolherem. Embora as empresas e os patrões tenham tentado em vão afastar-nos dos sindicatos, não nos cansaremos nunca de dizer que o sindicato é a ferramenta mais potente que os trabalhadores têm para se organizar e enfrentar o futuro nos seus postos de trabalho.
Está lei não é o fim, nem nada que se lhe pareça, é apenas uma etapa no percurso da nossa lutaEstas empresas têm vindo a carregar absolutamente tudo e sabemos que, tal como a lei contornaram a lei durante mais de cinco anos, vão continuar a tentar fazê-lo com esta legislação. É por isso que continuaremos a lutar junto a muitos outros setores da classe trabalhadora para que respeitem os nossos direitos e se deixe de fragilizar sistematicamente direitos fundamentais.
Tomada de posição da Plataforma Riders X Derechos BCN – IAC sobre a lei “Rider” espanhola, publicada em: https://www.ridersxderechos.org/?p=3260