Sociedade

Académicos manifestam solidariedade com denúncias de assédio, CES suspende visados

14 de abril 2023 - 19:40

150 académicos, cientistas, artistas, escritores e profissionais da cultura assinam o manifesto "Todas Sabemos", que também denuncia a cultura hierárquica das universidades.

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Foto do CES.

Na sequência das denúncias de casos de assédio sexual no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, mais de 150 académicos, cientistas, artistas, escritores e profissionais da cultura escreveram o manifesto Todas Sabemos em “total solidariedade” com as três autoras do capítulo de livro que revelou o caso, intitulado The walls spoke when no one else would.

O texto publicado no jornal Público considera que “os casos denunciados são apenas a ponta do icebergue” e é assinado por pessoas como Filipa Lowndes Vicente, António Araújo, Andrea Peniche, Diogo Ramada Curto, Filipa César, João Pedro George, Leonor Rosas, Marta Mestre, Miguel Vale de Almeida, Luísa Semedo, Joacine Katar Moreira, Teresa Summavielle, André Barata, Catarina Mourão, Bruno Góis, Ana Balona de Oliveira, Nuno Domingos, Maria do Carmo Piçarra, Joana Craveiro, Filipa Melo, Susana Moreira Marques. Há ainda subscritores fora do país como Fabián Cevallos Vivar, Giulia Strippoli, Hillary Owen, Julia Suárez-Krabbe ou Lee Douglas e Lucas Camargo de Barros.

Para além de manifestarem apoio a todas as vítimas “de abusos de poder e outras formas de violência em contexto académico e fora dele”, incluem no final o contacto [email protected] para recolher mais subscrições e denúncias de assédio. Ressaltam, contudo, “a necessidade da presunção da inocência para uma investigação de justiça em democracia, seja para pessoas denunciantes ou acusadas”. Também critica a reação dos “presumíveis abusadores” que demonstram “a falta de reconhecimento do problema” e “apesar de serem referências na academia para o escrutínio de relações assimétricas de poder no mundo, não fazem a sua autocrítica”.

Considera-se que o processo de denúncia “não é difamação” mas constitui “uma crítica a dinâmicas institucionais sistémicas, comuns dentro e fora da academia”. E aproveitam para fazer a crítica do “extrativismo intelectual (a prática de plagiar ou reproduzir o trabalho de outrem sem citar, apresentando-o como seu)”, corrente num meio marcado por “divisões de classe, género e raça, em que a precariedade é regra e há pessoas “dependentes da validação da instituição para a sua segurança financeira e até migratória” pelo que “obliterar os abusos de que são vítimas”.

O texto pretende ainda separar a realidade do CES e as “graves falhas” da sua direção. Pretende-se por outro lado construir uma universidade “pluridiversa, paritária, interseccional e emancipatória”, que “não receie o modus operandi feminista, na construção de pessoas libertas dos constrangimentos impostos por papéis e expectativas prescritivas de género, classe, raça, capacitismo ou preceitos culturais”. Isto é “uma universidade que rompa com a tradição (que vem de um lugar ‘de cátedra’ e não de escuta) da cultura dos ‘doutores’ e da reprodução dos patriarcas geniais e das elites”.

Os signatários exigem ao Governo a criação “no imediato de condições para que todas as instituições de ensino superior tenham um mecanismo de denúncia anónima de situações de assédio sexual e moral, garantias de proteção à vítima e comissões independentes e não-endógenas” para prevenir, avaliar denúncias, instruir processos e sancionar quem o deva ser. Pede-se ao Governo e à Fundação para a Ciência e a Tecnologia que “se pronunciem e agilizem recursos” de forma a “aprofundar o enquadramento legal para este tipo de casos nos estabelecimentos de ensino e investigação superior e que contemplem a necessária obrigatoriedade de códigos e regulações semelhantes”.

Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins suspensos

Entretanto esta sexta-feira, a direção do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra anunciou a suspensão “de todos os cargos que ocupavam” dos dois professores acusados de assédio e abusos sexuais, Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins. Num segundo comunicado, esclarece que "a suspensão dos mesmos afeta o exercício de cargos de responsabilidade e/ou representação institucional, tendo sido solicitada pelos próprios".

A suspensão durará enquanto a investigação por uma comissão independente decorrer. Depois dos visados reconhecerem que o texto, que não identifica a instituição nem apresenta nomes, se referia a eles, a estrutura académica reconheceu também que os abusos “terão ocorrido no âmbito do CES”.

Todas Sabemos, quem assina

Conhece aqui a lista completa completa das pessoas que assinam o manifesto Todas Sabemos: