A causa palestiniana é uma das mais justificadas lutas de um povo, senão a mais baseada e de há mais tempo, no chamado “direito internacional”, mas que em contrapartida é a que menos se concretiza. Pelo contrário, é aquela que, paulatinamente, mais é destroçada e reprimida pelo estado colonizador, Israel, com a cumplicidade das potências que o sustentam (EUA em primeiro lugar) e a impotência ou o cinismo da restante “comunidade internacional”.
Estado terrorista
São exemplo cruel desta realidade os assassínios que o exército israelita está cometendo nestes dias contra as manifestações pacíficas dos habitantes de Gaza junto à fronteira com Israel em lembrança do Dia da Terra, assim chamado por, em 1948, com a criação artificial e violenta do estado israelita, terem sido expulsos mais de 700 000 palestinianos das terras em que viviam desde tempos ancestrais.
Nos 70 anos desse trágico acontecimento, quando os expulsos já são mais de 5 milhões de refugiados nos países vizinhos, a população palestiniana de Gaza decidiu manifestar-se todas as sextas-feiras até 14 de Maio, data em que o governo israelita pretende instalar a sua capital em Jerusalém, apoiado na determinação de Trump.
No passado dia 30 de Março foram assassinados 19 civis e feridos 1500 pelos tiros de bala real e pelo gás lacrimogéneo lançados do outro lado da fronteira pelas tropas israelitas contra 30 mil manifestantes palestinianos. Ontem, dia 6 de Abril, perante novos protestos, foram mortos mais 7 pessoas e feridos mais de 1000, pelo lançamento de bombas de drones israelitas. Enquanto os manifestantes mais não fazem do que, do outro lado da fronteira, atirarem pedras ou queimarem pneus, numa vã intenção de se protegeram dos ataques dos soldados israelitas equipados com escudos e armamento terrestre e aéreo do mais sofisticado.
Até 14 de Maio quantos assassínios mais e quantos feridos vão ser provocados contra a população em luta por uma pátria independente e pelo direito ao retorno às suas terras? Afinal, uma causa que é validada por inúmeras resoluções da ONU, protestos e apelos de inúmeros países e instituições, para que Israel ponha fim à sua política colonizadora e de apartheid e respeite aquelas resoluções.
Impunidade absoluta
Porquê tanto Direito Internacional se traduz na prática no contínuo aumento dos crimes e da opressão sionista?
Em primeiro lugar, porque nos regimes burgueses, mais ou menos musculados, Democracia, Estado de Direito e Direitos Humanos, só valem enquanto servem e não são grande obstáculo ao “normal funcionamento” do poder capitalista. Se o são, passam a permanecer apenas como uma casca mistificadora, ou são até deitados fora, como se vê agora nos ensaios trumpistas e da extrema-direita um pouco por todo o mundo.
O poder israelita há muito deitou fora essa casca mistificadora. Os argumentos com que se justifica estão ao nível da propaganda daqueles que gasearam milhões de judeus em nome da pureza e da superioridade da raça, acrescentadas agora por um fundamentalismo religioso judaico e pela prática de um apartheid ainda mais radical do que o do regime branco sul-africano. É a democracia do terror militar e colonialista contra os indígenas por disciplinar e civilizar. É a descarada mentira do Capital e da geoestratégia imperialista contra a realidade verdadeira das vítimas e dos oprimidos.
Em segundo lugar, porque por cima da solidariedade generalizada dos diferentes povos árabes do Médio Oriente, se impõem os jogos dum apoio de faz de conta pela maioria dos governos da região movidos sobretudo por interesses mesquinhos de poder regional, ou de sobrevivência, e de conluio com as grandes potências capitalistas. Em que os EUA procuram manter a sua hegemonia mundial, tendo como um dos meios mais importantes para tal o ascendente sobre esses governos ou, em desespero de causa, provocando a desordem e a desarticulação desses países. Para isso, contam em primeiro lugar com a política e a acção terrorista do estado de Israel, assim como para o esforço de manterem a hegemonia que hoje é disputada, também no Médio Oriente, pelos poderes emergentes da China e sobretudo da Rússia.
Finalmente, porque na esquerda, mesmo que sinceramente empenhada na solidariedade com a causa palestiniana, permanece na luta pela emancipação dos povos contra o imperialismo, ou uma visão maniqueísta de ver naquelas disputas uma luta entre o Mal e o Bem, ou então uma visão que muito analisa mas que pouco sai da eterna dúvida sistemática para a acção.
Unidade e independência internacionalista
Em minha opinião, no que cabe à esquerda, em particular em Portugal, para dar mais força ao apoio à luta do povo palestiniano é urgente a articulação daquelas diferentes visões, bem como dos diversos movimentos de solidariedade, em acções conjuntas de rua e outras, que ganhem a capacidade de estar presente em continuidade no espaço público nacional.
Para esta luta, como para aquela mais geral contra o imperialismo global, é indispensável que essa acção comum dê corpo a um movimento próprio dessas esquerdas, independente dos equívocos e da conciliação social-democrata, ainda que sabendo atraí-la para o apoio a iniciativas concretas de confronto aberto com a política e os argumentos sionistas. Buscando desmistifica-los, assim como ao cinismo e ao oportunismo político e económico das direitas serventuárias de Israel e do imperialismo americano, que hoje predominam na opinião pública nacional.
A causa palestiniana, causa maior da luta pela liberdade e emancipação dos povos, ainda tão fraca na sociedade portuguesa, merece esse caminho de humildade e comunhão internacionalista.
Imagem retirada do sítio “Grupo Acção Palestina”. Outros sítios/movimentos em Portugal: Comité de solidariedade com a Palestina; MPPM – Movimento Pelos Direitos do Povo Palestino e Pela Paz no Médio Oriente; CPPC – Comité Português para a Paz e Cooperação; e muitos outros de outros países…
Texto de Vítor Ruivo, publicado em acontradicao.wordpress.com