Os macacos, os ursos, os elefantes e os leões são os animais mais comuns em circos. São animais selvagens retirados violentamente do seu habitat de tranquilidade e liberdade, para ficarem confinados a jaulas e a obedecerem a práticas pouco naturais da sua espécie, até ao fim das suas vidas. Outros ainda, em Portugal na sua maioria, nascem já em cativeiro, nunca tendo conhecido a liberdade.
Os elefantes, por exemplo, são os mamíferos com maior cérebro. São emocionais, dóceis, altruístas e inteligentes, e são capazes de desenhar na terra e abrir caminhos em lugares aparentemente não acessíveis. Em constante movimento, caminham 30-40 kms por dia em busca de água a alimentos. A sua esperança média de vida é de 70 anos.
Os macacos, que na sua maioria vivem em árvores e em sociedade, possuem uma maior capacidade craniana tendo o encéfalo maior volume e massa, o que resulta numa complexidade neurológica, coordenação e faculdades psíquicas, como a capacidade de aprendizagem e adaptação, superiores às outras ordens do reino animal. Os macacos pertencem à ordem dos primatas, tal como nós, seres humanos, vivendo entre 10 a 15 anos.
Poderia continuar a descrever outras características de outros animais mas basta-nos pensar neles. Quando pensamos em ursos, pensamos numa imensidão de florestas e montanhas verdes onde vivem as suas vidas pacatas. Quando pensamos em leões, pensamos em selvas e savanas e como socializam ora tranquilamente ora de modo mais agressivo, conforme a sua natureza, culturas e rituais.
Não pensamos em ursos, macacos ou elefantes a dançarem nem em leões a saltarem por entre círculos em chamas. Nenhum destes comportamentos é normal em nenhum destes animais.
Muitos deles capturados de formas cruéis, passam o resto das vidas em jaulas pequenas, privados de liberdade, alimentação adequada e socialização. A mudança de habitat e a imposição de uma forma de vida contrária à sua, provoca-lhes muitas vezes distúrbios físicos e psicológicos.
Os “tratadores” dos animais de circo usam o método de Pavlov, ou seja, treinam-os usando o reflexo condicionado, através da dor e da privação de alimentos.
Os leões são chicoteados nas pontas dos dedos e no lombo até executarem a tarefa pretendida pelo domador. Durante o circo, o domador não chicoteia o leão, apenas usa o barulho do chicote, que animal reconhece e por condicionamento (através da dor) intimida-se e cede à vontade do domador.
Os macacos, por exemplo, são pontapeados e apanham estalos enquanto são treinados.
Os ursos são obrigados a pisar chapas de metal quentes ao som de determinada música. Durante o “espectáculo” os ursos ouvem a música que foi usada enquanto foram torturados e por reflexo movimentam-se, levantando as patas.
Não há muito tempo, nos Estados Unidos, a PETA levou a cabo uma investigação secreta nos bastidores do circo Ringling Brothers, um dos mais antigos do mundo, onde filmaram elefantes vitimas de maus tratos brutais. Os animais eram, e possivelmente ainda são, acorrentados e agredidos com ganchos de metal nas trombas, pernas e orelhas.
Tendo os circos um carácter itinerante, os animais são transportados de vila em cidade. A grande maioria dos vagões onde é feito esse transporte frequente e por longos períodos de tempo, são desprovidos de qualquer tipo de aquecimento, conforto ou até luminosidade.
A crueldade com que são obrigados a viver, em cativeiro e muitas vezes sozinhos, o modo como são constantemente transportados, privados de alimentação adequada e espaço necessário para se moverem conforme as suas necessidades, faz com que desenvolvam comportamentos agressivos e stressantes, como andar em círculos, entrando muitos deles em depressão profunda.
Em Portugal a ANIMAL e a Animal Defenders Internacional (ADI), publicaram um relatório resultante de uma exaustiva investigação aos Circos Portugueses. O relatório denuncia as condições em que vivem os animais nos circos em Portugal, desadequada à sua natureza, vitimas de violência física e psicológica, usada para os controlar, a falta de cuidados prestados pelos trabalhadores dos circos aos animais doentes e feridos, para além dos comportamentos perturbados e repetitivos que dos animais desenvolvem ao serem explorados e escravizados, para lucro de quem não tem pudor em viver às custa da exploração e do sofrimento.
Recordo o infeliz comentário de Vitor Hugo Cardinali, há tempos num programa da Sic “Aqui e Agora”, sobre o modo como vivem os seus animais, afirmando, com algum orgulho, que viviam em liberdade dois meses por ano.
Partindo do principio que o seu conceito de ano é o mesmo que o da maioria, estamos a falar de dois em doze meses. Ou seja, dez meses de enjaulamento.
Estas condições, que afectam as saúde física e psicológica dos animais, reduzem consideravelmente o teu tempo de vida. Os elefantes de circo, por exemplo, vivem 14-17 anos. Menos de metade do que da esperança média de vida dos que vivem em liberdade (70 anos).
Em 2009 a aprovação de um decreto de lei passou a proibir a compra de novos animais selvagens e a reprodução dos existentes em cativeiros nos circos.
Este decreto gerou a indignação de Miguel Chen e Victor Hugo Cardinali, também este domador, directores do Circo Chen e Circo Cardinali, respectivamente. Miguel Chien, com alguma ironia dizia não poder ir contra a natureza do animal se se quisesse reproduzir. Ora, tendo em conta que todo o uso de animais em circos vai contra a natureza próprio do animal, impedir que se reproduzam será um mal menor. Já Victor Hugo, justificava a sua frustração atacando o intelecto de habitantes do interior do país ao afirmar que estes não são capazes de apreciar um espectáculo livre de crueldade1.
Sabemos que ainda demorá algum tempo para que a inexistência da escravatura animal nos circos seja uma realidade, por alguns dos animais existentes só se virem a ser livres com a suas mortes e pelas violações à lei.
Cabe-nos então a cada um de nós, cidadãos e cidadãs, do litoral e interior, termos a coragem de acelerar o processo, denunciando e apelando ao boicote a este tipo de circo, rejeitando a violência existente naquele que é o espectáculo mais triste do mundo.
Links:
http://www.ringlingbeatsanimals.com/default.asp
http://www.animal.org.pt/pdf/relatorio_basta_de_sofrimento_nos_circos.pdf
http://diario.vlex.pt/vid/decreto-lei-setembro-65808909
1"Posso fazer algo como o Cirque do Soleil, que é feito para os intelectuais de Lisboa e do Porto. Mas experimentem levar o Cirque do Soleil a Portalegre e os meus amigos alentejanos vão perguntar 'que porra é essa?'. In DN 14 Outubro de 2009