Diagnóstico negativo de coronavírus em Bolsonaro provoca dúvidas

13 de March 2020 - 22:05

Secretário de comunicação que viajou com presidente do Brasil para os EUA está infetado; Fox News sustenta que filho de Bolsonaro informou que teste deu positivo, mas depois voltou atrás. Bolsonaro dissera antes que crise do coronavírus é fantasia. Por Luis Leiria.

porLuís Leiria

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Bolsonaro e o ministro da Saúde de máscara. Antes, o presidente dissera que coronavírus era fantasia
Bolsonaro e o ministro da Saúde de máscara. Antes, o presidente dissera que coronavírus era fantasia

Depois de muita expectativa, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, afirmou esta sexta-feira que o teste de coronavírus a que foi submetido deu resultado negativo.

A possibilidade de que estivesse contaminado era muito real porque o seu secretário de Comunicação, Fabio Wajngarten, que o acompanhou na recente visita aos Estados Unidos, contraiu a doença. Wajngarten estava presente no jantar com o presidente Donald Trump, sábado dia 7, e também num evento dois dias depois em que participou o presidente da Câmara de Miami, Francis Suarez. Suárez anunciou nesta sexta-feira que o teste de coronavírus a que se submeteu deu positivo.

Reviravolta

Estando ou não com a doença, Bolsonaro foi forçado em poucos dias a engolir tudo o que dissera antes sobre o coronavírus. Ainda no dia 10, quando as bolsas de valores de todo o mundo davam o seu primeiro trambolhão, o presidente do Brasil afirmava que “o poder destruidor desse vírus” estava a ser superdimensionado. “Muito do que tem ali é muito mais fantasia, a questão do coronavírus, que não é isso tudo que a grande mídia propaga”.

No dia seguinte, quando a OMS já declarara a situação de pandemia, Bolsonaro ainda insistia: “O que eu ouvi até o momento [é que] outras gripes mataram mais do que esta”.

Passou um dia mais e Bolsonaro mudou completamente, a partir do momento em que soube que o seu secretário de Comunicação contraíra a doença. Numa live pela internet, o presidente apareceu de máscara, ao lado do ministro da Saúde, também de máscara, para informar que se submetera ao teste do coronavírus mas ainda não sabia o resultado.

O verdadeiro desígnio da dramática aparição, porém, era desconvocar as manifestações de extrema-direita em seu apoio e contra o Congresso Nacional, argumentando com os perigos de contaminação em grandes aglomerados de pessoas. Oficialmente, as manifestações foram organizadas por movimentos ultraconservadores, mas Bolsonaro por duas vezes as convocou explicitamente – para depois negar o seu envolvimento. Na live desta quinta, voltou a fazer a mesma trapalhada. Primeiro opinou que deveria-se evitar “que haja uma explosão de pessoas infetadas [pelo coronavírus], porque os hospitais não dariam vazão a atender tanta gente”, acrescentando que “Como presidente da República, eu tenho que tomar uma posição, contra ou a favor. Se bem que o movimento não é meu, é espontâneo e popular.”

"Même" ironiza contradições de Bolsonaro
"Même" ironiza contradições de Bolsonaro

Nas redes sociais, uma même espalhou-se instantaneamente. Mostrava o presidente de máscara e as inscrições: “Patriotas: estou adiando as manifestações que eu disse que não convoquei… Por causa de um vírus que eu disse que era fantasia”.

Trapalhada ou ocultação?

Na manhã desta sexta-feira, Bolsonaro foi enfático a anunciar o resultado negativo do teste de coronavírus, mas várias fontes já tinham adiantado que o teste dera positivo. A primeira foi o canal Fox News, insuspeito de ser inimigo do presidente do Brasil, que atribuiu ao seu filho, Eduardo Bolsonaro, a informação. Este negou, mas o jornalista da Fox reiterou que ele mudara a versão que tinha dado antes.

Por outro lado, um colunista do diário carioca O Dia, Leandro Mazzini, escreveu que “deu positivo o primeiro teste para infeção por coronavírus no presidente da República Jair Bolsonaro” e que este esperava o resultado da contra-prova para confirmar ou não a contaminação. E prosseguia ponderando que “passar à população uma imagem de um presidente infetado pode causar medo geral e até mexer com os índices da Bolsa de Valores”. Além disso, o presidente “também morderia a língua, porque (…) ironizou a situação apontando que a epidemia de coronavírus seria coisa da mídia.” E concluía afirmando que segundo a sua fonte, “até o comandante do avião presidencial que voltou dos Estados Unidos estaria contaminado”.

Pode ser que o colunista de O Dia esteja mal informado e que a Fox News tenha interpretado mal Eduardo Bolsonaro. Pode ser que a contaminação do presidente da câmara de Miami tenha sido coincidência. Que Wajngarten tenha viajado no avião presidencial sem contaminar mais ninguém da comitiva. Tudo é possível. Até que Trump esteja tão seguro de que é imune ao vírus que ele ridicularizou, que se recusa a fazer o teste para saber se foi contaminado pelo secretário brasileiro. Tudo é possível no mundo das fake news e na relativização da verdade. Mas também é possível e legítimo ficar com dúvidas diante de uma história no mínimo mal contada.

Luís Leiria
Sobre o/a autor(a)

Luís Leiria

Jornalista do Esquerda.net