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Declaração da agência TASS sobre a intervenção militar na Checoslováquia

No próprio dia 21 de Agosto, a agência Tass, a agência de notícias oficial da União Soviética, divulgou esta declaração, em que afirma que a invasão foi feita a pedido dos "militantes e homens de Estado da República Socialista Checoslovaca" e que o motivo foi a ameaça que as "forças contra-revolucionárias", em conluio "com as forças exteriores hostis ao socialismo" faziam pesar sobre o regime socialista checoslovaco.

A agência Tass está habilitada a declarar que os militantes e os homens de Estado da República Socialista Checoslovaca pediram à União Soviética e aos outros Estados aliados que concedessem ao povo checoslovaco irmão uma ajuda urgente, nomeadamente a das forças armadas. Este pedido foi feito em razão da ameaça que as forças contra-revolucionárias, que entraram em conluio com as forças exteriores hostis ao socialismo, fazem pesar sobre o regime socialista actual na Checoslováquia e sobre a estrutura de Estado estabelecida pela Constituição.

Os acontecimentos na Checoslováquia e em torno deste país foram frequentes vezes objecto de trocas de pontos-de-vista entre os dirigentes dos países socialistas irmãos, incluindo os dirigentes checoslovacos. Estes países consideram unanimemente que o apoio, a consolidação e a salvaguarda das conquistas socialistas dos povos é o dever internacionalista comum de todos os Estados socialistas. A sua posição comum foi igualmente proclamada solenemente na Declaração de Bratislava.

O agravamento da situação na Checoslováquia atinge os interesses vitais da União Soviética e dos outros países socialistas, os interesses da segurança dos Estados da comunidade socialista. A ameaça contra o regime socialista na Checoslováquia é ao mesmo tempo uma ameaça contra as bases da paz europeia.

O governo soviético e os governos dos países aliados: a República Popular Búlgara, a República Popular Húngara, a República Democrática Alemã e a República Popular da Polónia, inspirando-se nos princípios da amizade indefectível e da cooperação, e conforme aos compromissos que decorrem dos acordos assinados, decidiram avançar de acordo com este pedido, e conceder a ajuda necessária ao povo irmão checoslovaco.

Esta decisão está de acordo completo com o direito dos Estados à autodefesa individual e colectiva, previsto nos acordos aliados concluídos entre os países socialistas irmãos. Ela está de acordo igualmente com os interesses vitais dos nossos países, na salvaguarda da paz europeia contra as forças do militarismo, da agressão e da vingança que conduziram mais de uma vez os povos da Europa às guerras.

As unidades militares soviéticas, assim como as dos países mencionados, entraram no dia 21 de Agosto em território checoslovaco. Retirar-se-ão da Checoslováquia a partir do momento em que a ameaça contra as conquistas do socialismo na Checoslováquia, a ameaça contra a segurança dos países da comunidade socialista for eliminada e que as autoridades legais julgarem que a presença destas unidades militares já não é necessária.

As acções empreendidas não se dirigem contra um Estado qualquer nem atingem os interesses de Estado de quem quer que seja. Elas servem os objectivos da paz e são ditadas pelo desejo de reforçá-la.

Os partidos irmãos opõem firme e resolutamente a sua solidariedade indestrutível a qualquer ameaça externa. Ninguém será jamais autorizado a arrancar um único elo da comunidade de Estados socialistas.

(...)

Neste dossier:

Primavera de Praga

Em 1968, a experiência checoslovaca de democratizar o socialismo, a Primavera de Praga, foi esmagada pela invasão dos tanques da União Soviética e de outros países do Pacto de Varsóvia. O Esquerda.net reuniu neste dossier artigos e reportagens a rememorar os acontecimentos e documentos da época, em particular um relato do português Flausino Torres, a carta de seis comunistas portugueses exilados criticando a invasão, e uma carta de Flausino Torres pedindo a suspensão de Álvaro Cunhal do PCP.

Cronologia

1968 foi um ano intenso: a guerra do Vietname mobilizava exércitos de combatentes e uma opinião pública quase planetária; em França, o mês de Maio assinalaria a criação de uma frente ampla de estudantes e operários na contestação da exploração capitalista, Israel e o Líbano envolveram-se num aceso conflito, Marcelo Caetano Caetano substituiu Salazar. E a Humanidade conseguiu colocar uma nave na órbita da lua. Em Agosto, os tanques soviéticos irrompiam em Praga para pôr fim aos ímpetos reformistas do Socialismo de Rosto Humano proposto por Alexander Dubcek. Fica uma breve cronologia dos acontecimentos de Praga.

Exposição: 40 anos depois, checos revivem repressão da Primavera de Praga

Uma selecção de histórias e objectos da colecção de Palach integram a exposição que o Museu Nacional da República Checa inaugurou esta semana. Num "flashback" da invasão, a exposição inclui um tanque de guerra T-54 soviético na frente de um imponente edifício, ainda equipadas com as metralhadoras de 1968.

Dubcek: Um homem de boa vontade isolado no reino dos cínicos

Uma retrospectiva da trajectória política de Alexander Dubcek feita pelo diário francês Le Monde na edição de 5 e 6 de Janeiro de 1969, onde o autor dá conta que «Dubcek era um herói, um "estratega genial" ou um novato e um fraco? As opiniões continuam muito diferentes.»

O buraco negro da memória

Nesta reportagem publicada há dez anos na revista Vida Mundial, Daniel Oliveira recorda os acontecimentos da Primavera de Praga e a "Revolução de Veludo", que ocorreu em 1989.

Só os tanques soviéticos pararam a participação popular

Em, 1968, a então Checoslováquia lançou o pânico no campo do "socialismo real". A reabilitação da crítica democrática e um verdadeiro levantamento pacífico viravam do avesso o bastião avançado do Pacto de Varsóvia na Europa. O Partido-Estado subvertia-se a partir de dentro. Uma revolução? Só os tanques soviéticos puderam parar a experiência de participação popular daqueles poucos meses.

"Estamos a ser ocupados pelos nossos fraternos aliados"

A 10 de Setembro de 1968, o diário conservador francês Le Figaro publica uma carta de uma mulher residente em Praga e militante do Partido Comunista Checoslovaco, um documento que revela bem o medo e a perplexidade que tomou conta das ruas da cidade, causados pela intervenção militar soviética. Mas não deixa também de mostrar diversas formas originais de resistência que uniram o povo contra os ocupantes. 

"Que Álvaro Cunhal seja suspenso"

No dia 5 de Novembro de 1968, Álvaro Cunhal reúne-se em Praga com os comunistas portugueses. A meio da reunião tensa, Cunhal expulsa da sala, aos gritos, o jovem Álvaro Bandarra, que procurava apresentar as razões para criticar a invasão soviética. Flausino Torres dirige-se então a Cunhal: " Jamais voltarei a apertar-te a mão! Mandaste sair aquele jovem. Pois tu é que deves abandonar o grupo, a direcção do grupo [o Partido]!(...)". Depois, escreveu uma carta ao Comité Central do PCP pedindo um inquérito e a suspensão de Cunhal do Partido.

Carta dos portugueses exilados na Checoslováquia sobre a invasão soviética

Seis comunistas portugueses exilados na Checoslováquia acompanharam com angústia a invasão soviética. "Sem esperar as decisões de dirigentes de qualquer escalão", relata Flausino Torres, "declarando-nos imediatamente pelo lado da justiça, cumprindo um dever à luz dos princípios." A carta seria seguida por uma segunda, datada de 16 de Setembro, que já reage à "decisão vergonhosa da Direcção do Partido Comunista Português".

"A invasão não teve o consentimento das autoridades constitucionais da Checoslváquia"

Esta declaração do presidente da República Socialista da Checoslováquia, general Ludvik Svoboda, aos microfones da rádio Praga no dia 21 de Agosto, deixa claro que não foram as autoridades constitucionais checoslovacas que fizeram qualquer pedido de intervenção militar, e chama os seus concidadãos a enfrentar o desafio e a manifestarem "a adesão ao socialismo, à liberdade e à democracia."

Declaração da agência TASS sobre a intervenção militar na Checoslováquia

No próprio dia 21 de Agosto, a agência Tass, a agência de notícias oficial da União Soviética, divulgou esta declaração, em que afirma que a invasão foi feita a pedido dos "militantes e homens de Estado da República Socialista Checoslovaca" e que o motivo foi a ameaça que as "forças contra-revolucionárias", em conluio "com as forças exteriores hostis ao socialismo" faziam pesar sobre o regime socialista checoslovaco.

Uma "Primavera" esmagada

A "Primavera de Praga" foi sufocada há 40 anos. As possibilidades de democratizar as "democracias populares" a partir do seu seio reduziram-se drasticamente; mas permanecerá o seu exemplo, como gesto colectivo de audácia e de combatividade, de entrega generosa, que encheu as ruas de Praga e de outras cidades e que levou muito mais longe a vontade de combater o estalinismo como forma pervertida e enquistada de um poder autoritário e burocrático.

"A Batalha de Praga", de Flausino Torres

A Primavera de Praga de 1968 foi testemunhada pelo historiador e militante comunista português Flausino Torres, pai do arqueólogo Cláudio Torres, que dava aulas na Universidade Karlova. Horrorizado, Flausino Torres assistiu aos tanques soviéticos esmagando a experiência de um "socialismo sem ditadura; socialismo com democracia, com minorias; socialismo sem censura à imprensa". É um extracto do relato que escreveu na altura, "A Batalha de Praga" que pode ser lido abaixo.