Bloco quer “planificação ecológica e industrial em vez de negociatas de ocasião”

04 de março 2024 - 23:41

Em Setúbal, Mariana Mortágua defendeu o fim do regime dos Projetos de Potencial Interesse Nacional (PIN), pois considera-os “um convite à corrupção e ao tráfico de influências".

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Mariana Mortágua.
Fotos de Ana Mendes.

No comício desta segunda-feira em Setúbal, Mariana Mortágua referiu-se à  economia de "favorecimento, rentismo, predação e preguiça" que "atropelou o país e o distrito de Setúbal”.

Nos últimos 30 anos, em que se ouviu “sempre a mesma ladainha: baixem os impostos que a economia cresce”, a economia portuguesa “foi destruída, privatizada e desmantelada”. “A economia portuguesa foi um joguete nas mãos dos donos disto tudo. Em Portugal só floresceram os bancos e as seguradoras, a construção e o imobiliário, e o turismo desenfreado”, acrescentou.

A coordenadora do Bloco lembrou a criação, por José Sócrates, em 2005, dos Projetos de Potencial Interesse Nacional (PIN), que “foram e são uma desgraça para Portugal e mereceram sempre a oposição” do seu partido. A este respeito, deu o exemplo do estatuto PIN atribuído por Manuel Pinho aos projetos de Ricardo Salgado na Comporta ou de outros PIN como o Tróia Resort (grupos Sonae e Amorim) e herdades da Comporta (Grupo Espírito Santo), Costa Terra e Pinheirinho (Grupo Pelicano).


Ver fotogaleria: Arruada e comício em Setúbal


Mas apesar “de todas as denúncias - nos processos do BES e noutros -, mesmo depois de exposta a promiscuidade e até as suspeitas de corrupção nestes processos, continuaram a ser lançados novos projetos PIN”, frisou Mariana Mortágua.

Recordando que António Costa “também nunca quis acabar com este regime”, a líder bloquista apontou o mais recente, e “talvez o mais espampanante” PIN no distrito de Setúbal: o Data Center de Sines.

De qualquer forma, os PIN “estão um pouco por todo o país, e é sempre misterioso e ainda mais difícil identificar qual é o interesse nacional que há em qualquer deles”, continuou. Exemplo disso é o Zmar, em Odemira, que recusou abrigar trabalhadores migrantes em plena pandemia, ou o hotel da Douro Azul, em Mesão Frio, que pode resultar na exclusão do Alto Douro da lista de património mundial da Unesco. Ou ainda a exploração mineira em cima de aquíferos.

“Como já se percebeu, o interesse nacional está no avesso dos PIN. Decretar que há investimentos que devem ser privilegiados com prazos especiais, que ultrapassam leis e regulamentos, enquanto outros são obrigados a ficar na fila de espera, isso é um convite à corrupção e ao tráfico de influências”, alertou.

Mariana Mortágua defendeu que, “por todas as razões, da economia à justiça, o regime de exceções para projetos PIN tem mesmo de acabar”. Já se provou o que são: os PIN são a opacidade da decisão, são economia de especulação, são destruição ambiental máxima com salários mínimos”, enfatizou.

Conforme explicou, o que o Bloco quer é “menos interesses económicos no Estado, e melhor Estado para a economia”. E o compromisso do partido é claro: “planificação ecológica e industrial em vez de negociatas de ocasião”.

A quem se tem sentido incomodado nesta campanha, Mariana deixou uma mensagem clara “para que ninguém se engane”: O Bloco “não hesita em falar dos interesses mais poderosos, a começar pelos do imobiliário e da especulação” e “não desiste de expor o seu apoio e financiamento aos partidos que lhes querem fazer favores”.

Se argumentos faltassem para votar Bloco, a sua líder lembrou que o voto neste partido é um voto “para uma maioria que corrija o desastre da maioria absoluta” e “para vencer a direita e a extrema direita, uma viragem que afaste os continuadores de Cavaco, Barroso e Passos, o PSD”.

É possível defender Portugal dos tubarões”

Joana Mortágua

Na sua intervenção, Joana Mortágua lembrou a música da Garota Não que fala sobre os lucros extraordinários da Galp e refere que “somos acionistas sem ações”, num “país tão bom para tubarões”.

Repudiando o “sistema de privilégio em que borlas fiscais e favores económicos são disfarçados de mérito”, a dirigente bloquista sublinhou que “é possível defender Portugal dos tubarões”.

“E não, não estamos à espera do PS para nada disto. Nós vamos impor ao PS a mudança que este país pede e de que este país precisa. Porque uma coisa é certa, no dia 10 de março o voto de qualquer um de vós vale tanto quanto o de um qualquer tubarão, tenha ele os milhões que tiver”, afirmou Joana Mortágua.

A cabeça de lista do Bloco por Setúbal reforçou que, “no próximo domingo, não há um grande patrão que tenha mais poder do que o trabalhador a quem paga o salário mínimo, não há um machista que tenha mais poder do que uma mulher, não há um milionário da saúde com mais poder do que um enfermeiro que luta pelo SNS”.

É preciso acabar com dois monstros na Europa”

Luís Fazenda

O dirigente do Bloco Luís Fazenda falou de duas causas muito importantes, que “são contemporâneas da formação e desenvolvimento político” do Bloco.

Por um lado, o combate à precariedade. Sobre essa matéria, Luís Fazenda lembrou o projeto que o Bloco fez aprovar, logo em 2002, para reduzir a duração máxima de contratos a prazo para um ano. Mas o dirigente bloquista destacou que a precariedade não é só laboral, ela é também habitacional, ou dos serviços públicos, e é preciso combatê-la em todas as suas vertentes.

Num outro plano encontra-se a segunda causa: lutar por uma outra Europa.

E, para esse efeito é preciso, de acordo com Luís Fazenda, destruir “dois monstros”: o Pacto das Migrações, que agrava a Europa Fortaleza e é tão estimado pela a extrema-direita que persegue as pessoas migrantes; e o Tratado Orçamental, que impõe “medidas restritivas do ponto de vista do investimento público”. A propósito deste último, o dirigente do Bloco alertou que o mesmo é um entrave a uma transição energética socialmente justa.

"O Bloco vai mostrar que a vida independente, que uma vida boa, pode ser alcançada para qualquer pessoa"

Diana Santos

A intervenção da candidata Diana Santos, ativista pelos direitos humanos e civis das pessoas com deficiência, começou com um poema de Natália Correia e a evocação dos 50 anos do 25 de Abril, uma revolução "que ainda não chegou a todas as dimensões das nossas vidas, muito menos a todas as vidas do nosso país". E deu o exemplo "daqueles e daquelas que respiram em lares, daqueles que independentemente da idade, vivem presos em privação completa e prisão perpétua de direitos humanos, não por terem cometido um crime, mas por terem nascido ou crescido com uma deficiência", referindo-se à política de institucionalização com que o Estado gasta milhares de euros mensais por pessoa para financiar lares.

Contra um "lóbi da institucionalização muito difícil de quebrar" e que a direita "gosta de alimentar" com o seu discurso que varia entre o "assistencialismo e a meritocracia", mas que o PS também alimenta "à revelia dos compromissos assumidos na Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência pelo Estado português", é o Bloco de Esquerda que diz não a "esta violação de direitos humanos, reiterada e consentida". Para Diana Santos, é a força do Bloco, o único partido "a ter pessoas com deficiência visível no Parlamento", que irá mostrar "que direitos humanos não se compram nem se vendem, que a vida independente, que uma vida boa pode ser alcançada para qualquer pessoa e que o Estado não tem desculpas" para continuar a falhar nas obrigações a que se comprometeu internacionalmente.

Lembrando algumas conquistas políticas do partido, como as quotas no acesso ao emprego, a isenção de propinas ou a equiparação das bolsas dos atletas paralímpicos, Diana Santos afirmou que é preciso ir mais longe, alargando os serviços de apoio à vida independente, a diminuição da idade de reforma, a equiparação das prestações ao salário mínimo, ou a generalização da assistência pessoal como garantia da vida independente.

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