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A esperança vencerá o medo

O governo e o primeiro-ministro tanto exploram a arma do medo, que acabam por conseguir o efeito contrário. Ninguém pode aceitar a lógica absolutamente egoísta do "ou eu ou o caos" ou considerar o direito de voto como uma insignificância. Artigo de Kalyvis Alékos.
A estratégia do medo deu resultado em 2012. Mas três anos depois os gregos já provaram a alternativa da submissão aos interesses da troika.

A linha divisória entre os partidários e os opositores ao memorando não é uma ficção oca, tem a sua extensão e espessura, e é por isso, aliás, que veio anular antigas oposições erguidas sobre fortes cargas ideológicas e emocionais, levando milhões de compatriotas nossos a adoptarem um novo comportamento político baseado na sua nova situação social.

Essa oposição aprofunda-se e adquire sinal positivo com a proposta alternativa do SYRIZA, que é uma ruptura com o passado, não só com os memorandos, mas com todos os elementos negativos acumulados ao longo de 40 anos de governação da Nova      Democracia e do PASOK.

A coligação só tem uma arma, o medo

O governo e o primeiro-ministro tanto exploram a arma do medo, que acabam por conseguir o efeito contrário. Ninguém pode aceitar a lógica absolutamente egoísta do "ou eu ou o caos" ou considerar o direito de voto como uma insignificância. A coligação avança como único argumento a sua adesão à lógica do aluno obediente, considerando que esse será o passaporte para a resolução dos nossos problemas.

Esta lógica ruiu comprovadamente ao longo do último período, porque veio aprisionar-nos num círculo vicioso de novas exigências impopulares da troika, levando, consequentemente, à correspondente queda da coligação. Esta atitude de fatalismo e subserviência para com a autoridade alemã é a versão moderna da teoria da «Grécia coitadinha» (que chamamos em grego «Psorokostainas»).

A extrapolação dessa lógica é que um povo não pode decidir do seu destino, que, por exemplo, a proposta política do SYRIZA pode muito bem ganhar a maioria das pessoas, mas que será obrigatório implementar a política aplicada pela Nova Democracia. Isto é, que a política a aplicar será, não a que venceu, mas a que foi derrotada.

A segunda fonte do medo e da obediência são os mercados

A esquerda radical não tem motivos para enfrentar o medo com que a provocam sujeitando­‑se a ele, nem para procurar áreas de consenso onde não podem existir, antes deve insistir com sangue-frio e decididamente na política radical, porque esta é exactamente a via para sair da crise.

Os mercados têm manifestamente interesses opostos aos do povo. Quanto mais se restringirem os direitos e os rendimentos dos trabalhadores, melhor para os fundos de investimento que especulam com a miséria do mundo. Assim, a sujeição a eles não é uma posição política, mas negação da política e fidelidade ao neoliberalismo. Uma coisa é fazer sempre uma adequada avaliação da correlação de forças, outra completamente diferente é rendermo­‑nos integralmente aos seus apetites, que é o que faz conscientemente o governo.

Além disso, a insistência exclusiva no espantalho da política do SYRIZA é inadequada, visto que os mercados, pelo menos nesta fase, estão a atacar pela enésima vez o governo Samaras, talvez porque considerem que o seu programa e o seu plano falharam. É claro que arreganham os dentes ao SYRIZA, mas a explicação não é linear.

A esquerda radical não tem motivos para enfrentar o medo com que a provocam sujeitando­‑se a ele, nem para procurar áreas de consenso onde não podem existir, antes deve insistir com sangue-frio e decididamente na política radical, porque esta é exactamente a via para sair da crise. A esquerda radical tem o dever de fazer com que a esperança vença o medo.


Kalyvis Alékos é membro do Secretariado Político do Syriza e da equipa de preparação do programa de Governo. Sindicalista do setor bancário, foi vice-presidente da central sindical GSEE e fez parte da equipa de coordenação do Fórum Social Europeu. Artigo publicado no diário Avgi a 30 de dezembro de 2015. Tradução de Manuel Resende para o esquerda.net.

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Neste dossier:

O que fará um Governo Syriza?

A três semanas das eleições gregas, o esquerda.net publica as linhas gerais do programa eleitoral e as opiniões de economistas e dirigentes do Syriza sobre os caminhos da mudança política no país e na Europa. Com a dívida e o memorando da troika no centro do debate, apresentamos também alguns relatos dos efeitos da austeridade na vida da população e como a solidariedade tem servido de antídoto à pulverização da resistência. Dossier organizado por Luís Branco.

Tsipras: Em 26 de janeiro, o governo da maioria das pessoas!

A direção do Syriza aprovou por larga maioria as bases do programa de Governo para discussão a Conferência Permanente da coligação. Leia aqui os principais pontos. Artigo do diário Avgi.

“A ameaça a um governo Syriza não virá dos mercados, mas de Berlim e Bruxelas”

O economista Yanis Varoufakis, conselheiro económico do Syriza, defende nesta entrevista que a recuperação grega nunca aconteceu para além da propaganda e que a saída do euro não fará parte da estratégia negocial de um governo liderado por Alexis Tsipras. Publicado em L'Antidiplomatico.

“A economia grega encontra-se numa armadilha da dívida”

Yorgos Stathakis é apontado como possível ministro das Finanças de um governo Syriza. Defensor de uma viragem keynesiana e de um New Deal europeu, quer renegociar a dívida e sair do memorando para dar resposta à crise humanitária na Grécia. Publicado no jornal La Vanguardia.

33 razões por que Atenas (e a Grécia) ainda está em depressão profunda

Neste artigo publicado no blogue Histologion, Mihalis Panagiotakis apresenta os dados concretos dos efeitos da austeridade na vida do povo grego, que se refletiram na capital do país.

Depois dos Merkozy... os Tsiglesias?

Káki Balí, editora de economia do diário Avgi, analisa as reações da imprensa económica internacional ante o cenário de uma vitória da esquerda na Grécia.

Política, mentiras e vídeo

Um homem ligado aos negócios e à política tentou subornar um deputado na recente eleição para presidente. Nada lhe aconteceu, o que mostra bem o estado da corrosão da austeridade nas instituições gregas. Artigo de Nikos Smyrnaios.

O fim político da Primavera Política

Aqui há uns anos, a Nova Democracia escolhia o novo líder que iria suceder a Kostas Karamanlís. Os candidatos eram a filha de Mitsotákis (o fundador do Partido Liberal) e Antónis Samarás vindo do partido Primavera Política. O resultado é conhecido. Artigo de Rias Kalfakákou.

A esperança vencerá o medo

O governo e o primeiro-ministro tanto exploram a arma do medo, que acabam por conseguir o efeito contrário. Ninguém pode aceitar a lógica absolutamente egoísta do "ou eu ou o caos" ou considerar o direito de voto como uma insignificância. Artigo de Kalyvis Alékos.

"A vitória do Syriza servirá como locomotiva para a esquerda radical na Europa"

O professor de filosofia política e membro do Comité Central do Syriza Stathis Kouvélakis, que afirma acreditar que o partido liderado por Alexis Tsipras vencerá as eleições de forma contundente, defendeu que o velho sistema político bipartidário "entrou em colapso”.

“O Syriza precisa de um mandato claro e forte nas eleições”

Argiris Panagopoulos, jornalista e membro do Syriza, falou ao esquerda.net sobre a situação política grega no momento em que o governo de Samarás ainda tentava eleger o seu candidato presidencial.

Manifesto alemão contra a “campanha do medo” na Grécia

Declaração subscrita por personalidades do meio sindical, cultural e político da Alemanha contra a ingerência de Berlim e Bruxelas nas eleições gregas.

Austeridade arrasou sistema público de saúde na Grécia

Num país onde faltam profissionais, medicamentos e material médico e hospitalar, 3 milhões de pessoas não têm acesso a cuidados médicos. Para encher os cofres dos seus credores - aos quais pagou 63 mil milhões de euros em 2013 - o governo grego promoveu um verdadeiro saque fiscal e cortou drasticamente nas áreas sociais, como a Saúde e a Educação.

Solidariedade contra a austeridade: o exemplo da saúde na Grécia

A Clínica Comunitária Metropolitana de Helliniko é um exemplo de resposta cidadã e mobilização social pelo direito à saúde. Relato de uma visita efetuada no verão de 2014.

Documentário: "Que ninguém fique só no meio da crise"

Filmado em julho de 2013 na região de Atenas, este mini-documentário dá a conhecer algumas das redes de solidariedade e ajuda mútua erguidas pelas vítimas da austeridade e pela esquerda grega. Realizado por Jorge Costa e Bruno Cabral.