Adelino Fortunato

Adelino Fortunato

Economista e professor universitário. Dirigente do Bloco de Esquerda.

Na última década o clima geopolítico e militar degradou-se como que indicando o caminho para uma nova era. Esta nova era ameaça ter consequências dramáticas no resto do século XXI em termos de perdas de bem-estar, de mortes e de conflitos. E, pior que tudo, o espectro de uma guerra nuclear.

Nos dias de hoje, o verdadeiro debate em matéria de organização política não é a favor ou contra a forma-partido, mas muito mais o de encontrar o tipo particular de partido para ajudar os movimentos sociais a crescer e a confluírem para objetivos comuns.

Um crash envolve sempre perdas e incerteza, mas o grande problema do capitalismo não é apenas esse, mas sim o de saber se existe ou não neste momento uma nova convergência de circunstâncias que permita ultrapassar as perspetivas depressivas recorrentes lucro.

Não é possível separar mecanicamente as questões políticas das questões de organização. Só que esse princípio tem de ser pensado à luz das transformações do capitalismo contemporâneo, das mudanças nas classes sociais e do balanço das experiências de dois séculos de história.

Se o discurso de combate ao capitalismo não promover a articulação destas diferenciações num projeto global, tornar-se-á o campo de uma política moderada, com pouca profundidade crítica em relação ao sistema. Será (é) a era da política moderada.

A esquerda, para ter futuro, precisa de uma nova utopia adaptada às necessidades do século XXI, evitando repetir erros e apontando para uma alternativa socialista ao capitalismo que colha o melhor do balanço das experiências do passado.

Sem perspetiva histórica, sem projeções de futuro a política degenera no simples cálculo administrativo e no jogo das ambições. É o colapso do pensamento estratégico, da articulação de vontades e da dimensão ética no combate às injustiças.

A derrota da esquerda não é simplesmente uma derrota eleitoral, conjuntural, recuperável no curto prazo, mas sim uma confirmação da sua dificuldade em se bater por um projeto de sociedade alternativo para superar duradouramente os flagelos que o capitalismo impõe hoje à maioria da população mundial.

A esquerda para voltar a ganhar precisa de fazer reviver uma chama que se esbateu muito nos últimos tempos e de trazer para o debate público uma novidade mobilizadora. Essa novidade deveria ser alavancada na ideia de unidade da esquerda para derrotar a direita.

2024 poderá ser um ano de viragem, ou não. Resta à esquerda ter a inteligência de saber lidar com as expectativas de milhões de portugueses e portuguesas que querem comemorar os 50 anos do 25 de Abril com esperança.