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PS chumbou casamentos homossexuais
Duas propostas de legalização de casamentos entre pessoas do mesmo sexo, subscritas pelo Bloco e Os Verdes foram chumbadas com votos da maioria dos deputados do PS. Os socialistas recuaram em relação ao compromisso de apresentar a proposta no programa eleitoral de 2009 e impuseram uma contestada disciplina de voto sobre esta matéria.
Em matéria de direitos sexuais 2008 fica ainda marcado por episódios de violência, que levaram ao assassinato de uma transexual na região de Lisboa, dois anos depois do brutal assassinato de Gisberta, no Porto. Para discutir temas como a educação sexual, a homofobia e a transfobia, o Bloco organizou uma iniciativa nacional, as Jornadas "Sem Medos - Contra a homofobia" e promoveu uma audição com transexuais na Assembleia da República.
"O casamento de homossexuais não está na agenda política nem do Governo nem do Partido Socialista", foi desta forma inequívoca que José Sócrates declarou a sua intenção de rejeitar as propostas apresentadas a 10 de Outubro, na Assembleia da República pelo Bloco e Os Verdes, com o objectivo de permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A proposta bloquista defendia a alteração do código civil para definir o casamento como "o encontro de vontades, solenemente formalizado, de duas pessoas que pretendem constituir uma família mediante uma plena comunhão de vida". O Bloco contestou a concepção do actual Código Civil que define o casamento como um contrato "entre duas pessoas de sexo diferente", alegando a inconstitucionalidade da definição.
No seu projecto de lei, o Bloco alega que "não sendo já a reprodução considerada como o fim último deste instituto jurídico, ficando tal decisão da escolha livre dos cônjuges, e perante o actual reconhecimento da pluralidade de formas de família, não faz qualquer sentido manter a limitação da celebração do casamento a pessoas de sexo diferente".
O fim discriminação dos casais homossexuais e o acesso ao casamento civil em circunstâncias iguais a qualquer outro casal eram objectivos da proposta do Bloco que foram gorados, face à posição do PS, que resultou no chumbo da proposta, assim como sucedeu com o diploma de Os Verdes.
Por proposta da direcção do grupo parlamentar, uma maioria dos deputados socialistas aprovou, em reunião prévia, muito pouco participada (47 deputados marcaram presença, enquanto 74 faltaram), a imposição da disciplina de voto sobre os dois projectos, só excepcionando na votação o ex-líder da JS, o deputado Pedro Nuno Santos, que no passado tinha exactamente dado a cara por esta causa e que acabou por votar a favor das propostas.
A disciplina de voto não foi pacífica e não foi respeitada por todos os parlamentares, como foi o caso de Manuel Alegre que votou favoravelmente o diploma e classificou o chumbo como "um erro político".
Após o chumbo dos projectos de lei, houve também uma sucessão de pedidos dos deputados do PS ao presidente da Assembleia para a entrega de declarações de voto em nome individual e colectivo.
Para justificar a posição do PS contra os casamentos entre pessoas do mesmo sexo, Alberto Martins explicou que este assunto não estava incluído entre as medidas previstas no programa de governo de José Sócrates.
Mas a declaração de voto da bancada do PS traduz um recuo em relação ao compromisso de contemplar esta proposta no programa eleitoral de 2009. O texto justifica o voto contra os diplomas com a necessidade da "criação dos necessários consensos que conduzam a soluções que garantam a realização duradoira e consistente dos princípios da liberdade e igualdade de direitos".
Os socialistas deixaram de lado a promessa de levantar o tema na próxima legislatura e referem a necessidade de "legitimação social", "maturadas discussões", "consensos" e "adesão da sociedade".
A declaração dos deputados socialistas contrasta com o compromisso na moção que elegeu José Sócrates para a liderança do PS em Novembro de 2007. Nesta o primeiro-ministro propunha-se a "remover as discriminações que restam, na ordem jurídica e social portuguesa, designadamente as fundadas no sexo e na orientação sexual".
"O PS assume aqui hoje a vontade de eliminar toda e qualquer a discriminação em função da orientação sexual. O PS considera no entanto que não o pode fazer de forma fracturante". Foi desta forma que o deputado socialista Jorge Strecht justificou o chumbo das propostas. Luís Fazenda, líder parlamentar do Bloco respondeu considerando que "o PS perdeu o tempo da sua oportunidade". "Agora o PS está comprometido a pôr preto no branco e com clareza qual vai ser a sua posição no seu programa eleitoral", referiu.
Vários movimentos LGBT, como as Panteras Rosa, rede ex-aequo e Não te Prives, aproveitaram o dia da votação das propostas para encenar casamentos com casais gays e lésbicos frente à Assembleia da República. Também o grupo homossexual católico "Rumos Novos" defendeu publicamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo para acabar com a discriminação, assumindo uma a posição contrária à da Igreja Católica. "As posições calculistas de vários sectores do poder político, escudados nos mais variados argumentos, de recusa do acesso de todos os cidadãos ao direito ao casamento, revelam um profundo e preocupante preconceito: o de recusar a uma parte da sociedade portuguesa a igualdade, a justiça e a liberdade", afirmaram em comunicado.
Nas reacções à rejeição dos diplomas a associação Ilga-Portugal considerou que "a opção é clara: apoiar a homofobia ou recusá-la"."Estamos a falar de direitos fundamentais e é inadmissível que um Partido Socialista de um país da União Europeia em 2008 queira votar contra a igualdade", considerou a organização.
2008 ficou igualmente marcado pelo reacendimento de manifestações de homofobia, que alegadamente levaram à pratica de pelo menos um crime de homicídio de uma transexual. O caso remonta a finais de Fevereiro, quando o corpo de Luna, de 42 anos, de origem brasileira, foi encontrado na quinta-feira num caixote do lixo em Loures. Segundo informações da associação Opus Gay a vítima trabalhava em Portugal, e prostituía-se em Lisboa, "tendo sido encontrada muito mal tratada e baleada". Perante o caso, algumas associações de defesa dos direitos LGBT, consideraram ser muito provável tratar-se de mais um homicídio motivado por violência transfóbica.
Este caso surgiu poucos dias após o Bloco ter assinalado os dois anos passados sobre o assassinato brutal da transexual Gisberta, no Porto, realizando, no dia 22 de Fevereiro e pela primeira vez em Portugal, uma audição com transexuais na Assembleia da República.
Nessa audição, várias transexuais alertaram para os problemas de discriminação social que existem e também para as debilidades e lacunas da lei, que continua a não reconhecer a identidade de género, a colocar entraves ao registo civil e à mudança de nome, a prolongar os processos médicos e clínicos e a não levar em linha de conta a transfobia como motivo agravante para os crimes de ódio.
Em Maio, o Bloco promoveu também uma iniciativa nacional, as Jornadas "Sem Medos, contra a homofobia", onde temas como a educação sexual, a homofobia e a transfobia estiveram em debate. As jornadas encerraram a 14 de Junho com o Fórum Internacional Sem Medos, em Lisboa.
Além da promoção de vários debates sobre o tema por todo o país, ao longo do ano de 2008, o Bloco avançou também com iniciativas parlamentares, com a apresentação de três projectos de recomendação ao governo para instituir o Dia Nacional contra a Homofobia (associando à data medidas e recursos para a prevenção da discriminação), e para responder a duas reivindicações antigas do movimento LGBT: um conjunto de boas práticas para as forças de segurança no tratamento de crimes de ódio, e o combate à discriminação nos serviços de recolha de sangue.
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