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“A economia grega encontra-se numa armadilha da dívida”
Yorgos Stathakis, deputado do partido de esquerda Syriza, é o principal responsável pela estratégia económica e provável ministro de economia se o Syriza ganhar, como parece provável, as eleições que se celebrarão na Grécia a 25 de janeiro. Defende uma viragem keynesiana, uma espécie de New Deal na política da zona euro: muito mais investimento público, para impulsionar o crescimento e o emprego, e a reestruturação negociada da dívida. Mas a sua visão tem também uma faceta mais próxima à economia ambientalista. Tem sido um dos impulsionadores das redes de intercâmbio e moedas alternativas a partir da sua cátedra de Ciências Económicas na Universidade de Creta. Stathakis calculou que se contarem com o apoio de um governo central, 20% dos serviços sociais podem ser proporcionados pelas redes.
Há uma campanha de medo neste momento em relação às consequências de uma vitória do Syriza nas eleições. Porquê?
Acho que é em 100% resultado do governo de Samarás. Houve comentários infelizes de políticos europeus. Mas Juncker retificou dizendo que quando falava de “extremistas” se referia à extrema-direita. Nenhum democrata pode ter medo das eleições.
Se o Syriza ganhar, que farão?
O nosso programa é o que foi anunciado em Salónica. Queremos sair totalmente do programa pactuado no memorando com a troika. Queremos atender imediatamente à crise humanitária que atinge milhares de gregos. Queremos restabelecer um salário mínimo de 751 euros mensais. E subiremos o rendimento mínimo isento de pagar imposto para 12.000 euros anuais. E renegociar a dívida.
O nosso programa é o que foi anunciado em Salónica. Queremos sair totalmente do programa pactuado no memorando com a troika. Queremos atender imediatamente à crise humanitária que atinge milhares de gregos. Queremos restabelecer um salário mínimo de 751 euros mensais. E subiremos o rendimento mínimo isento de pagar imposto para 12.000 euros anuais. E renegociar a dívida.
E a renegociação da dívida como será feita?
Já se cortou uma parte importante da dívida grega em novembro de 2012. O que estamos a propor é o adiamento.
Não há perigo, se renunciarem ao acordo com a Troika, de o BCE retirar liquidez do sistema bancário grego?
Não pode haver um corte de liquidez. Desde que existe a união bancária não é possível que o BCE retire financiamento a bancos que passaram a prova de solvência como aconteceu com os bancos gregos. Desde que há união bancária isto mudou. É importante ter isso em conta. Haverá que procurar uma solução viável.
Se não houver mudança de rumo e o atual governo adotar as políticas acordadas com a troika no último memorando, que impacto terá na economia grega?
Há um buraco de financiamento para 2015 e 2016 de modo que querem ainda mais medidas de restrição fiscal e mais uma nova onda de reformas no mercado de trabalho. Ambas são para nós inadmissíveis.
Porquê?
Porque a economia grega encontra-se numa armadilha da dívida. Se forem adotados mais ajustamentos fiscais, restringir-se-á o crescimento de novo. Mas a troika quer mas do mesmo. Precisamente no momento em que há algum crescimento querem adotar mais cortes ou subidas de impostos. E isso matará o crescimento. Temos que sair desta armadilha da dívida. É tão óbvio como dizer ABC.
Seria mais fácil enfrentar a Troika dessa maneira se tivessem apoio em países como a Espanha?
Se o Syriza ganhar vai ajudar a impulsionar a mudança política que começa em Espanha. A subida do Podemos em Espanha é muito boa notícia. A verdade é que se o Syriza ganhar vai ser uma ajuda para muitos europeus mesmo não sejam de esquerda. Porque a política de austeridade obviamente não funciona.
Se o Syriza ganhar vai ajudar a impulsionar a mudança política que começa em Espanha. A subida do Podemos em Espanha é muito boa notícia. A verdade é que se o Syriza ganhar vai ser uma ajuda para muitos europeus mesmo não sejam de esquerda. Porque a política de austeridade obviamente não funciona. Acho que ajudaremos a que se recoloque tudo, a que haja mais medidas expansivas, que o BCE aposte forte na expansão quantitativa. Neste momento as economias que estão a ser submetidas a muita pressão são a Itália e a França.
O Syriza comprometeu-se a ligar de novo a eletricidade a milhares de famílias que deixaram de a ter. Como se financiará isto? É parte de uma estratégia mais ampla no setor energético?
A troika exerceu fortes pressões para que se adotasse uma solução de mercado no setor energético, com a privatização. Mas o resultado é um desastre absoluto. Primeiro, nós resolveríamos uma crise humanitária em que milhares de famílias têm que viver sem luz elétrica já que não podem pagar as faturas. Depois, poríamos mãos à obra na melhoria de uma situação em que várias centrais de gás estão infrautilizadas e desenvolveíamos o potencial grego de criar energia renovável também.
Na sua qualidade de economista da Universidade de Creta foi defensor de uma economia descentralizada baseada em redes locais, moedas alternativas, etc. Isso seria parte da estratégia do Syriza?
Sim, temos que descentralizar. Isso vai para além de uma resposta de sobrevivência; as redes ajudaram a suavizar o golpe da crise e podem ser uma forma de complementar o Estado Social.
Entrevista a Yorgos Stathakis realizada por Andy Robinson, publicada em La Vanguardia a 31 de dezembro de 2014. Tradução para português de Carlos Santos para esquerda.net
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