Em comunicado, a semana passada, a Comissão Europeia divulgou uma lista “infrações” de leis e normas europeias atribuídas aos países-membros da União Europeia. No que toca a Portugal, uma destas diz respeito às falhas em avaliar “adequadamente os planos e projetos que podem ter um impacto significativo nos sítios Natura 2000”, conforme exigido pela Diretiva Habitats”.
Sublinha Bruxelas que “os planos e projetos só podem ser autorizados, sujeitos a determinadas isenções se não prejudicarem a integridade do sítio Natura 2000”. Estas são áreas especialmente designadas para conservar habitats e espécies selvagens raras, ameaçadas ou vulneráveis. Só que “contrariamente à Diretiva e à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, a legislação portuguesa permite ter em conta medidas compensatórias por danos esperados na avaliação de se um projeto é ou não prejudicial, comprometendo assim o resultado da avaliação do efeito significativo nos sítios Natura 2000”
Ou seja, a Diretiva Habitats estipula claramente que “se um projeto fere um local da rede Natura 2000, não pode ser aprovado simplesmente na base de que o estrago será compensado”. A lei portuguesa, pelo contrário, aceita supostas “medidas compensatórias” que minam assim a avaliação ambiental.
A Comissão nota ainda que já tinha enviado uma carta de notificação formal a Portugal sobre isto em maio de 2024. Mas desde então “Portugal não resolveu totalmente as queixas”. Este novo parecer fundamentado dá dois meses ao Governo “para responder e tomar as medidas necessárias”. Se nada for feito, avisa-se, “a Comissão poderá decidir remeter o processo para o Tribunal de Justiça da União Europeia”.
Uma corrida ao ouro em detrimento das zonas protegidas?
Sobre este tema, este domingo, o Jornal de Notícias escreve que “a corrida ao ouro, e à prata, entre outros, está lançada em Portugal e quase sem travões para zonas protegidas, como o Parque de Montesinho” em Trás-os-Montes ou as Zonas Especiais de Conservação “Serra de Monfurado” e “Cabrela”, no Alentejo.
O diário cita Nuno Forner, especialista em minas da associação ambientalista Zero, que considera que a lei portuguesa “deixa muitas válvulas de escape para se poder avançar de forma um bocadinho discricionária”, defendendo que “a lei devia ser explícita e dizer que em áreas protegidas não vamos autorizar exploração mineira”. Para ele, é “um contrassenso” haver áreas protegidas e depois serem atribuídos direitos para prospeção e pesquisa “que podem futuramente levar a exploração com impactos muito significativos”.
No total, há em Portugal 123 contratos de concessão mineira ativos, a que se juntam 63 pedidos de prospeção, 21 contratualizados e 42 em publicação ou avaliação. Estes incidem sobre cobre, ouro, prata mas também terras raras como o nióbion, antimónio, tântalo e Tripoli, para além do volfrâmio e cobalto. Sobre este último há um pedido de prospeção que abrange 105 km2, nos concelhos de Vinhais e Bragança, parte integrando a Zona Especial de Conservação Montesinho/Nogueira.
Estas zonas são classificadas na Rede Natura 2000. E o caso de Montesinho/Nogueira não é isolado. Também há um projeto de prospeção de 70 km2 que engloba a ZEC de Valongo e um pedido relativo a uma área de 447,5 km2 que abrange os concelhos de Montemor-o-Novo, Évora, Viana do Alentejo e Vendas Novas, atingido duas ZEC, a de Monfurado e a de Cabrela.
A área das Covas do Barroso, classificado como Património Agrícola Mundial da FAO, também não é poupada. Para além do projeto de exploração de lítio da Savannah Resources, com uma área total de cerca de 6km2, há mais cinco concessões, todas com Estudo de Impacto Ambiental condicionado mas prontas para começar exploração.
Outras infrações ambientais assinaladas a Portugal: as licenças da água e as emissões
No mesmo documento da Comissão Europeia, assinala-se a abertura de um processo de infração a Portugal por “falhar em transpor corretamente a Diretiva Quadro da Água”, “incluindo a obrigação de realizar revisões periódicas das licenças de utilização de água”.
Lembra-se que “a plena implementação dos padrões de qualidade da água da UE é fundamental para proteger a saúde humana e o ambiente” e que os Estados-Membros “são obrigados a rever e atualizar periodicamente estas medidas de controlo, incluindo quaisquer licenças concedidas, para determinar se ainda atingem os seus objetivos”. Mas em Portugal as revisões ocorrem “no final da validade da autorização, que pode ser até aos 75 anos”. Um período considerado demasiado longo para cumprir o propósito de uma revisão periódica”.
Sobre este aspeto, o Governo fica com dois meses para corrigir as deficiências levantadas pela Comissão”, se tal não for cumprido seguir-se-á a segunda fase, o parecer fundamentado, e se este não for acatado o caso pode ir também parar a tribunal.
Portugal, Bélgica, Bulgária, República Checa, Estónia, Espanha, Letónia, Hungria e Polónia também são notificados por não transporem ou transporem apenas parcialmente para a legislação nacional a Directiva 2023/959 relativa ao Sistema de Comércio de Licenças de Emissão da UE. O prazo para o fazerem terminou a 31 de dezembro de 2023.