Mortes na Europa devido às alterações climáticas triplicaram na onda de calor de junho

10 de julho 2025 - 14:13

Cientistas analisaram efeitos da onda de calor entre 23 de junho e 2 de julho em doze cidades europeias, incluindo Lisboa, e atribuíram mais de 1.500 mortes a alterações climáticas causadas pela ação humana.

PARTILHAR
prédios e sol
Foto de Santiago Arias/Flickr

“As alterações climáticas triplicaram as mortes relacionadas com o calor na onda de calor europeia do início do verão”. Este é o título do relatório dos cientistas do Graham Institute do Imperial College de Londres, que analisou o efeito da onda de calor da última semana de junho e dos primeiros dias de julho em doze cidades europeias.

A onda de calor encerrou um mês onde muitos recordes de temperaturas máximas foram batidos na Europa e alertas vermelhos emitidos pelos institutos meteorológicos de vários países, a par de incêndios florestais nos Balcãs e na Grécia. Nas últimas décadas tem sido a Europa ocidental a registar o maior ritmo de aumento das ondas de calor no verão e o maior número de excesso de mortes relacionadas com o calor, que atingiu mais de 60 mil pessoas em 2022. Estudos anteriores apontavam para metade destas mortes serem atribuídas às alterações climáticas por ação humana e que em 2050, num cenário de aumento da temperatura de 2ºC em relação ao período pré-industrial, o calor extremo irá afetar 163 milhões de pessoas, o dobro das que já são afetadas hoje.

Neste estudo, os cientistas concluem que o número de mortes excessivas devido às alterações climáticas na recente onda de calor tenha ultrapassado as 1.500, triplicando o número de mortes esperadas devido a ondas de calor. O fenómeno deixou de ser raro e deve ocorrer a cada dois a cinco verões. A exceção, apontam, será Lisboa, onde este calor extremo é ainda raro e previsível apenas a cada cem anos. Assim, à exceção da capital portuguesa, sem as alterações climáticas provocadas pela ação humana, nomeadamente através da desflorestação e queima de combustíveis fósseis, este tipo de ondas de calor ficariam 2ºC a 4ºC abaixo das temperaturas que agora se registaram.

Contas feitas às 2.305 mortes provocadas pela onda de calor nestas doze cidades onde vivem mais de 30 milhões de habitantes - Londres, Paris, Frankfurt, Budapeste, Zagreb, Atenas, Roma, Milão, Sassari (na ilha da Sardenha), Barcelona, Madrid e Lisboa -, os cientistas atribuem 65% destes óbitos em excesso às alterações climáticas provocadas por ação humana. A grande maioria do total de mortes em excesso - cerca de 80% - foram de pessoas com mais de 65 anos, com as maiores de 85 anos a representarem quase metade do total. A cidade mais atingida em números absolutos foi Milão, com mais de 90% das 499 mortes atribuídas a essa causa. Lisboa foi a cidade onde esta proporção foi menor, com a estimativa a apontar 92 mortes em excesso durante a onda de calor, das quais 21 podem ser atribuídas às alterações climáticas. A maior proporção, de 92%, pertenceu a Madrid, onde o estudo atribui às alterações climáticas por ação humana 108 das 118 mortes.

O método para atribuir estas mortes às alterações climáticas por ação humana passa por recolher os dados da mortalidade geral e suas causas, aplicando em seguida métodos epidemiológicos a partir das intensidades de calor factuais e contrafactuais para cada cidade, calculando por fim a diferença no número de óbitos. Entre as limitações do estudo está naturalmente o facto de não existirem ainda dados concretos sobre o número de mortes registadas no período em análise, tendo sido assumida uma taxa de mortalidade constante dos anos anteriores, o que poderá levar a uma subestimação do número de mortes realmente ocorridas nas últimas semanas naquelas cidades.

“Até que o mundo deixe de queimar combustíveis fósseis, estes fenómenos tornar-se-ão mais quentes, mais frequentes e mais duradouros, aumentando assim também os encargos para os serviços de saúde pública decorrentes dos impactos na saúde relacionados com o calor e aumentando o risco de se atingirem os limites de adaptação”, alertam os investigadores que assinam o estudo e que além do Imperial College incluem cientistas da instituto meteorológico neerlandês, da Escola de Medicina e Higiene Tropical de Londres, e da universidade de Berna, na Suíça.

Dado que as cidades e os centros urbanos são focos de risco de calor, os investigadores recomendam que “o planeamento urbano deve centrar-se em medidas para reduzir o efeito de ilha de calor urbana, como o aumento dos espaços verdes e azuis de arrefecimento e a melhoria do isolamento das casas”, a par de medidas de adaptação “mais pontuais, como sistemas de apoio formalizados e centros de arrefecimento” para “oferecer um alívio imediato do calor extremo aos mais vulneráveis”.