Morreu Gorbachev, o último dirigente da URSS

30 de agosto 2022 - 22:14

Liderou o país entre 1985 e 1991, implementou um conjunto de políticas reformistas na tentativa de salvar o regime burocrático soviético, mas estas não impediram o seu colapso e o desmembramento do país. Notícia em atualização.

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Gorbavech em 2016. Foto de SERGEI ILNITSKY/EPA/Lusa.
Gorbavech em 2016. Foto de SERGEI ILNITSKY/EPA/Lusa.

Segundo as agências noticiosas russas, Tass, RIA Novosti e Interfax Mikhail Gorbachev, o último dirigente da URSS, faleceu esta terça-feira no Hospital Clínico Central de Moscovo.

Entre 1985 e 1991 ocupou o cargo de secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética e liderou o país entre 1988 e 1991. Implementou as políticas denominadas Glasnost e Perestroika na tentativa de reformar o sistema burocrático soviético, mas estas não impediram o desmembramento da URSS e o fim do regime.

Gorbatchev nasceu em Privolnoye a 2 de março de 1931. Oriundo de uma família camponesa, teve vários trabalhos, até que se licenciou em Direito pela Universidade de Estado Lomonossov em 1955. Na universidade, junta-se primeiro ao Komsomol, a organização de juventude do PCUS, e em seguida ao próprio partido onde prossegue uma carreira fulgurante no seio da conservadora e envelhecida estrutura do PCUS.

Em 1962, torna-se dirigente na cidade de Stavropol, aproveitando para estudar no Instituto de Agronomia da cidade. Sob o beneplácito do chefe do KGB, Iouri Andropov e do seu mentor Mikaïl Soulov, ascende ao Comité Central em 1971 . Em 1978, tornou-se secretário do Comité Central do partido e assume a pasta da agricultura. No ano seguinte entrou no grupo restrito do seu Politburo com “apenas” 49 anos.

Acaba por chegar à liderança da URSS aos 54 anos, na sequência da morte de Konstantin Chernenko e fica à frente de um país esgotado pela guerra do Afeganistão, pela corrida aos armamentos, pela queda do preço do petróleo de que é grande exportador e pelos impasses da sua política económica.

A primeira medida que o torna conhecido é a proibição parcial de venda de álcool e a campanha contra este. A “lei seca” de Gorbatchev implicou aumentos de preços nas bebidas alcoólicas, limitações nos pontos de venda, nas alturas do dia e nas quantidades vendidas, proibição de consumo em lugares públicos e censura às cenas de filmes que envolviam este tipo de bebidas.

Em início de mandato, cabe-lhe também lidar com o mais grave acidente nuclear, o desastre na Central de Tchernobyl, na Ucrânia, ocorrido depois do acidente da noite de 25 de abril de 1986, cuja radioatividade se espalha pela Europa.

Mas o seu nome é mais lembrado pelas políticas de denominadas Glasnost e Perestroika. A Glasnost, “transparência”, implicava o reconhecimento da liberdade de expressão e de associação. A Perestroika, “reconstrução”, dizia respeito ao conjunto de política económicas de aprofundamento da liberalização económica.

Suspendeu ensaios nucleares, foi o proponente da “opção zero” sobre armas nucleares, apresentada ao presidente dos EUA, Ronald Reagan, que a recusa. Apesar disso, Gorbachev insiste no desarmamento até que consegue, em 1987, um acordo para uma redução para metade nos arsenais nucleares. Em 1990, ser-lhe-á atribuído o Prémio Nobel da Paz pelo seu papel no fim da Guerra Fria.

A 15 de maio de 1988, anuncia a retirada das forças militares soviéticas do Afeganistão. Depois de um longo conflito, as tropas saem finalmente do país no ano seguinte.

Em 1989, cai o muro de Berlim, momento simbólico de uma vaga de mudança que percorria o leste europeu. A separação RDA/RFA tinha os dias contados. Depois, é a própria União das Repúblicas Socialistas Soviéticas que acaba com a saída de Gorbatchev.

O processo interno que conduz a este desfecho passou pela criação de uma Assembleia Legislativa com dois terços eleitos por sufrágio direto. Pela primeira vez são autorizados candidatos da oposição ao PCUS que ganha com uma maioria avassaladora, 88%, mas são os conservadores no seio do partido que estarão em maioria no órgão.

Segue-se, em março de 1990, uma reforma constitucional na qual surge o papel de presidente da URSS, cargo que desempenhará até esta entidade deixar de existir.

Entretanto, Boris Ieltsin vai-se perfilando como alternativa. A Rússia adota uma política de soberania, isto apesar de no referendo de 17 de março de 1991 a manutenção na URSS ter ganho por ampla maioria (76%). Em junho de 1991, este ganha a presidência da entidade russa que pertencia ainda à URSS com 57% dos votos.

Em agosto, acontece um golpe da linha dura do PCUS anti-Gorbatchev para tentar deter a assinatura do tratado de uma nova União que iria substituir a URSS. Enquanto Mikhail está em prisão domiciliária na casa de verão, Boris protagoniza a oposição. O golpe acaba por falhar e supostamente Gorbatchev poderia retomar as suas funções. Mas já nada é igual. As atividades do Partido Comunista da Rússia vão ser suspensas e em novembro este é dissolvido. A Comunidade de Estados Independentes substitui a URSS a 21 de dezembro de 1991, quatro dias mais tarde Gorbatchev demite-se de presidente da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas que deixa de existir.

Gorbatchev, celebrado no mundo ocidental, acaba por ser uma figura irrelevante politicamente no seu país apesar de várias tentativas de criação de partidos, movimentos e outras iniciativas. Em junho de 1996 é candidato à presidência da República da Federação da Rússia. Tem apenas 0,5% dos votos.