(junto ao hospital Joaquim Urbano)
Que memórias guardas deste local?
Eu fui diretor deste Hospital entre 2000 e 2006. Acho que foram, talvez, os anos da minha vida profissional em que me senti mais realizado. Em 2000, o Hospital estava muito degradado, muito envelhecido, a maior parte dos pavilhões estavam numa situação deplorável. Em 6 anos foi possível reconstruir todos os 16 pavilhões.
Mas, sobretudo, creio que conseguimos na altura, com uma equipa muito boa de médicos e de enfermeiros — médicos infecciologistas, médicos pneumologistas, psiquiatras, psicólogos, enfim, várias especialidade — instalar aqui uma forma muito original de tratar os doentes de SIDA. Os toxicodependentes com SIDA, tuberculose e hepatite vinham aqui diariamente ao Centro de Terapêutica Combinada, tinham pequeno almoço, tinham medicina dentária, tinham atividades de ocupação dos tempos livres, tomavam a medicação e tinham os médicos e os enfermeiros para tratar deles quando fosse necessário. Nessa altura, as taxas de adesão à terapêutica eram elevadíssimas, e isto constituiu um processo que na altura, nos meios que tratavam de doentes com SIDA, foi um grande sucesso do ponto de vista terapêutico.
A tua atividade parlamentar dedicou-se em particular as políticas de saúde. Foi possível deixar alguma marca?
Dos projetos de lei que apresentámos e que são hoje leis, eu acho que daqueles que têm mais impacto na vida das pessoas e na atividade do Serviço Nacional de Saúde é, sem dúvida nenhuma, a questão dos tempos de espera. Quando aprovámos a carta dos direitos dos utentes do Serviço Nacional de Saúde, pela primeira vez se introduziu na lei o conceito de tempo de espera e, portanto, a imposição de limites para que os doentes possam esperar por uma cirurgia, por um internamento, por uma consulta, por um exame. Esse conceito — e a prática — dos tempos de espera teve uma contribuição muito importante na qualidade, na eficácia, na eficiência dos cuidados prestados no SNS.
Depois, também acho que o testamento vital é uma lei muitíssimo importante e acho que essa ficará, tal como os tempos de espera, por muito tempo. Depois houve outras leis na área dos medicamentos, dos medicamentos genéricos, a prescrição por substância ativa, a obrigação a que o rótulo das embalagens dos medicamentos tenha o preço de venda ao público…
Também na área da procriação medicamente assistida, houve alguns passos e houve uma lei aprovada ainda no tempo da deputada Alda Sousa, mas, posteriormente a isso, houve algumas alterações mais favoráveis na lei, mas só agora é que todas as mulheres podem ter acesso à PMA. Isso é um grande sucesso da persistência e da determinação do Bloco de Esquerda e do seu grupo parlamentar, e isso deu-me uma enorme satisfação.
Quando olho para trás, tenho muita pena que alguns não tenham sido aprovados, mas estes claro que me satisfazem imenso e acho que foram um enorme contributo do Bloco de Esquerda para o progresso do SNS, um SNS que corresponda às necessidades das pessoas.
Achas que o SNS está em perigo?
Hoje há um problema central no Serviço Nacional de Saúde, que é um problema de grande intensidade e de grande importância, que é a cada vez maior promiscuidade entre setor público e o setor privado, ou seja, o setor privado está numa ofensiva de destruição do SNS, de captação dos recursos do SNS, e é sobre isso que eu julgo que mais depressa e com mais intensidade se tem que intervir.
(junto ao Parque das Virtudes)
Qual a tua relação com este espaço?
Uma delas é com a Cooperativa Árvore, da qual durante muitos anos fui dirigente. A Cooperativa Árvore é uma cooperativa que tem oficinas, tem uma galeria, tem uma loja, que desenvolve ao longo do ano várias atividades culturais, muito para além das artes plásticas, e é também uma cooperativa que promove a produção e a comercialização da obra gráfica, da obra artística, de muitos artistas da cidade que aqui trabalham e aqui vêm fazer as suas exposições e produzir a sua obra gráfica.
A Cooperativa Árvore tem décadas, foi fundada antes do 25 de abril, já como ato de liberdade, não apenas de criação artística, mas também de liberdade política e de luta pela democracia, num tempo em que Portugal estava submetido a um regime e a uma ditadura fascista.
A tua ligação ao Porto vai para além da atividade política?
Claro que sim, fiz outras coisas nos 40 anos que levo de vida no Porto. Para além do trabalho com a Cooperativa Árvore, também pertenci à direção do Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica, FITEI, e fiz outras coisas, como a fundação do Sindicato dos Médicos do Norte, e outras criações coletivas. Nunca foi por um impulso individual, foram sempre construções que fiz com outras pessoas, com muita outra gente. Por exemplo, com uma instituição que ainda hoje existe na cidade do Porto — a Universidade Popular — que tem uma atividade muito interessante do ponto de vista da divulgação do conhecimento, do pensamento. Tive uma vida muito intensa, muito cheia, o que me enche de uma enorme felicidade e boa disposição.